Valor Econômico
Preocupação do Copom parece ser evitar que o fim da indicação futura sobre a taxa de juros seja interpretada como mudança para pior no cenário básico de inflação e para os cortes na Selic
O Banco Central deu vários sinais de que
cogita acabar com a indicação firme de baixas de juros de 0,5 ponto percentual
nas duas reuniões seguintes, que vem sendo feita e renovada desde agosto.
Agora, a questão é quando e, principalmente, como fazê-lo, evitando
repercussões negativas.
A preocupação do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, pelo que foi dito por alguns de seus membros nas últimas semanas, parece ser evitar que o fim da indicação futura sobre a taxa de juros - ou seja, o “forward guidance” - seja interpretada como uma mudança para pior no cenário básico de inflação e para os próprios cortes na taxa Selic.
A preocupação é mostrar que, se o Banco
Central deixar de comunicar explicitamente cortes de juros nas duas reuniões
seguintes, isso não significa que as reduções de juros que hoje são
consideradas coerentes com a estratégia de política monetária deixarão de ser
feitas. O fim da indicação futura para os juros significa que o Copom ficará
com menos amarras para eventualmente agir diferente do sinalizado, numa
hipotética situação desfavorável que mude o cenário (algo que ninguém enxerga
concretamente agora).
O diretor de política monetária do Banco
Central, Gabriel Galípolo, foi o primeiro a dar o recado, em um evento da APCE.
“Mudanças no ‘guidance’ não necessariamente têm uma correlação com a taxa de
juros terminal”, disse, referindo-se à taxa de juros, que hoje está em 11,25%
ao ano, no final do ciclo de distensão.
O curioso é que o Banco Central não indicou,
claramente, a taxa Selic ao fim do ciclo. Apenas vem dizendo que o juro
terminará em terreno ainda contracionista para assegurar a queda da inflação
para a meta e a ancoragem das expectativas nesse objetivo. Aparentemente,
Galípolo está dizendo que, no fim das contas, um eventual fim do ‘forward
guidance’ não muda o atual cenário econômico do Copom e a sua forma de análise
das novas informações para determinar a Selic ao fim do ciclo de baixa.
O diretor de política econômica do BC, Diogo
Guillen, foi bem mais detalhado em explicar qual seria o impacto de um eventual
fim do ‘forward guidance’, em um evento do banco Goldman Sachs. “Parece que tem
uma confusão entre o que é o 'forward guidance' e o que é a determinação de
juros”, afirmou. “Você pode ter um mesmo cenário básico e não ter 'forward
guidance' porque a incerteza aumentou e você não pode prometer [o que fará com
o juro]. ‘Forward guidance’ é uma coisa, é um instrumento adicional de política
monetária. Depois, você tem juros. Você pode caminhar o mesmo caminho [no juro]
com ou sem ‘forward guidance’.”
A mensagem, na essência, é que o fim do
‘forward guidance’ não muda a direção dos juros. O que leva a uma questão:
então por que o Copom adotou o ‘forward guidance’? Essa é uma discussão mais
teórica sobre se vale a pena ou não fazer ‘forward guidance’, e em que
circunstâncias - mas tem repercussões concretas para a situação atual do Copom.
Na teoria, os BCs não precisam fazer ‘forward
guidance’, apenas têm de deixar claro qual é a sua função de reação, ou seja,
como pretendem agir de acordo com o cenário central previsto e possíveis
modificações desse cenário no caminho. O ‘forward guidance’, nessa visão mais
purista, é um instrumento de comunicação para situações em que o BC baixa os
juros a zero e não tem muito espaço para reduzir mais para evitar uma deflação.
O ‘forward guidance’, nesse caso, faz o serviço que o juro de curto prazo não é
capaz de fazer. A ideia é que o BC comunique a intenção de fazer algo com os
juros diferente do que faria na sua função de reação.
Aqui no Brasil, quando o Banco Central adotou
o ‘forward guidance’, os juros estavam em 13,75% ao ano. Será que o Copom
precisava algo mais além de explicitar a sua função de reação? O
economista-chefe para a América Latina da Goldman Sachs, Alberto Ramos,
perguntou a Guillen justamente se, mesmo sem ‘forward guidance’, o mercado não
iria precificar os mesmos cortes de juros que o Copom havia sinalizado. Guillen
riu da provocação: “Você tem que perguntar isso para o mercado”.
Como dito, essa não é apenas uma discussão
teórica. Conhecer os motivos pelos quais o Banco Central adotou o ‘forward
guidance’ ajuda a entender as implicações agora que se cogita retirá-lo. E qual
é a equação do BC para adotar o ‘forward guidance’? Do lado positivo, segundo
Guillen, ele “dá transparência na política monetária”, “coordena expectativas”,
“contribui para aumentar a eficácia da política monetária” e “reduz
volatilidade”. O lado negativo, disse, é que o mercado entende o ‘forward
guidance’ como uma promessa, por mais que o Copom tenha avisado que ele é
condicional à evolução do cenário. Quando o cenário leva o Banco Central a
fazer algo diferente, há uma perda de credibilidade e maior dificuldade de
coordenar movimentos futuros dos juros.
E qual é a mecânica mais prática de adoção do
‘forward guidance’? O presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse na
divulgação do Relatório de Inflação de dezembro que a decisão de prolongar ou
não o ‘guidance’ tem a ver com o nível de incerteza do cenário. Quando a
incerteza é maior, não vale renová-lo, porque o BC tem mais chances de incorrer
no custo de reputação apontado por Guillen. Ou seja, a eventual retirada do
‘guidance’ tem a ver mais com incertezas no cenário básico do que mudanças na
visão do BC sobre o próprio cenário.
■■Alex Ribeiro
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