Folha de S. Paulo
Bolsonaro e auxiliares citavam cadeia como
argumento para melar eleição e ficar no poder
Na
reunião preparatória do plano golpista, Jair
Bolsonaro tentou cativar auxiliares com teorias da conspiração.
Insinuou que o STF recebia
propina para fraudar a eleição, falou de desarmamento e repetiu que o Brasil
corria perigo de virar uma Venezuela. No meio de tudo, revelou que seu medo, na
verdade, era terminar como uma boliviana.
O fantasma de Jeanine Añez assombrava Bolsonaro. Em discursos e conversas com auxiliares, ele citava com frequência a ex-presidente interina da Bolívia. Ela assumiu o poder em 2019, depois que militares pressionaram Evo Morales a renunciar, e foi presa dois anos mais tarde, sob acusação de golpe de Estado.
A sombra boliviana pairou sobre aquela
reunião de 5 de julho de 2022. Foi um dos principais argumentos de Bolsonaro
para cobrar de auxiliares uma ação para contestar a eleição. "Eu vou
descer aqui da rampa preso por atos antidemocráticos igual à Jeanine
Añez", afirmou.
A comparação foi capturada pela eloquência
de Anderson
Torres. O então ministro da Justiça confundiu franqueza com tosquice e, com
um sorriso cínico no rosto, fez um alerta aos colegas: "O exemplo da
Bolívia é o grande exemplo para todos nós. Senhores, todos vão se foder".
O general Braga Netto gostou do que ouviu: "É isso aí".
É até possível que houvesse na sala um pavor
genuíno com o risco de prisão caso o grupo fosse derrotado nas urnas e a
esquerda voltasse ao poder. Mas também fica claro que Bolsonaro
instrumentalizou o medo da cadeia e o receio de perseguição política para
justificar a tentativa de golpe e estimular o embarque de seus subordinados na
insurreição.
Até então, Bolsonaro havia abusado da
fabricação de desconfianças sobre o processo eleitoral. Seria o suficiente para
torná-lo inelegível, mas talvez ele pudesse ficar livre de uma punição mais
pesada. Só alguém com "inteligência bem acima da média" poderia
tramar um golpe com o objetivo de evitar a cadeia e, no fim das contas, correr
um risco maior de ser preso.
Pois é!
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