sábado, 2 de dezembro de 2023

Dora Kramer - Ato cenográfico

Folha de S. Paulo

Teatral como todas, sabatina de Flávio Dino promete um circo de louvores e horrores

As sabatinas no Senado talvez tenham tido importância algum dia, mas nos dias que me lembro de tê-las visto não tiveram relevância alguma para a aprovação de indicados ao Supremo Tribunal Federal.

Prova disso é a manifestação antecipada de votos (vejam, são secretos) antes mesmo de os candidatos ao posto se sentarem na Comissão de Constituição e Justiça para um ato que se presta mais a homenagens dos presumidos julgados aos que serão seus eventuais julgadores do que a um escrutínio sério.

Nessa trajetória houve episódios particularmente vergonhosos, como quando da indicação da primeira mulher ao STFEllen Gracie. Senadores gastaram muito tempo, saliva e machismo na celebração da beleza da candidata.

No caso presente de Flávio Dino, às exaltações se somarão as provocações —prevê-se, insultuosas— por parte de uma oposição desinteressada de aquilatar o saber político do inquirido e interessada em descredenciá-lo por força de seu poder político.

O que se avizinha não é uma sabatina, é um circo de horrores e louvores. Mas, como o que é ruim sempre pode piorar, o presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (União-AP), teve uma ideia: juntar Dino e o indicado para a Procuradoria-Geral, Paulo Gonet, na mesma sessão alegadamente a fim de agilizar os trabalhos.

Além de inédita para os cargos em questão, a proposta é ardilosa, de resultado improdutivo e, por isso, ruinoso. Caso prospere, teremos uma salada indigesta patrocinada pelo intuito de usar a atmosfera de aceitação a Gonet para aplacar o clima de rejeição a Dino.

Ciosos que são de suas prerrogativas, empenhados que estão em impor balizas ao funcionamento do tribunal (algumas justas, mas nem todas), os parlamentares fariam um bem maior à própria autonomia se abandonassem a cenografia e abraçassem as sabatinas como instrumento de avaliação real dos predicados dos postulantes a guardiões da Constituição.

 

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