Correio Braziliense
Denúncias de prisões arbitrárias, ameaças,
torturas e mesmo a execução de opositores do regime são constantes. A Venezuela
vive um caos econômico
Fez bem o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva ao demarcar distância regulamentar do presidente da Venezuela, Nicolás
Maduro, que manipula as eleições para não correr o risco de não ser eleito e,
para isso, impede a candidatura de seus oponentes. Primeiro, havia sido o
Itamaraty a manifestar preocupação com as eleições em nome do governo
brasileiro, agora foi o próprio Lula que criticou Maduro e considerou “grave”
que Corina Yoris não tenha conseguido registrar sua candidatura à Presidência
da Venezuela.
A representante do principal grupo de oposição a Maduro não conseguiu inscrever a candidatura no prazo previsto e, por isso, está sendo impedida de concorrer. “Eu fiquei surpreso com a decisão. Primeiro, a decisão boa, da candidata que foi proibida de ser candidata pela Justiça indicar uma sucessora”, disse Lula. É que Maria Corina Machado indicou sua xará, Corina Yoris, para substituí-la como candidata de oposição.
“Achei um passo importante. Agora, é grave
que a candidata não possa ter sido registrada. Ela não foi proibida pela
Justiça. Me parece que ela se dirigiu até o lugar e tentou usar o computador, o
local, e não conseguiu entrar. Então, foi uma coisa que causou prejuízo a uma
candidata”, comentou Lula.
As declarações foram dadas durante cerimônia
de recepção ao presidente Emmanuel Macron, em visita ao Brasil, no Palácio do
Planalto. O contexto era perfeito para demarcar o distanciamento em relação ao
líder venezuelano; Macron endossou as declarações de Lula. A condescendência do
presidente brasileiro com Maduro até aqui estava se tornando um grande desgaste
político.
As eleições venezuelanas estão marcadas para
28 de julho e eram a chave de um acordo intermediado pelo Brasil, a pedido do
presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, para suspender as sanções econômicas
norte-americanas ao país vizinho. Como Maduro não cumpriu o acordo, essas
medidas foram restabelecidas. Por isso, Lula disse a Nicolás Maduro que o
processo democrático é “importante para a Venezuela voltar ao mundo com
normalidade”.
Maduro não está nem aí. Os Estados Unidos
precisam do petróleo venezuelano devido à guerra na Ucrânia, porém, para
restabelecer relações econômicas normais com Maduro, Biden não pode abrir mão
dos fundamentos da democracia na América Latina. Seria perder o discurso de sua
política externa em relação a Putin. Ocorre que o eixo de relações políticas e
econômicas da Venezuela mudou dos Estados Unidos e do Brasil para a China e a
Rússia.
Com Forças Armadas equipadas pela Rússia e
pela China, e treinadas por assessores cubanos, Maduro fia-se no controle que
exerce sobre elas (todo o setor produtivo estatal foi militarizado) para operar
a transição do seu regime “iliberal” para uma ditadura pessoal. Quando assumiu
o poder, com a morte de Hugo Chávez, os problemas já existiam, mas não como
agora. Está no auge de seu poder político, porém seu prestígio popular caiu
muito.
Sanções duríssimas
Denúncias de prisões arbitrárias, ameaças,
torturas e mesmo a execução de opositores do regime são constantes. A Venezuela
vive uma situação de caos econômico. Maduro aponta as sanções impostas pelos
Estados Unidos como causa dos problemas, mas a crise venezuelana é anterior. O
país não paga seus credores, inclusive os empréstimos contraídos com o BNDES.
As sanções norte-americanas foram duríssimas:
bloqueio de 31 toneladas de ouro que pertenciam à Venezuela e que estavam
armazenadas em bancos ingleses; imposição de licença que limita os
investimentos das empresas norte-americanas na Venezuela; sanções do governo
norte-americano a milhares de políticos e empresários venezuelanos; proibição
da venda para a Venezuela de peças que podem ser usadas para material bélico;
bloqueio de transações econômicas envolvendo moedas digitais por parte do
governo venezuelano; sanções a empresas russas que compraram e transportaram
petróleo venezuelano.
Milhões de venezuelanos procuraram abrigo em
outros países, inclusive nos Estados Unidos e no Brasil. Em 2019, o salário
mínimo na Venezuela correspondia ao equivalente a R$ 77; em junho de 2023, era
de 130 bolívares, o equivalente a cinco dólares e meio e a R$ 27. Maduro
promete um grande aumento às vésperas da eleição.
No poder desde 2013, seu regime “iliberal”
vigora desde 2016, quando obteve a aprovação da Suprema Corte para retirar
poderes da Assembleia Nacional, na qual estava em minoria.
Em janeiro de 2019, Juan Guaidó, presidente
da Assembleia Nacional, declarou-se presidente interino do país, após denunciar
que as eleições de 2018 haviam sido fraudadas. Brasil, Estados Unidos e Espanha
reconheceram Guaidó como presidente da Venezuela, mas sua atuação não teve o
efeito desejado. Com o passar dos anos, ele perdeu o apoio que possuía. Em
2022, a própria oposição venezuelana se reuniu e decidiu encerrar o governo
interino de Juan Guaidó e buscar o caminho das eleições oficiais.
Ainda bem que o Lula acordou.
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