segunda-feira, 8 de janeiro de 2024

Bruno Carazza* - O país ao sabor das previsões dos economistas

Valor Econômico

Em 2024 também se comemoram os 25 anos do sistema de metas de inflação no Brasil

Dizem que as previsões dos economistas são ótimas para dar credibilidade aos astrólogos e meteorologistas. E que, se todos os economistas forem colocados juntos, nunca chegarão a um consenso.

Com uma fama dessas, parece loucura basear a condução do país na coordenação das expectativas dos economistas sobre o futuro.

Nas últimas semanas, muita atenção se deu ao fato de que a maioria do mercado errou suas previsões para a economia brasileira em 2023. O ano passado fechou com números bem melhores do que o esperado: dólar a R$ 4,85 (contra previsão de R$ 5,28), taxa Selic em 11,75% (a expectativa era de 12,25%), inflação abaixo de 4,7% (versus 5,3% do mercado) e crescimento em torno de 3% (muito superior à pessimista marca de 0,79%).

Não se pretende aqui exercer uma das principais habilidades maldosamente atribuídas à minha profissão: explicar no futuro as razões pelas quais suas previsões feitas no passado não aconteceram no presente.

Em defesa da classe, é preciso reconhecer que não é fácil prever as principais variáveis macroeconômicas. Afinal, o resultado do PIB, a inflação ou o câmbio são frutos de decisões de milhões de consumidores, produtores, comerciantes, exportadores, importadores, poupadores e investidores, residentes no Brasil ou no exterior. Esses grupos interagem a todo instante, e cada um dos seus integrantes possui objetivos próprios e expectativas diferentes; uns mais avessos ao risco, outros mais arrojados; alguns otimistas, outros mais cautelosos.

No meu texto anterior para o Valor, ao tratar das efemérides de 2024, lembrei do 30º aniversário do Real. No entanto, é importante não esquecer que o plano econômico quase naufragou menos de cinco anos depois do seu lançamento, quando o governo foi obrigado a abandonar a âncora cambial e deixar o real flutuar conforme as forças do mercado.

Nos meses que se seguiram, o dólar disparou ao sabor da especulação e dos temores de volta da hiperinflação. E foi aí que a diretoria do Banco Central, agora com Armínio Fraga no comando do barco, resolveu testar no Brasil uma ideia que até então havia funcionado apenas nos manuais de macroeconomia e em países bem menos complexos e desafiadores.

O sistema de metas de inflação baseia-se numa ideia que, de tão singela, parece improvável de funcionar. O governo anuncia publicamente um patamar para a inflação no futuro e dá ao Banco Central os instrumentos e a autonomia para perseguir aquele objetivo. Com o tempo, ao se mostrar bem-sucedido na sua missão, o BC adquire credibilidade e as pessoas e empresas passam a não apenas acreditar nas suas metas, como a racionalmente incorporar aquelas previsões em suas negociações e contratos.

Uma forma de se medir o sucesso de uma política monetária orientada por metas de inflação é verificar como se comportam as previsões dos economistas frente ao desempenho efetivo das variáveis macroeconômicas.

É verdade que choques ocorrem - e os últimos 25 anos foram pródigos em surpresas tanto externas (11 de Setembro, crise financeira de 2008, pandemia), além das tradicionais reviravoltas políticas internas.

No geral, porém, observa-se uma boa aproximação entre a previsões do mercado (expressas pelo boletim Focus) quanto do governo (colhidas nos parâmetros orçamentários) em relação ao efetivamente ocorrido.

Até o valor do dólar, uma das variáveis mais difíceis de se prever (“Deus inventou o câmbio para humilhar os economistas”, diz a piada) apresenta uma discrepância abaixo de 10% em relação às estimativas com um ano de antecedência, exceto nos anos de grandes crises internacionais ou domésticas.

Em meio a tanta incerteza quanto às decisões que uma infinidade de agentes econômicos irá tomar, em 2024 precisamos comemorar o feito de o Banco Central, sob diferentes governos, tem conseguido há um quarto de século guiar as expectativas dos brasileiros (e dos estrangeiros que fazem negócios com o Brasil) a respeito do futuro com base na previsibilidade, na confiança e na credibilidade.

*Bruno Carazza é professor associado da Fundação Dom Cabral e autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”. 

 

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