terça-feira, 23 de abril de 2024

Andrea Jubé - A hora e a vez de um mineiro no Planalto

Valor Econômico

Entre as raposas felpudas ainda em atuação na política nacional, há quem afirme que falta no entorno do presidente Luiz Inácio Lula da Silva um mineiro com os predicados de Tancredo Neves para dialogar com o Congresso. Se lhe cobravam uma postura mais incisiva, Tancredo devolvia com suavidade: “Não há mineiro que não seja conciliador. Não há mineiro que seja radical”.

Nos mandatos anteriores, Lula cercou-se deles no palácio: além do vice José Alencar (morto em 2011), teve José Dirceu na Casa Civil, Luiz Dulci, na Secretaria-Geral, Walfrido dos Mares Guia, na articulação política, Ricardo Berzoini, nas pastas do Trabalho e da Previdência.

Na gestão Lula 3, o presidente não tem mineiros no seu núcleo político mais restrito. Orbitam o gabinete presidencial quase diariamente: os paulistas Alexandre Padilha (articulação política) e Fernando Haddad (Fazenda), o baiano Rui Costa, da Casa Civil, o gaúcho Paulo Pimenta, da Comunicação Social, e o baiano de nascimento, radicado em Sergipe, Márcio Macêdo, da Secretaria-Geral. O único mineiro no primeiro escalão é Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, que se notabilizou por conquistar a confiança de Lula na velocidade de um raio.

A percepção de alguns decanos da política é de que o time principal de Lula é eclético, mas desunido. Vestem a mesma camisa, mas trocam caneladas nos bastidores, de modo que a quantidade de faltas uns nos outros atravanca a relação com o Congresso. Para um governo que prega menos ódio e mais amor, falta um conciliador.

Consciente da desarticulação do time, Lula convocou uma reunião para sexta-feira (19) no Planalto a fim de colocar ordem na Casa e afinar o diálogo interno. Participaram Padilha, Pimenta, Rui Costa, e os líderes governistas José Guimarães (Câmara), Jaques Wagner (Senado) e Randolfe Rodrigues (Congresso).

Nessa segunda-feira (22), o presidente tornou públicas algumas das recomendações que fez aos auxiliares naquela reunião. Sobrou até para o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic), Geraldo Alckmin, e para o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias: “O Alckmin tem que ser mais ágil, tem que conversar mais. O Haddad tem que, em vez de ler um livro, perder algumas horas conversando no senado e na Câmara. O Wellington [Dias], o Rui Costa, passar a maior parte do tempo conversando com bancada A, bancada B”, exigiu.

Lula levou à luz as cobranças que havia feito entre quatro paredes porque logo após a reunião daquela sexta-feira, em que fez um apelo por harmonia e diálogo, surgiram novas fissuras na relação com o Senado. Circularam vazamentos de que, no encontro, Rui Costa e Guimarães teriam saído em defesa do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e criticado o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ante a aprovação da emenda constitucional (PEC) que resgatou os “quinquênios”, com impacto fiscal de R$ 42 bilhões.

Questionado, Rui Costa negou com veemência o relato, e Pacheco reagiu em nota, alegando que Padilha e os líderes Wagner e Randolfe podem avaliar sua postura com o governo. Sem citar Costa ou Guimarães, emendou: “Com alguns outros, eu mal converso”.

Em verdade, Costa gostaria de não transitar fora de seu quadrado, seja para não invadir o território de Padilha, seja porque tem perfil de gestor. Mas a Casa Civil, por definição, é um ministério político, e cada vez mais ele tem sido cobrado a desempenhar esse papel.

No ano passado, foi convocado por Lula a estabelecer uma relação com Arthur Lira, que se indispôs com Padilha. Coube ao líder do União Brasil, Elmar Nascimento, também baiano, aproximar Lira e Costa. Adversários em 2022, Costa e Elmar trocaram farpas na campanha. Com Lula vitorioso, Costa vetou Elmar para o ministério. Meses depois, com Elmar de olho na presidência da Câmara em 2025, ambos estavam conciliados, e fazendo a ponte entre Lira e o Planalto.

Desfiando elogios a Costa, Elmar disse a interlocutores que, se falta ao ex-governador da Bahia traquejo político, ele tem qualidades como pragmatismo e lealdade. Segundo o líder do União, se Costa tem críticas a alguém, são feitas na presença do interlocutor, e não pelas costas.

Para uma reunião convocada por Lula para afinar a articulação política, a nova celeuma com Pacheco foi desnecessária e atrapalhada. Num cenário em que Lira vai a público chamar Padilha de “desafeto”, e Pacheco irrita-se com Rui Costa e Guimarães, o presidente estabeleceu que todos os ministros têm o dever de manter diálogo permanente com deputados e senadores.

Padilha é o articulador político por definição e pelo cargo que ocupa, responsável pelo encaminhamento das posições do governo nas votações, e na interface com os parlamentares sobre emendas e cargos. Mas a percepção de Lula é de que uma relação sem sobressaltos com o Legislativo é dever de todos os auxiliares. Para mostrar que jogam juntos, na noite desta segunda-feira, Rui Costa e Padilha participariam de jantar com os vice-líderes do governo na Câmara.

Por falar em Minas Gerais, Lula reencontra-se com Walfrido nesta sexta-feira em Belo Horizonte, na inauguração de uma fábrica de medicamentos. Lula reconhece o valor dos mineiros. Na campanha em 2022, em um ato em Juiz de Fora, declarou que eles sempre querem dialogar. “De conversa em conversa, o mineiro vai ganhando espaço", elogiou.

 

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