Folha de S. Paulo
Preocupação é que autonomia orçamentária
coloque ‘política’ dentro da instituição
Banqueiros manifestaram desconforto com o
risco de a PEC que dá autonomia
orçamentária e financeira ao Banco Central colocar
a "política" dentro da instituição.
A preocupação é que a PEC acabe vinculando,
na prática, o BC ao Senado, dando margem para interferências dos parlamentares
no órgão, que é responsável pelas políticas monetária e cambial, além de
regular e fiscalizar a atuação das instituições financeiras no Brasil.
Em outras palavras, que o Banco Central fique dependente do Congresso até mesmo para nomeações de cargos dentro do banco.
A preocupação de alguns dos CEOs dos
principais bancos no Brasil foi relatada ao próprio presidente do BC, Roberto
Campos Neto, em reunião, na semana passada, e ao ministro Fernando
Haddad (Fazenda).
No encontro, um dos banqueiros chegou a
pontuar que seria suicídio deixar o Senado aprovar o orçamento do BC. Outro
disse que não daria certo. Mesmo com a preocupação política, há também os que
consideram que a autonomia orçamentária não é uma panaceia, tem prós e contras
e deveria ser debatida com a seriedade que o tema exige.
Um deles sugeriu que o orçamento passasse
pelo crivo do CMN (Conselho Monetário Nacional). Só que nesse caso nada
mudaria. O orçamento do BC ficaria sujeito ao governo da mesma forma que
acontece hoje, já que o CMN é um colegiado que tem dois ministros (Fazenda e
Planejamento), além do presidente do BC, nomeado pelo presidente da República.
O texto da PEC, que está em tramitação no
Senado, não vincula o orçamento à aprovação do Senado. Mas há um artigo
estabelecendo que a fiscalização contábil, orçamentária, financeira,
operacional e patrimonial será exercida pelo Congresso com auxílio do Tribunal
de Contas da União.
A PEC segue sendo um tema sensível porque
Campos Neto, com uma atuação direta no Congresso, abraçou publicamente essa
agenda (diga-se de passagem, uma demanda bem antiga do BC, inclusive dos tempos
de outros governos do PT).
Fato é que a relação do presidente do BC com
Haddad está estressada por causa do debate público em torno da PEC e da
movimentação de integrantes do banco no Congresso.
Em entrevista à Folha, Campos
Neto disse que o texto da PEC é apenas um esqueleto com espaço
para negociação entre governo, Senado e BC. Ele apontou que mais de 90% dos BCs
no mundo com autonomia operacional têm também independência orçamentária.
Um ponto importante que o presidente do BC
revelou na entrevista foi que o colegiado da diretoria, que se reúne toda
semana, apreciou a PEC e a apoiou. O que inclui os novos diretores indicados
pelo presidente Lula.
As críticas dentro do governo à PEC não são
uma unanimidade. Tem quem defenda a autonomia orçamentária até mesmo para a
abertura do espaço fiscal com o BC fora do Orçamento da União.
O que tem incomodado o governo é que a PEC
tem apoio de parlamentares da oposição no Senado e de lideranças na Câmara.
O relator da PEC, senador Plínio Valério
(PSDB-AM), já disse que ela vai andar independentemente do governo. O temor é
que parlamentares criem dificuldades para o governo com a PEC para ganhar
vantagens em outras coisas.
Um ponto de consenso entre todos, inclusive
banqueiros, é o risco institucional da perda de servidores no BC. O mesmo
acontece com a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que fiscaliza o mercado
de capitais do Brasil.
Muito bom.
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