Folha de S. Paulo
Elucidação do caso Marielle deve ser
celebrada, mas revela que deterioração da segurança pública é maior do que se
temia
A aparente
elucidação do assassinato de Marielle
Franco e Anderson Gomes é uma excelente notícia. Espero que os
investigadores tenham coletado provas robustas o bastante para que o julgamento
dos suspeitos de ter encomendado a morte da vereadora se dê de forma técnica,
rápida e certeira. O momento é de satisfação e deve ser celebrado. Não há como
esconder, porém, que a boa nova chega embrulhada numa série de circunstâncias
que pintam um quadro de deterioração da segurança pública muito pior do que se
acreditava.
Se é verdade que o próprio chefe da Polícia Civil fluminense participou do planejamento do assassinato, então estamos diante de nada menos do que a falência do Estado. Se aqueles que deveriam zelar pela ordem pública são membros ativos do crime organizado, não há mais distinção entre polícia e bandido, entre lei e barbárie.
Habitantes de outros estados que não o Rio de
Janeiro podemos tentar nos tranquilizar imaginando que nossa situação não é tão
ruim. É verdade que o processo de
milicianização das polícias avançou mais no Rio do que em
outros lugares, mas a diferença é mais de grau do que de natureza. Em São
Paulo, por exemplo, o governador e seu secretário da Segurança Pública parecem
estar se esforçando para eliminar todos os vestígios de profissionalismo e
respeito à lei.
O caso Marielle revela também que o braço
político do crime organizado é mais longo do que se supunha. É muito
preocupante que um dos suspeitos, que é deputado federal, tenha exercido posto
de secretário municipal do Rio e outro seja conselheiro do Tribunal de Contas
do Estado. Se a população normaliza através do voto candidatos ligados a
milícias, é obrigação dos políticos que ainda não se deixaram contaminar erguer
um cordão sanitário em torno dessas figuras, impedindo-as de exercer cargos de
maior relevo. Deixar de fazê-lo é pregar mais uma tábua no caixão do Estado
brasileiro.
Verdade.
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