Folha de S. Paulo
Gente da finança tem avaliações muito
equivocadas sobre o problema fiscal do país
A "opinião" mais importante de
"o mercado" é aquela que aparece nos preços dos ativos financeiros,
nos movimentos de compra e venda: no dinheiro.
Para simplificar, é aquele pensamento, por
assim dizer, que se manifesta objetivamente nas taxas de
juros dos empréstimos para o governo, na taxa de
câmbio ("preço do dólar"), no preço das ações e
outros menos cotados ou de impacto mais discreto.
Não tem lá muita relevância prática a opinião política dessas pessoas que administram ou assessoram a administração do dinheiro mais ou menos grosso, afora em casos específicos de lobby pesado de gente pesada.
No entanto, se alguém tem curiosidade sobre o
assunto ou quer reforçar suas ideias, preconceitos ou teorias conspiratórias
sobre a "Faria Lima", a pesquisa
Quaest sobre o pensamento vivo de "o mercado" pode ter alguma valia,
por vezes até com um traço cômico.
Nessa pesquisa, em geral se ouve uma centena
de pessoas do mercado financeiro: administradores de dinheiro, economistas ou
analistas.
Há resultados óbvios, que de resto seguem em
linhas gerais, embora mais voláteis, a tendência da população, como a no caso
da popularidade de Lula.
Para 90% de "o mercado", a
avaliação do governo Lula era negativa em março de 2023. O desgosto baixou para
44% em julho de 2023 (apenas quatro meses depois!), quando eram aprovados o
arcabouço fiscal, a reforma tributária e outras mudanças relevantes.
Neste março, a avaliação negativa voltou a
subir, para 64%. Tudo isso por causa de Israel ou, bilhões de vezes mais
importante, por causa dos
dividendos da Petrobras?
A política econômica estava indo na
"direção errada" para 98% em março do ano passado. Na animação de
julho de 2023, tal avaliação negativa baixou a 53%. Neste março, subiu a 71%. O
que mudou na política econômica de Lula? Nada, goste-se ou não dela.
No universo do disparate, há opiniões sobre o
que pode alterar o resultado fiscal (despesas, receitas) ou contribuir para
cumprimento da meta de déficit primário deste ano.
Para 56% de "o mercado", a
aprovação da emenda constitucional da reforma administrativa "contribui
muito" para o cumprimento das metas de 2024; para 25%, "contribui
pouco".
Quem quer que tenha passado os olhos nessa má
reforma administrativa, que trata de serviço público, servidores, carreiras,
sabe que a coisa não afetaria em nada o gasto público neste ano. Mesmo uma boa
reforma talvez alterasse a despesa muitos anos adiante, se é que será possível
comprimir ainda mais e de modo relevante esse gasto federal (a questão maior é
a eficiência da máquina).
Em um disparate de aceitação menor, mas ainda
muito espantoso de ignorante, pois se trata de gente que gerencia ou palpita
sobre milhões, 16% acreditam que a autonomia financeira do Banco Central
ajudaria muito no cumprimento das metas (para 23%, ajudaria pouco).
As figuras políticas mais admiradas são da
direita, bidu. Mas precisa ser da direita amiga do golpe e das campanhas contra
a vacina? Para 45%, a imagem do Brasil no exterior piorou desde a posse de Lula
(eram apenas 20% em julho do ano passado); para 25%, melhorou. Hum. É um
palpite.
Seria preciso ter pesquisas de "imagem
no exterior" para cravar uma possível dissonância entre os povos dos
mercados daqui e a opinião de estrangeiros em geral.
Mas alguém apostaria, colocaria dinheiro, na
hipótese de que a imagem externa do Brasil sob Lula é pior do que nos tempos de
Jair Bolsonaro? Pelo menos este jornalista ouve de gente de "o
mercado" lá fora que a imagem melhorou. Quem sabe seja uma amostra
enviesada, né.
Ainda assim, para 53% Lula é favorito na
distante eleição presidencial de 2026.
Muito bom! Ao contrário de muitos outros colunistas, porta-vozes e capachos de "o mercado", este tem opiniões pessoais e particulares.
ResponderExcluirA elite econômica e sua dissonância cognitiva.
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