O Estado de S. Paulo
A quem apelar, quando os polos caminham com
um tipo de visão de mundo que a ideologia torna impenetrável às críticas?
“É assim que ele pode entrar / na desolação
da realidade.” Esse verso de Yeats certamente foi escrito pensando numa Europa
com a religião em declínio e sem entusiasmo pelas expressões seculares da
salvação através de projetos políticos. No Brasil, a religião ainda é muito
forte, como também o são as esperanças milenaristas num mundo completamente
novo. No entanto, é possível usar o verso de Yeats e falar da desolação da
realidade num país cujo traço político é a polarização, movida por ásperas
redes sociais.
Começando pelo mais simples: a polarização
traz inimizade entre pessoas com ideias diferentes, e isso não é bom. Vivemos
uma epidemia de dengue que poderia ser mais bem combatida com iniciativas de
vizinhança destinadas a remover os focos de proliferação do mosquito. Como
realizar isso entre vizinhos que se detestam?
Alguns brasileiros esperam uma política externa mais próxima dos rumos definidos na redemocratização, sobretudo um discreto estímulo à solução pacífica dos conflitos. Estão condenados a não encontrar isso.
Um dos polos decidiu defender os valores do
Ocidente por meio de Donald Trump. Nessa concepção, o aquecimento global, assim
como o feminismo e uma chamada ideologia de gênero são considerados produtos de
um marxismo cultural, destinado a minar a economia e a estabilidade da família.
O outro polo volta suas energias para liderar
o Sul Global, uma entidade abstrata formada de democracias e ditaduras. Aqui há
uma nítida vantagem de reconhecer o fenômeno do aquecimento, mas, ao mesmo
tempo, um dilema: empurrar o mundo para uma ação coordenada ou exigir que os
países mais ricos paguem a conta. Não são elementos necessariamente
contraditórios, mas podem ser, dependendo da dramaticidade com que se encarne a
desejada liderança do Sul Global.
A desolação da realidade é mais evidente para
um brasileiro que examine o olhar do seu país em relação ao regime de Putin. Um
dos polos o admira por sua defesa das tradições, inclusive a campanha
repressiva contra o povo gay. O outro o vê sob a aura positiva da rivalidade
com os EUA e também como lembrança de uma revolução que já morreu, mas ainda
comove corações nostálgicos.
No que diz respeito a Putin, muitos de nós
não reconhecem a verdadeira política do país. Mas e daí? Quem se importa com
isso? Cada um dos polos, quando chega ao poder, executa sua visão partidária do
mundo e os outros que se danem.
É possivelmente um dado da desolação da
realidade que a polarização, pelas características do País, seja algo
duradouro. A única esperança de que a política externa seja um pouco mais
consensual, portanto um pouco mais brasileira, seria o Congresso Nacional.
Mas a verdade é que o Congresso não se ocupa
com intensidade deste tema. Participei de comissões de política externa e
observei, ao longo dos anos, que o interesse social era maior: grupos de
estudantes assistiam aos debates e se preparavam para exercer profissões cada
vez mais numerosas num país globalizado.
Exceto em situações mais extraordinárias,
como a frase de Lula em Adis Abeba, e um ou outro elogio a Maduro, o tema não
ocupa os partidos políticos, não oferece debates.
Minha expectativa é de que haja uma política
um pouco mais nacional. Não nego nem poderia negar aos vencedores o direito de
aplicarem suas ideias, ou ao menos o seu enfoque às coordenadas mais
permanentes de nossa política. Mas é preciso difundir no País a tese de que os
vencedores não podem fazer das relações externas uma página em branco. Houve um
chanceler de Bolsonaro que disse que não se importava que o Brasil se tornasse
um pária. Seu problema era seguir Trump na defesa dos valores ocidentais. Certamente,
não passou por sua cabeça que, se consultados, nós diríamos que não queríamos
ver o Brasil como pária internacional.
Da mesma forma, Lula tratou Maduro como se
trata um compadre, um companheiro de lutas. Mas essa não é a realidade de
nossas relações. Há muitas coisas que aconteceram sem que se tenha dado conta.
Uma delas é o fluxo de refugiados venezuelanos no Brasil. São quase 270 mil
pessoas que entraram no Brasil. Tive a oportunidade de entrevistá-los em
inúmeras viagens a Pacaraima. O Brasil os acolheu, investiu dinheiro e energia
para absorvê-los. Não pode ignorar seu drama e fingir que nada acontece na
fronteira.
Mesmo os yanomamis, que na verdade são uma
questão em comum com a Venezuela, precisam ser discutidos. O polo de direita
acha que os indígenas devem desaparecer na sociedade abrangente. Bolsonaro os
deixou à própria sorte. O polo de esquerda prometeu protegêlos, chegou a
trabalhar, mas se deixou levar pela imensidão da tarefa.
Os yanomamis também vivem a desolação da
realidade num país polarizado. Se um dos polos não quer protegê-los e outro até
o momento falhou nessa tarefa, a quem apelar?
Esta é a questão. A quem apelar, num país
polarizado, quando os polos caminham com um tipo de visão de mundo que a
ideologia torna impenetrável às críticas?
Olhar para o Congresso, então, é encarar a
pior das desolações da realidade, pois a energia se concentra em emendas,
dinheiro para reeleição e pouca vontade de contribuir com o equilíbrio.
HOJE FOI MAIS UM DIA TRISTE E CORAJOSO
ResponderExcluirPARA OS DEMOCRATAS DO MUNDO
E ESPECIALMENTE PARA OS DEMICRATAS DA RÚSSIA
■A Ditadura Russa, uma das que Lula e o PT se associam em suas articulações antiliberalismo e antidemocracia, se negava a entregar o corpo de Alexei Navalny a sua mãe, Lyudmila Ivanovna, e a sua esposa, Yulia Navalnaya.
=》A ditadura queria que a família aceitasse enterrar o corpo em local anônimo e chantageava a mãe de Navalny dizendo que o corpo estava se decompondo e que Dona Lyudmila agilizasse a decisão.
A mãe de Navalny não aceitou a chantagem e o regime teve que entregar o corpo do democrata que morreu nos cárceres da ditadura.
Os democratas russos corajosamente fizeram uma passeata de milhares para enterrar Alexei Navalny.
■■■No Twitter, escrevi dois quadradinhos há algumas horas::
= ¹ 》EdsonLuiz. @edson_pianca 3h
● " OS DEMOCRATAS DA RÚSSIA
HOMENAGEARAM ALEXEI NAVALNY
■Os democratas da Rússia são muito corajosos e não tiveram medo!
=》Estou...
●O medo deixa uma memória difícil no corpo. Era ditadura:: eu era de um grupo do PCB que já havia se convertido à democracia, hoje é o Cidadania23.
= ² 》EdsonLuiz. @edson_pianca 3h
■Eu era do PCB, mas tínhamos
a democracia como um valor absoluto, permanente e para todos. Eu tinha 19anos e muito medo.
=》Era pela democracia que lutávamos ; e o PT dizia que era pela democracia também.
■Eu sinto nojo quando vejo o PT alinhado com todos os ditadores do mundo!
Fato.
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