O Globo
Com a ajuda do tempo, os atores daqueles dias
entendem que houve uma sucessão de acertos para a derrubada da tentativa de
golpe
Não há mais dúvida razoável de que houve
tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro
de 2023. É importante entender o que derrotou o golpe. Hoje, com a
ajuda do tempo, o que os atores daqueles dias entendem é que houve uma sucessão
de acertos. A mais importante decisão do presidente
Lula foi a de não aceitar uma operação de Garantia da Lei e da
Ordem. A GLO era parte da trama. A segunda foi ele vir para Brasília, voltando
de Araraquara (SP), e estar pessoalmente, naquela noite mesmo, nos espaços
atacados. Terceira, a união dos comandos dos Três Poderes.
Lula saía do Palácio do Planalto, onde andara
sobre os escombros, e entrava no carro quando alguém disse que a ministra Rosa
Weber estava no palácio do STF.
Lula disse: “Vamos lá no Supremo agora”. Ele atravessou a praça e foi ao
prédio. Encontrou a presidente, ao lado dos ministros Luís Roberto
Barroso e Dias Toffoli. Verificou pessoalmente a dimensão da
violência feita contra o Supremo, e disse à ministra:
—Ministra, quero lhe assegurar uma coisa.
Eles vão pagar por isso. Isso não ficará assim.
A própria presidente Rosa conta que teve dois sentimentos ao ver as cenas de invasão do STF. Uma pancada no peito como se algo físico a atingisse e, no mesmo momento, o impulso de resistir.
Lula convidou a ministra para uma reunião na
primeira hora do dia seguinte. Esse foi o encontro dos Poderes. Os bastidores
da reunião entre eles é interessante por revelar outro momento decisivo.
Estavam numa sala do Palácio do Planalto treze autoridades dos poderes. O
Senado, representado pelo vice-presidente Veneziano Vital do Rêgo. Vários
ministros do governo. O presidente da Câmara, Arthur Lira, perguntou se o
processo sobre os atos de 8 de janeiro poderia ser distribuído para outro
ministro, em vez de Alexandre de
Moraes, que estava com o inquérito dos atos antidemocráticos. Lira
temia reação política ao nome do ministro.
Todos olharam para Rosa, a única mulher
presente. Ela foi peremptória.
— O relator é o Alexandre.
Com decisões certas, nas horas exatas, foi
sendo desfeito o golpe que havia sido uma longa urdidura do governo anterior,
através das falas de ódio contra o Supremo e alguns ministros em particular,
com os ataques às urnas eletrônicas e ao processo eleitoral, e o contínuo
cortejo aos militares e às polícias. Hoje, quando se olha para trás, para
aquele dia que nunca terminou e que ainda nos ensina, os participantes diretos
dos eventos relatam como foi por um triz que a democracia prevaleceu.
Os golpistas perderam o calendário. Talvez a
história fosse outra se tivessem feito isso logo após as eleições, ou se
tivessem conseguido ampliar os atos do 12 de dezembro, ou na véspera do Natal,
quando houve a tentativa de explosão de um caminhão com combustível no
aeroporto de Brasília. O plano era fazer o levante, ter apoio das polícias
militares, de setores das Forças Armadas e provocar o efeito dominó. Se fosse
com o presidente anterior, o desfecho poderia ser terrível. E, naquele próprio
dia 8 de janeiro, se as autoridades não tivessem tomado as decisões certas,
também o enredo poderia ser diferente.
A decisão dos comandantes militares de
estarem presentes no ato do Congresso amanhã é significativa. Como me disse uma
fonte militar.
— É um evento institucional e a presença das
Forças Armadas, uma das instituições comprometidas com a democracia, é
essencial. Se fosse um ato político não poderíamos participar.
Essa compreensão das atuais lideranças
militares faltou aos governadores bolsonaristas. Não é um ato de um grupo
político, é uma manifestação institucional. Há espaço para a direita e para a
esquerda no jogo político. Só não há espaço para os que conspiram contra a
democracia. Eles foram todos eleitos pelo voto popular e devem honrá-lo. O
governador Tarcísio de Freitas, por exemplo, o que teria pensado, se os que não
votaram nele tivessem invadido e depredado o Palácio Bandeirantes para tentar
apeá-lo do poder que ele legitimamente conquistou?
O que está faltando à direita brasileira é
separar-se do extremismo e comprovar que é democrata. Joio e trigo devem estar
em vasos separados. Pelos valores comuns da democracia todos têm que estar
dispostos a passar por cima de eventuais diferenças políticas em momentos como
o 8 de janeiro. A democracia, que nos custou tão caro, resistiu, apesar de ter
sofrido o pior ataque em 38 anos.
Excelente! Em 9/10, o filósofo bolsonarista Denis Rosenfield, na sua coluna que intitulou "Golpe?" com PONTO DE INTERROGAÇÃO, fez uma meticulosa e TENDENCIOSA argumentação DESCARTANDO que tenha havido tentativa de golpe em 8/1. Segundo ele, "O que houve no 8 de Janeiro foi uma espécie de estertor do bolsonarismo, com seus fiéis ainda acreditando numa narrativa ‘revolucionária’ evanescente". Ou seja, não houve apoio militar e nem participação deste setor, nem tentativa articulada dos bolsonaristas, nem cumplicidade das forças militares e de segurança com os golpistas, enfim, foi quase um dia normal para os revoltados patriotas bolsonaristas. O pseudofilósofo demonstrou naquela coluna sua habitual despreocupação com a verdade, e mostrou sua usual TENDENCIOSIDADE de prestigiar/defender militares, conservadores e outros membros e interesses da Direita ou do Conservadorismo, que o levou a APOIAR BOLSONARO na eleição de 2018.
ResponderExcluirhttps://gilvanmelo.blogspot.com/2023/10/denis-lerrer-rosenfield-golpe.html#more
Verdade.
ResponderExcluirMiriam usou, adequadamente, o slogan do mais conhecido e reputado noticiário do rádio antigo, o Repórter Esso (Heron Domingues etc) "a notícia certa no momento exato". Gostei.
ResponderExcluirt
Os bolsonaristas tentam de todas as formas MINIMIZAR a importância da tentativa de golpe e evitar as óbvias relações de Bolsonaro com os manifestantes.
ResponderExcluir