Folha de S. Paulo
Ministro joga tudo ao atacar coração do
bolsonarismo; ex-presidente imita Trump
Como de costume, Polícia
Federal buscou um verniz duvidoso para batizar sua mais importante
operação em muito tempo: Tempus Veritatis, ou Tempo da Verdade. Foi pouco
criativa e nada criptográfica: trata-se da hora da verdade tanto para Jair
Bolsonaro (PL) quanto para o cérebro da ação, Alexandre
de Moraes.
Desde que o inquérito das fake news surgiu,
na forma de uma queixa apontada pelo então presidente do Supremo Dias Toffoli
contra um procurador ligado à Lava Jato em 14 de março de 2019, tudo levou para
um embate final, a tal hora da verdade, entre o ex-presidente e o ministro
relator do caso.
Apesar de os detalhes de conversas apontadas até aqui serem aterradores, modus operandi recente do Supremo sugere que a megaoperação contra o coração do bolsonarismo está atrás de evidências para embasar tese amplamente conhecida e enunciada por Moraes acerca das intenções golpistas do grupo que governou o país de 2019 a 2022.
Bolsonaro e os seus se incriminaram ao longo
dos anos com fartas demonstrações de desprezo à democracia e desejos de
ruptura. O debate legal que se segue é se tais vontades se configurariam numa
tentativa de golpe de Estado estruturada, que
Moraes vê no 8 de janeiro.
Daí
os alvos da operação, além de Bolsonaro em si. É a nata da
superestrutura do bolsonarismo no poder, uma amálgama entre militares de alta
patente (Braga
Netto, Augusto Heleno), gente ligada à suposta ideologia do grupo
(assessores como Filipe Martins) e os comensais do centrão (Valdemar Costa
Neto).
A situação é particularmente constrangedora
para os fardados, cuja
simbiose com o bolsonarismo cobra seu preço com juros. Há generais de
quatro estrelas da reserva, dois ex-ministros da Defesa e ex-comandantes de
duas Forças, Exército e Marinha, no rol de investigados. Não é pouca coisa para
uma classe já bem desgastada.
Outro impacto é sobre o PL, partido com mais
recursos do país. Valdemar é o fiador de um cipoal de acordos já para as
eleições municipais de outubro, a começar pelo cargo de vice de Ricardo Nunes
(MDB) em São Paulo. A depender de como acabar envolvido, tudo fica em suspenso.
Do ponto de vista político, o que não
significa eleitoral, o ex-presidente já está condenado —tanto que perdeu seus
direitos políticos por oito anos devido justamente a um dos itens de sua dieta
golpista, o ataque sistemático ao sistema eleitoral brasileiro.
Mandar o sujeito para a cadeia, contudo, é
outra história, não só pelas repercussões políticas mais epidérmicas. É de se
esperar que Moraes tenha claro o que procurar, ao que tudo indica amparado
pelas indicações dadas pelo ex-ajudante de ordens Mauro Cid e pelo
relato duro feito pela PF, pois tudo com que o bolsonarismo precisa é de um
mártir.
Lula (PT) está aí para provar, presidente
pela terceira vez após amargar 580 dias na cadeia. A campanha de
desmonte da Lava Jato, de resto iniciada pelo mesmo Bolsonaro após usar o
impacto da operação para se eleger, foi além dos abusos judiciais apontados e
ganhou ares de política de Estado. Dia sim, dia sim, o presidente, algum
petista e, agora, até
um ministro do Supremo corroboram a tese de que foi tudo uma grande
armação internacional —os R$ 6 bilhões admitidos em roubos, ignorados.
Nesse clima, vale tudo. Assim,
Bolsonaro emula
pela enésima vez seu ídolo, Donald Trump, para dizer que está sofrendo uma
perseguição. É o que lhe resta no momento, e pode ser mais do que suficiente
para manter energizada a franja de eleitores que se dizem bolsonaristas,
estável desde que o ex-mandatário se mandou para os Estados Unidos para não
passar a faixa a Lula.
Do ponto de vista institucional, Moraes
colocou todas as fichas nesta rodada. Bolsonaro está acuado, pois sabe que do
ponto de vista de discurso é culpado, e as evidências que emergem parecem
gravíssimas. Se tinha capacidade de
ser um mentor ativo das conspiratas que o orbitavam, o ônus final das
provas é do ministro e da PF.
Para seus críticos, Moraes já é um Sergio Moro anabolizado
há anos, operando
em franjas além da legalidade estrita. Quando foi à casa dos Bolsonaro
na semana passada, de olho no mentor digital da família, o filho Carlos, já
apontava para onde iria, apesar de erros formais e alegações algo rarefeitas.
Seus admiradores e aliados apontam que Moraes é paciente e metódico, e que não mandaria a PF bater à porta de Bolsonaro sem uma estratégia pronta. Após duelar com o ex-presidente por quase cinco anos, chegou a hora da verdade.
Repetindo: "Há generais de 4 estrelas da reserva, 2 ex-ministros da Defesa e ex-comandantes de duas Forças, Exército e Marinha, no rol de investigados." Talvez até bons militares que se deixaram influenciar por um sabidamente MAU MILITAR!
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