terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

Dora Kramer - Agora é tarde

Folha de S. Paulo

Se apela ao equilíbrio agora, Bolsonaro poderia ter feito o mesmo a tempo de evitar o 8 de janeiro

A necessidade pautou a prudência convocada por Jair Bolsonaro (PL) a seus admiradores no domingo (25) na avenida Paulista. Conduziu também o discurso dele, desprovido dos achaques autoritários de quando era protegido por imunidades e poderio presidenciais e ainda estava razoavelmente longe do alcance da Justiça.

Talvez o ex-presidente não tenha se dado conta de que cometeu um ato falho. O apego ocasional à serenidade contém evidência de que estava mesmo mal-intencionado quando silenciou por 40 dias após a derrota para Luiz Inácio da Silva (PT) e depois fugiu para os Estados Unidos no aguardo dos acontecimentos urdidos aqui por seus comparsas de conspirata golpista.

Foi atendido pelos milhares de apoiadores que foram ao ato. Por analogia, teria sido atendido se tivesse exortado a massa de manobra enlouquecida nas portas de quartéis —notadamente aquela acampada na frente do QG em Brasília— a voltar para casa, aceitar o resultado das urnas e se preparar para a disputa eleitoral seguinte.

O destrambelho seletivo desnuda as intenções anteriores. Mas não só. Mostra como são escassos os instrumentos de reação em busca de proteção. Na real, resumido a apenas um: a fotografia da multidão que não aliviará em um milímetro as agruras judiciais de Bolsonaro e companhia.

O chamamento à mobilização por anistia aos selvagens de 8 de janeiro (e por extensão a ele que, assim, se inclui na roda dos reclamantes pela ruptura) não tem a menor chance de prosperar. Não terá apoio na sociedade; se tivesse, não passaria pelo Congresso e, se passasse, morreria no Supremo Tribunal Federal.

Além disso, o alimento do bolsonarismo raiz é a agressividade. A exacerbação de ânimos é o seu motor, que perde tração quando chamado à moderação —que precisará ser duradoura se o capitão da tropa não quiser se complicar mais e afugentar políticos que só subiram no trio elétrico porque a promessa era de fogo baixo.

 

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