Folha de S. Paulo
Medida ajudará no cumprimento da promessa de
Lula para pessoas que ganham até dois salários mínimos
O freio na farra
das emissões de títulos de renda fixa —LCI, LCA, CRA, CRI e LIG— com
isenção tributária por empresas e bancos deve ajudar a bancar a correção da
tabela do IRPF (Imposto de
Renda da Pessoa Física) neste ano.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) prometeu uma
nova etapa de reajuste da tabela para impedir que pessoas que ganham até dois
salários mínimos (R$ 2.824) tenham de pagar o Imposto de Renda.
Para dar esse reajuste, Lula precisa compensar com outras medidas de alta de receita. É isso que está em estudo no governo, segundo a coluna ouviu de fontes a par das discussões.
Nada mais justo que a trava nas regras de
emissão desses títulos, anunciada na noite desta quinta-feira (1º) pelo CMN
(Conselho Monetário Nacional), sirva para isso.
A renúncia com a isenção do IR para esses
títulos está em torno de R$ 20 bilhões por ano. E a erosão da arrecadação vinha
aumentando cada vez mais por causa dessas emissões travestidas como benefício
ao agro e aos empreendimentos imobiliários.
Uma bomba que foi desarmada por Fernando
Haddad (Fazenda), Roberto Campos Neto (Banco Central) e Simone Tebet (Planejamento),
integrantes com voto no CMN, que tiveram coragem de mexer nesse vespeiro do
mercado, que atinge grandes empresas, inclusive estatais poderosas.
Não à toa a notícia abalou a gigante
indústria de títulos privados, que só com esses cinco papéis gerou um estoque
na mão dos investidores de R$ 1,2 trilhão. Havia rumores de que algo seria
feito, mas não se esperava para o primeiro CMN do ano. O governo tratou do
assunto com muito sigilo porque a simples notícia antecipada da medida poderia
gerar uma corrida para novas emissões.
A partir de agora, o cerco a esses excessos
vai diminuir as emissões abusivas. É sempre bom lembrar que o governo perde
essa dinheirama com a renúncia para dar isenção para pessoas com renda mais
alta, que têm dinheiro para investir. São investimentos queridinhos dos
clientes dos private banks.
A isenção do IR para esses títulos foi dada
lá atrás pelo governo com a finalidade de estimular o financiamento ao produtor
rural e aos empreendimentos do setor imobiliário, dois gigantes que movimentam
os motores do PIB brasileiro.
Mas como o Brasil é o país do jeitinho,
empresas de capital aberto e bancos acharam um caminho para ganhar dinheiro
emitindo debêntures com base nesses títulos, cujos investidores gozam de
isenção. A isenção beneficia também quem emite o papel. É um incentivo que, ao
final das contas, fica compartilhado.
Aluguel de imóveis, por exemplo, virou mote
para as empresas de capital aberto captarem recursos mais baratos no mercado,
uma vez que a isenção do IR é um grande atrativo para as pessoas que investem
nos cinco títulos.
Os investidores, porém, não têm de se
preocupar. O governo não está acabando com a isenção do IR nem mexendo no
estoque.
O agronegócio e o setor imobiliário também
não precisam sair reclamando. Nada muda para eles. Pelo contrário, operações de
emissão "puro-sangue" não vão mais concorrer com esse mercado hoje
desvirtuado e disfuncional.
Em governos passados, foram muitas as
tentativas de acabar com a isenção do IR para esses títulos. Todas frustradas
porque trombaram com a muralha das bancadas ruralista e da construção civil no
Congresso.
O aperto regulatório do CMN foi engenhoso
porque não acaba com a isenção. Certamente o seu fim não passaria no Congresso
atual em que os ruralistas estão de cara feia para o governo Lula. Ao mesmo
tempo, os dois setores podem sair ganhando com mais captações.
Em vez de enfrentar uma batalha no Congresso
e tentar derrubar esse incentivo fiscal, Fazenda e BC acharam modelo
inteligente para apartar a norma e diminuir o alcance do que pode ser usado com
lastro desses papéis.
Como diria o bordão da novela Renascer, que
está sendo transmitida em nova versão: é justo, é muito justo, é justíssimo.
Lendo e tentando aprender.
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