Folha de S. Paulo
Reforma política reduz partidos, e destino da
esquerda é federação com gente que já teve entre si brigas ainda mais feias
Marta Suplicy voltará
ao PT para
ser vice na chapa de Guilherme
Boulos.
O movimento, orquestrado por Lula, é uma bela
jogada. Marta tem votos na periferia de São Paulo, onde sua administração
realizou investimentos importantes. Sua experiência administrativa, e mesmo sua
passagem por partidos de centro nos últimos anos, podem enfraquecer a impressão
de que uma chapa liderada por Guilherme Boulos seria radical demais.
Seu retorno ao PT causou algum ruído. Mesmo grupos da esquerda do PT defendem Marta como vice de Boulos, mas preferiam que ela concorresse por alguma outra legenda aliada. E, sejamos honestos, se era para voltar um dia, Marta deveria ter rompido com o PT de maneira menos ruidosa: não precisava ter votado a favor do impeachment. Sobretudo, não precisava ter entregado flores a Janaína Paschoal no dia da votação do impeachment na Câmara.
Alguns dirigentes do PT, como Valter Pomar,
da tendência "Articulação de Esquerda", manifestaram em público seu
incômodo. Em um texto publicado em seu blog em 11 de janeiro, escreveu:
"entendo os motivos pelos quais Rui
Falcão afirma que o PT é o 'leito natural' de Marta. Mas,
seguindo o conselho de Rui e pensando 'daqui para frente', prefiro não
compartilhar o 'leito' partidário com quem cometeu tamanha violência contra o
Partido".
O sentimento de Pomar é compreensível. Não
minimizo o trauma que os petistas sofreram em 2016, quando o partido foi usado
como bode expiatório do sistema político brasileiro.
Mas alguns fatores devem ter contribuído para
a decisão de trazer Marta de volta. Sem a filiação, o PT não teria nenhum
filiado na chapa. Marta conhece profundamente o PT paulistano e não deve ter
dificuldade em estabelecer-se como elo de Boulos com Lula e o PT. É bom
lembrar, inclusive, que Marta saiu do PT quando seu movimento para lançar Lula
candidato em 2014, no lugar de Dilma, fracassou. Suas credenciais
"lulistas" são respeitáveis. E sua história com o PT não inclui
apenas o ano de 2016.
A eleição municipal de 2024 é muito
importante para o PT. Os petistas foram dizimados na eleição municipal de 2016,
ano do impeachment. A eleição seguinte, em 2020, aconteceu sob a pandemia:
quase não houve campanha, o que resultou em grande vantagem para quem concorria
à reeleição. Isto é, para os que haviam vencido a eleição em que o PT não
ganhou nada. A eleição deste ano, portanto, é a chance do PT de voltar para o
jogo das disputas municipais.
Uma vitória em São Paulo, mesmo que em
aliança com o PSOL,
teria um peso político imenso.
O contraste com a eleição paulistana de 2016
é notável: naquele ano, a esquerda colocou todos os seus ex-prefeitos
(Erundina, pelo PSOL; Marta, pelo PMDB;
e Haddad, concorrendo à reeleição) para disputar uns com os outros. Este ano, o
PSOL tem a cabeça de chapa e a vice é Marta, de volta ao PT. Há um
reagrupamento em curso.
Esses reagrupamentos devem se tornar mais comuns. A reforma política de 2017 vem causando uma diminuição do número de partidos no Brasil. Esse processo deve continuar. Diante das enormes máquinas partidárias de direita que surgirão, o destino da esquerda, nos próximos anos, deve ser uma federação. Ela incluirá gente que já teve entre si brigas ainda mais feias do que a de Marta Suplicy com o PT em 2016.
Se Marta acreditava que Dilma cometeu crime de responsabilidade e merecia o impeachment, o que o colunista queria que Marta fizesse?
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