O Globo
Se a empresa voltar a ter prejuízo ou tiver
redução do lucro quem mais perde é o próprio governo, seu maior acionista
Valor de mercado de uma empresa se recupera. Não foi a primeira vez que a Petrobras teve uma queda brusca. O problema é a percepção de interferência do Planalto nas decisões corporativas. Na última sexta-feira, as ações da estatal caíram 10,27%, fazendo evaporar R$ 55 bilhões de valor da companhia, pela decisão de não distribuir dividendos extraordinários. A atual oposição provocou um desastre parecido. Há três anos, na quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021, o então presidente Jair Bolsonaro anunciou que havia demitido o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, isso depois de muita tentativa de intervir no dia a dia da empresa. As ações, na época, caíram 6,6% numa sexta, e 21,5% na segunda, dia 22. Naqueles dois pregões a empresa perdeu R$ 102,5 bilhões de valor de mercado.
Dentro do Conselho de Administração da
empresa o que se diz é que, em outras crises, sempre houve coordenação entre o
presidente do Conselho e o presidente da empresa. Isso dava uma blindagem à
Petrobras, mesmo quando havia tentativa de interferência. O que é esquisito
agora é que há dois grupos do próprio governo. De um lado o presidente Jean Paul
Prates, de outro o ministro de Minas e Energia.
Há semelhanças entre o que houve na queda das
ações em 2021 e o que está acontecendo agora: tentativa de governar a empresa
diretamente do Palácio do Planalto. Naquela época, Bolsonaro dizia que a
Petrobras iria quebrar o Brasil e que o lucro
da Petrobras era "um crime”. Ontem Lula disse,
na entrevista ao SBT, que “o mercado é um dinossauro voraz que quer tudo para
ele e nada para o povo”. E que a
empresa não tem que pensar “só nos acionistas”. Essa fala do
Lula não faz sentido porque o governo é o maior acionista.
— O governo tem 40% do capital. O mercado tem
os outros 60% e tem porque botou dinheiro. Para fazer os investimentos, para
investir no pré-sal o governo procurou dinheiro no mercado. Quando há uma
volatilidade absurda como essa, o estrangeiro não coloca dinheiro porque acha
que se cai 10% num dia, no outro sobe, volta a cair forte, virou cassino —
avaliou um conselheiro.
Numa empresa de capital aberto com acionistas
no Brasil e no mundo existem regras de governança que precisam ser observadas,
compromissos de transparência, e obrigação de prestar contas aos investidores.
A maior parte dos dividendos vai para o próprio Tesouro. Essa é a forma como
uma empresa de capital aberto ajuda: sendo rentável. Com os dividendos,
recolhidos ao Tesouro, o governo faz políticas públicas.
Toda vez que há a percepção de que o governo
está diretamente decidindo investimento, preços e gestão da estatal, a
desconfiança em relação à empresa se traduz em queda do valor das ações. Em 12
de abril de 2019, quando Bolsonaro revogou um aumento de preço decidido pela
diretoria, houve também queda de 8% das ações e perda
de R$ 32 bilhões de valor de mercado.
A Petrobras ao fim da última gestão petista,
em 2016, era uma empresa endividada, a maior dívida do mundo numa empresa de
petróleo, e dava prejuízo. No governo Temer, com a gestão Pedro Parente a
companhia iniciou mudanças que a levaram de volta ao lucro. Foram criadas
barreiras de governança contra a intervenção indevida no Planalto. Essas
barreiras irritaram profundamente o ex-presidente Bolsonaro, e incomodam também
o atual governo.
Os sinais agora são cada vez maiores de volta
ao passado. Já foi anunciada a retomada da construção da refinaria Abreu e
Lima, que consumiu US$ 20 bilhões, e deve
custar mais R$ 8 bilhões para ser concluída. Em vez de admitir
os erros cometidos na obra que, pela previsão inicial custaria US$ 2 bi, o
presidente Lula culpou uma suposta “mancomunação entre juízes, procuradores e o
governo dos Estados Unidos”. Assim não há qualquer garantia de que os erros não
se repetirão.
O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates,
também já indicou que quer voltar a reestatizar o que foi privatizado da
empresa. Quer de volta
a Refinaria de Mataripe, e planeja retornar ao setor de distribuição
de combustíveis, do qual saiu quando foi privatizada a BR Distribuidora, hoje
Vibra. Nos dois negócios, a propósito, a Petrobras tem ações. Mas quer mais.
A interferência política produz queda nas
ações e pode levar a empresa de volta ao prejuízo ou à redução do lucro, o que
prejudica todos os acionistas, mas principalmente prejudica o governo, que é o
maior dos acionistas.
A colunista sabe das coisas.
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