O Globo
O segundo ano de um governo tende a ser um
período de esplendor para os palacianos. Eles acreditam que podem tudo. Em
janeiro de 2020, Jair Bolsonaro anunciou que ia aos Estados Unidos e
revelou:
— Vou lá visitar empresários, que são
militares... vão me apresentar transmissão de energia elétrica sem meios
físicos. Se for real, de acordo com a distância, que maravilha! Vamos resolver
o problema de energia elétrica de Roraima passando
por cima da floresta.
Acabou não visitando a empresa. Ainda bem,
porque, cem anos antes, Nikola Tesla quebrara a cabeça tentando essa proeza, e
até hoje ninguém chegou lá.
Seu ministro da Justiça, o ex-juiz Sergio Moro,
reagiu à divulgação de suas conversas com a República de Curitiba com a soberba
do poder:
— É um monte de bobajada.
Deu no que deu.
Em março, quando o ministro Luiz Henrique
Mandetta advertia sobre a gravidade de um vírus aparecido na China, Bolsonaro foi
categórico:
— Muito do que falam é fantasia.
O segundo ano de governo é o da plenitude do poder. Os aliados desatendidos no primeiro ano aninharam-se aqui e ali, a oposição está sem voz, e todas as promessas parecem factíveis. No terceiro ano, crises que pareciam irrelevantes começam a ganhar musculatura e dominam a campanha eleitoral do ano seguinte, o último.
Lula vive
seu ano de esplendor. O Supremo Tribunal Federal concede indulgências plenárias
a seu agrado. O Congresso mostrou-se compreensivo no ano que passou, e a meta
do déficit zero ao final de 2024 continua de pé. Num só pé, mas ainda é falta
de educação dizer que não será cumprida.
Nesse doce cenário, o discurso do presidente
da Câmara, deputado Arthur Lira,
é respondido com ilusões ou anátemas. Dizer que as relações do Planalto com a
Câmara são boas é uma simples mentira. Dizer que a Câmara não deve avançar
sobre o Orçamento é pregar para os convertidos. O deputado que tem interesse
numa emenda é dono do seu voto. Acusá-lo de fisiologismo é elogio.
O país viveu o pesadelo da queda de braço
de Dilma
Rousseff com o deputado Eduardo Cunha quando
ele presidia a Câmara. Terminou com ele na cadeia e ela em Porto Alegre.
A articulação política do governo está
bichada. De um lado, o Partido dos Trabalhadores move-se com uma voracidade que
não corresponde ao tamanho de sua bancada. De outro, o Planalto não quer
ampliar a briga, expondo a essência de muitas emendas parlamentares vetadas,
num total de R$ 5,6 bilhões. Elas cabem nos R$ 14 bilhões das indulgências do
ministro Dias Toffoli, e sobra um bom troco.
Durante a campanha eleitoral, Lula prometeu
lidar com a turma que havia sido cevada pelo orçamento secreto assumindo uma
atitude republicana de diálogo com transparência. Seria um caminho árduo, mas
nem tentou.
Sem transparência e diálogo, o problema é
insolúvel. Ele se agrava se o Planalto confundir o esplendor do segundo ano com
pista livre. Há no governo ministros que prenunciam dificuldades, mas são
inibidos pela cara feia da charanga que acredita no jogo do contente.
Em 2020, quando Bolsonaro disse que visitaria
a tal empresa que poderia transmitir energia elétrica sem fios, seu ministro da
Infraestrutura, Tarcísio
de Freitas, desarmou a bomba, sem expor publicamente a bizarrice.
Pois é.
ResponderExcluirSegundo o colunista, "Lula vive seu ano de esplendor." Espero que Lula tenha lido a coluna, e acredite mais no contexto muito bem discutido do que nesta frase isolada, pois tal "esplendor" ainda está muito fosco e arranhado! Lula tem que trabalhar MUITO pra chegar perto do que já foi e recuperar mais amplamente seu antigo prestígio!
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