Folha de S. Paulo
É nesse momento sombrio que paz na Terra
Santa ganha nova oportunidade
"Livre, do rio até o mar". Coloque
Israel no início da frase e terá o estandarte dos supremacistas judaicos que
estão instalados no governo de Netanyahu e não admitem o surgimento de um
Estado palestino. Coloque Palestina e terá o do Hamas, da jihad islâmica e da
parcela antissemita da esquerda ocidental, que almejam a abolição do Estado
judeu. Como Israel não desaparecerá e os palestinos também não, são receitas
simétricas para a guerra permanente.
No meio da tragédia deflagrada pelos bárbaros atentados do Hamas e estendida pelos bombardeios indiscriminados de Israel em Gaza, parece fútil pronunciar a palavra "paz". Na guerra de propaganda que acompanha a guerra de verdade, ouve-se apenas o grito de "genocídio". Numa ponta, Netanyahu e seus cortesãos alertam para a ameaça genocida expressa no terror do Hamas. Na outra, os supostos defensores da Palestina denunciam uma "Nakba permanente" que classificam como Holocausto palestino.
Contudo, paradoxalmente, é nesse momento
sombrio que a paz na Terra Santa ganha nova oportunidade. A fórmula –a única
fórmula realista– é bem conhecida: a partilha em dois Estados.
A sociedade israelense parece se dar conta,
finalmente, do fracasso da estratégia de "segurança sem paz" seguida
por Netanyahu, que se apoiava na convivência violenta com o Hamas. Os
palestinos, de outro lado, agora sabem que o Hamas provoca apenas martírio –não
só o martírio do combatente fanático, mas o dos civis condenados a viver e
morrer sob um regime de guerra perene.
Há ressentimento, ira e ódio. A paisagem,
porém, é mais complexa. No 7 de outubro, o Hamas trucidou inúmeros ativistas
judeus pela paz que dedicaram suas vidas a firmar parcerias sociais com
palestinos. No dia do sangue, percorrendo atalhos do deserto que só eles
conhecem, beduínos palestinos-israelenses salvaram incontáveis judeus
israelenses acossados nos kibutzim do Neguev. Depois, nos hospitais, médicos e
enfermeiros, muitos deles árabes-israelenses, cuidaram dos feridos. Cerca de
20% dos cidadãos de Israel são palestinos: nessa convivência tensa, mas
pacífica, encontram-se sementes de um futuro diferente.
A meta da paz em dois Estados exige uma dupla
derrota, do Hamas e de Netanyahu. Sobretudo, porém, solicita um salto moral
duplo: o reconhecimento por Israel de que os palestinos não são o "povo do
Hamas" e, pelos palestinos e seus aliados na esquerda ocidental, de que os
judeus têm direito a um Estado judeu.
Um Estado judeu pode ser um Estado
democrático? Naquilo que tem de melhor, Israel prova que sim. Os palestinos da
Cisjordânia vivem sob uma ditadura cleptocrática; os de Gaza, sob uma tirania
fundamentalista. Já os palestinos-israelenses beneficiam-se de amplos direitos
políticos e civis – embora, desgraçadamente, sofram sistemática discriminação
social.
Mansour Abbas, líder parlamentar da Lista
Árabe Unida, a coalizão partidária dos palestinos-israelenses, referiu-se do
seguinte modo ao 7/10: "Ninguém pode aceitar o que aconteceu naquele dia.
E não podemos condenar os atentados e dizer ‘mas’ –essa palavra ‘mas’ tornou-se
imoral." Nessas frases encontra-se a condenação da imoralidade das
correntes da esquerda ocidental que dizem "mas". Nelas, há também o
fundamento para a paz em dois Estados.
E, contudo, dois Estados não são suficientes.
A paz duradoura depende da construção de uma ponte entre eles: uma
confederação. O ex-premiê israelense Shimon Peres, um dos arquitetos dos
Acordos de Oslo, delineou o conceito. Dois Estados soberanos, mas interligados
por direitos comuns (como os direitos de residência e de trânsito no Estado
vizinho), por um mercado comum e por instituições de cooperação educacional e
cultural. Dois Estados separados, mas ambos com capital na cidade sem muros de
Jerusalém.
Utopia? Sonho louco? A alternativa está aí:
guerra sem fim.
Só um senão.Se houvesse bombardeios indiscriminados não teríamos 25 mil mortos, mas 300 mil.
ResponderExcluirMAM
Será que o amigo MAM é o mesmo do fórum advfn da Vanguarda? Em relação à Guerra, claro, Israel tem direito a se defender e eliminar os terroristas do Hamas. Mas quando eliminam judeus reféns desarmados em busca de socorro, fica patente que o descaso pode ir muito além com palestinos civis sem qualquer engajamento com a selvageria do 07/10. Fico triste que não consigam castigar os brutos sem um cuidado mais atento em relação aos árabes palestinos. A solução proposta por Demétrio parece o único caminho possível, desde que se garantam maiorias judaica e palestina nos dois Estados soberanos confederados.
ResponderExcluirSó o amor constrói.
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