Folha de S. Paulo
Revisão de gasto é necessária para que país
seja mais justo e eficiente, não apenas o governo
O governo antecipou
o pagamento de R$ 30,1 bilhões em precatórios deste ano. Rendeu
economia de R$ 2 bilhões em juros etc. contou
a ministra Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) a este jornalista.
Não precisou bulir com ninguém, não cortou serviço ou benefício. Achou uma nota
de R$ 100 no chão. Há outras por aí.
É muito dinheiro, R$ 2 bilhões. Faltam coisas
tão elementares como ultrassom e remédio em hospital público, carteiras e
material de limpeza em escolas etc.
É pouco dinheiro. Equivale a 0,1% do total da
despesa federal em 2023, que foi de R$ 2,1 trilhões.
É dinheiro bem gasto? É pergunta necessária,
claro, para qualquer item da despesa.
É preciso, possível ou recomendável cortar todos os ganhos obtidos com revisão de gastos e programas do governo? Não. Por exemplo, afora milagres, jamais será possível fazê-lo nas despesas com saúde pública, em que a necessidade é feia.
Essas perguntas simples sugerem o tamanho do
problema a resolver. Começou, pelo menos, com a criação da Secretaria de
Avaliação e Monitoramento de Políticas Públicas, por Tebet.
O trabalho irá mais longe se transformado em
prioridade obsessiva, se tema da conversa pública do presidente e do país, se
houver metas (para revisar programas, não de dinheiro a poupar).
Tebet diz que o governo vai analisar o gasto
de R$ 87 bilhões com precatórios neste ano. Por exemplo, vai tentar descobrir o
que são causas (honestamente) perdidas para o governo. Em vez de não pagar e
deixar o caso ir à Justiça, paga o que deve logo. Economiza recursos
administrativos e para de infernizar o cidadão. Pode poupar mais dinheiro em
juros e correção.
A ministra citou ganho de algo entre R$ 10
bilhões e R$ 20 bilhões com uma mera checagem da lista de beneficiários
do Bolsa
Família e com a mudança do método de concessão de auxílio-doença
do INSS.
Os benefícios pagos pelo INSS equivalem a
quase 47% da despesa do governo federal, mais de 9% do PIB. São aposentadorias
(uns 63% da despesa do INSS), pensões (20%), benefícios assistenciais (quase
11%, basicamente, BPC, para idosos e pessoas com deficiência muito pobres) e
auxílios.
Tebet diz que o governo vai estudar despesas
com BPC e auxílios (doença, acidente, incapacidade permanente). Pode economizar
algum. Mais gente de algum modo necessitada (de benefício social, saúde, escola
etc.) poderia ter acesso a direitos.
Tebet diz que vai estudar o seguro-defeso. É
uma espécie de seguro-desemprego para pescadores em época de proibição de
pesca, que custou cerca de R$ 4,4 bilhões em 2023 e talvez necessite de apenas
um quarto disso.
O abono salarial levou mais de R$ 25 bilhões
em 2023. Tem quem precise mais desse dinheiro?
De passagem: o Bolsa Família leva 12,8% do
gasto federal total, R$ 169 bilhões. O total do investimento federal em obras,
equipamentos etc. não passou de R$ 60 bilhões em 2023.
Mais importante, verificar se programas são
meritórios e se o dinheiro é bem gasto é um assunto de justiça social e de
eficiência geral do país. Cobrar imposto, que sempre causa alguma distorção
econômica, para jogar dinheiro pela janela, em especial na dos ricos, é um
problema sistêmico.
Quanto se gasta em salários acima do teto dos
servidores públicos e em penduricalhos de Judiciário e Ministério Público? No
Congresso? Não há ainda um plano geral, com metas e prazos, para automatização
do serviço público —a despesa com salários, aposentadorias, pensões e
benefícios é de 18,7% do total federal. No longo prazo, quanto se poupa em
vidas, sofrimento e dinheiro com um plano amplo de saúde preventiva?
Não se vai resolver o déficit com essas
economias necessárias. Mas o país vai se tornar mais eficiente e justo.
Tomara.
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