terça-feira, 12 de março de 2024

Maria Cristina Fernandes - Reunião tensa sela pacto de convivência entre presidente da Petrobras e ministro

Valor Econômico

Aproximação entre Silveira e Haddad pode vir a quebrar a aliança indissolúvel que Rui Costa mantinha com o MME

A distribuição de dividendos extraordinários ficou para depois. No limite, até 25 de abril, quando acontecerá a assembleia de acionistas da Petrobras. A reunião, “tensa”, na definição de um participante, atravessou a tarde de ontem no Palácio do Planalto e terminou às 19h30. Foi dedicada à exposição dos planos de investimento pela diretoria da estatal ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e aos ministros Alexandre Silveira (Minas e Energia), Fernando Haddad (Fazenda) e Rui Costa (Casa Civil). Foi a terceira reunião sobre o tema em menos de uma semana.

Houve distensionamento baseado num “termo de convivência” entre Silveira e o presidente da estatal, Jean Paul Prates, selado por Lula. O compromisso foi de “harmonização” entre o Conselho de Administração, comandado por Silveira, e a diretoria, que responde a Prates.

O compromisso passa por Prates não mais comentar decisões do conselho. Foi assim que selou sua permanência à frente da empresa e é assim que pode vir a conseguir que seja levada à assembleia uma proposta próxima àquela que defendia previamente, de distribuição de metade dos dividendos extraordinários.

As articulações que levaram a esse entendimento ocuparam todo o fim de semana e passaram por Haddad, Silveira e Prates. Silveira também esteve com Gilberto Kassab, mas o presidente do PSD diz não ter tratado do tema. O titular do MME passou o fim de semana em São Paulo, onde fez check-up hospitalar e de onde também recebeu telefonemas para que amenizasse a posição da semana passada de reter 100% dos dividendos extraordinários em nome dos planos estratégicos da Petrobras.

O plano da Petrobras prevê o investimento de US$ 102 bilhões entre 2024 e 2028. A conta que, tanto a Fazenda quanto conselheiros independentes da Petrobras fazem, é que uma empresa deste porte pode se alavancar em até 2,5 seu ebitda (lucro bruto sem incidência de juros e tributos). Hoje a alavancagem (endividamento) da estatal não chega a 1,5.

Além de Silveira, o maior defensor da retenção dos dividendos extraordinários era Rui Costa. Até ontem, Silveira jogou em dobradinha com Costa, mas há esforços na Fazenda no sentido não apenas de buscar aproximação como também de reaproximá-lo de Prates. Ambos foram colegas no Senado.

A postura de Haddad na entrevista que se seguiu à reunião, de apaziguamento, teve este objetivo. Além de acionistas, a não distribuição de dividendos também frustrou expectativas do Tesouro, que estima perdas de até R$ 15 bilhões com a decisão. Na entrevista, porém, Haddad buscou a equidistância: “A Fazenda não está pressionando para um lado ou outro”. E não descartou nenhum cenário: “Em momento oportuno, o conselho pode avaliar a distribuição de dividendos extraordinários em parte ou todo”.

A retenção dos dividendos extraordinários levou a estatal a perder R$ 55,8 bilhões em valor de mercado na sexta-feira. A estimativa do mercado para a distribuição de dividendos extraordinários, que acabou represada, variava entre R$ 23 bilhões e R$ 42 bilhões. A avaliação é que um recuo do governo levaria a uma rápida recuperação dos seus papéis.

A percepção de interlocutores do governo é que o presidente Lula entrou na reunião da semana passada excessivamente influenciado por Rui Costa, um dos maiores críticos da gestão Prates. Também colaborou para o desentendimento da semana passada a participação do diretor financeiro da estatal, Sergio Caetano Leite, em encontro no Planalto na semana passada. Leite teve um posicionamento de enfrentamento com o presidente do conselho, Pietro Mendes, aliado de Silveira.

Como foi escolhido por Prates, de quem foi sócio, a postura de Leite acabou por desgastar o presidente da estatal e levá-lo à abstenção na reunião do Conselho de Administração, da qual participou por celular a despeito de estar na sala ao lado na sede da empresa. Ainda na semana passada, porém, Lula já tinha sinalizado a Prates que havia descartado sua substituição. Ao insistir com o presidente da Petrobras para que permanecesse no Palácio do Planalto depois da segunda reunião, Lula ouviu de Prates que ele perderia o último voo para o Rio. “Mando um avião levá-lo”, disse o presidente.

Maior defensor da retenção dos dividendos no caixa da Petrobras com o argumento de preservar o plano estratégico da estatal, o ministro da Casa Civil está desgastado pela defesa que tem feito, até aqui, do investimento da Petrobras na petroquímica Unigel, que já recebeu parecer desfavorável do TCU. Costa também tem acumulado sucessivos embates com Haddad e municiado Lula na pressão por gastos que comprometeriam a meta de déficit zero estabelecida para este ano. O início do entendimento de ontem sinaliza que uma aproximação entre Silveira e Haddad pode vir a quebrar a aliança indissolúvel que Costa mantinha com o MME até aqui.

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