sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

Claudia Safatle - ‘Pouso suave’ com arte e um pouco de sorte

Valor Econômico

Para conseguir ter juros mais baixos é preciso ter uma situação fiscal mais arrumada

O Brasil está conseguindo um pouso suave (“soft landing”), uma substancial desinflação com algum crescimento econômico, observa o economista do Insper Marco Bonomo. Esse é um fato notável, dado que a taxa de inflação, que atingiu 10,06% em 2021, caiu para menos da metade, está abaixo de 5%, e a expectativa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano é em torno de 3%.

“Em termos de política monetária, o Banco Central está fazendo o seu trabalho”, disse o economista, em linha com o que tem mencionado o presidente do BC, Roberto Campos Neto, a respeito do pouso suave.

Nem tudo é arte, acredita Bonomo, que vê também um pouco de “sorte”, o que não compromete o resultado “espetacular” que não se restringe ao Brasil, mas que o mundo tem experimentado, de combater a inflação sem se afundar em uma recessão.

“O efeito dos juros sobre o crescimento econômico, na política anticíclica, é temporário. Por isso que baixar as taxas de juros artificialmente pode te dar um efeito provisório sobre a atividade e termina com uma inflação permanentemente mais alta”, avalia Bonomo.

O Brasil tem taxas de juros estruturalmente altas, com spreads bancários (taxas de risco) também mais altos do que os outros países e isso pode ter efeito sobre o crescimento de longo prazo.

Para conseguir ter juros mais baixos é preciso ter uma situação fiscal mais arrumada. E, nesse aspecto, é importante notar que, apesar das dificuldades que se colocam para o governo zerar o déficit primário no próximo ano, a meta é zerar o déficit no seu conceito mais restrito, que não contabiliza a conta de juros que incide sobre a dívida pública.

Ao considerar os juros que atingiram o montante de R$ 720,1 bilhões, equivalentes a 6,80% do PIB, no acumulado de 12 meses até outubro, o resultado nominal - conceito mais amplo das contas públicas que inclui o primário mais o pagamento de juros - foi deficitário em R$ 834,3 bilhões (que corresponde a 7,88% do PIB).

Isso sem contar que o governo cobra IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), que penaliza ainda mais a taxa de juros, além dos depósitos compulsórios sobre depósitos à vista e a prazo, cita ele.

O sistema financeiro, no país, não é competitivo, segundo o economista do Insper, para quem o open banking criado pelo BC renova a esperança de se aumentar a competição. O open banking vai permitir o compartilhamento de dados e serviços de clientes entre instituições financeiras mediante a integração de seus sistemas.

O que gera crescimento estrutural de longo prazo é a produtividade. E, na agenda da eficiência econômica, a parte financeira é a que está andando mais rapidamente.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados nesta semana, o PIB do terceiro trimestre teve um módico crescimento, de 0,1%. Na próxima semana, dia 14, o Instituto Brasileiro de Economia (FGV Ibre) deverá divulgar um par de setores que tiveram ganhos de produtividade.

Os cálculos ainda estavam sendo feitos, à luz dos dados das contas nacionais, mas esses devem ter sido a agropecuária e a construção civil.

Houve uma queda, no terceiro trimestre, de 2,5% na Formação Bruta de Capital Fixo frente ao segundo trimestre. Trata-se de um reflexo da política monetária contracionista. Em uma visão empírica, os juros elevados afetam mais diretamente o investimento do que o consumo, indica Bonomo.

O consumo das famílias aumentou 1,1%, a despeito do aperto monetário. Tal crescimento é explicado pelos programas de transferência de renda, a continuação de melhora do mercado de trabalho e pela queda da inflação.

Para investirem no país, as pessoas precisam ter confiança. “E temos uma longa história de instabilidade macroeconômica”, analisa Bonomo.

E, mais uma vez, o enfrentamento do desequilíbrio fiscal, assim como o cuidado com o meio ambiente, é muito importante para inspirar confiança.

Afinal, a questão fiscal está relacionada à capacidade de solvência, e da ambiental depende a própria existência do país.

 

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