O Estado de S. Paulo
O Brasil está dividido e as Forças Armadas também, mas já estiveram mais
O momento mais tenso de 8/1 de 2023, talvez
até o mais, foi quando três ministros civis se reuniram no Quartel General do
Exército (QG) com o então comandante, general Júlio Cesar Arruda, e
descobriram, ou confirmaram, algo ainda mais assustador do que a invasão dos
Três Poderes por vândalos: cooptadas pelo capitão insubordinado Jair Bolsonaro,
as Forças Armadas, ou partes delas, não rechaçavam firmemente a tentativa de
golpe.
Arrogante, com ar superior, Arruda agia como negociador, ou em favor, dos responsáveis pelo crime, que ainda chamava de “manifestantes”, enquanto os tanques em fila à frente do QG apontavam não para a turba acampada ali, mas para fora, tentando impedir a entrada do poder civil, representado, no primeiro momento, pelo interventor do DF, Ricardo Cappelli, acompanhado de policiais e do comandante da PM, coronel Fábio Augusto Vieira.
Eles tinham a ordem do presidente Lula, via
ministro da Justiça, Flávio Dino, de “prender todo mundo” no acampamento, mas
foram barrados na via de acesso ao QG. “Vamos entrar”, avisou Cappelli. O
comandante militar do Planalto, general Dutra Menezes, reagiu: “Se os senhores
entrarem, vai ter um banho de sangue”.
E Cappelli: “O que o sr. quer dizer? Que os
acampados estão armados?”.
Dutra Menezes ligou para o general Gonçalves Dias, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), deu a entender que Dias havia passado o telefone para o presidente e Lula determinara que esperassem a entrada ser liberada. E foi. O general Arruda já recebeu Cappelli e Fábio Augusto com ar de confronto: “Os senhores queriam entrar aqui com a PM sem a minha autorização? Eu acho que tenho um pouco mais de tropas que o sr.”, ameaçou, dirigindo-se ao comandante da PM.
Com o clima tenso, Dino foi para o QG com os
ministros José Múcio (Defesa) e Rui Costa (Casa Civil), em nome do presidente.
Do outro lado, Arruda queria convocar o Alto Comando do Exército, mas foi
dissuadido. A seu lado, um oficial tentava reduzir a gravidade das invasões dos
três poderes: “No impeachment da Dilma, a esquerda também quebrou o Itamaraty”.
Convenhamos que há uma imensa diferença.
Os três ministros civis queriam desmontar o acampamento e a prisão imediata dos que estavam lá. Arruda exigia a volta dos ônibus para buscá-los, tentando evitar as prisões e justificar os atos e seus autores: “Vocês precisam entender que o Brasil está dividido”. O desmonte e as prisões ficaram para as 6h do dia seguinte e, ok, o Brasil estava e está dividido, mas a democracia, a garantia das instituições e o resultado das urnas nunca, jamais devem estar em jogo. Neste 8/1 de 2024, comemora-se a “Democracia Inabalada”, mas ainda há muito a fazer.
Concordo.
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