Valor Econômico
Livro discute problemas e soluções para tornar políticos mais responsivos aos eleitores
Nas eleições de 2010, o economista Marcus
Pestana foi eleito deputado federal com 161.892 votos, após longa carreira como
professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, vereador (1983-1988),
deputado estadual (2007-2010) e duas passagens como secretário estadual no
governo de Minas Gerais, comandando Planejamento (1995-1998) e Saúde
(2003-2010).
Transcorrido quase um ano de seu primeiro
mandato em Brasília, Pestana resolveu contratar uma pesquisa para analisar seu
desempenho parlamentar na cidade natal e principal base eleitoral, Juiz de
Fora, onde havia recebido o apoio de 19.937 eleitores.
Ao realizar o levantamento, a surpresa veio logo na primeira pergunta. Quando perguntados em quem haviam votado no pleito realizado apenas um ano antes, 74,1% dos entrevistados não conseguiram se recordar da escolha do seu representante para a Câmara dos Deputados.
Apesar da pouca memória do eleitor
juiz-forano, Marcus Pestana descobriu que não era um total desconhecido do
eleitorado local: apenas 17% dos pesquisados afirmaram não ter ideia de quem
era o político, enquanto o restante se dividia entre quem já tinha ouvido falar
dele (52%) e quem o conhecia pouco (27%) ou muito (4%).
Interessado em ter um feedback do seu
trabalho no Congresso, Pestana selecionou as três votações mais importantes e
polêmicas daquele ano de 2011 (elevação do salário mínimo, o novo Código
Florestal e a criação de um novo imposto para o financiamento da saúde, uma de
suas especialidades) para saber como o eleitor de sua cidade avaliou o seu
posicionamento.
O resultado é impressionante: na média, 96%
dos cidadãos consultados não tinha a mais remota ideia sobre como o parlamentar
mineiro votou. E entre a minoria que afirmava saber o posicionamento do
deputado, a metade simplesmente errou a resposta.
Esses dados são surpreendentes porque eles
estão longe de ser fruto de um caso isolado, numa localidade qualquer. Com uma
população de 540.756 habitantes, Juiz de Fora é uma das maiores cidades
mineiras, responsável pelo sétimo maior PIB municipal do Estado, além de ser
berço de importantes políticos, como o ex-presidente Itamar Franco e o
ex-deputado Fernando Gabeira.
Tampouco os resultados podem ser atribuídos a
uma possível atuação apagada de Pestana. Apesar de novato no Congresso, Pestana
tinha uma bagagem intelectual e política que rapidamente o posicionou no alto
clero do parlamento brasileiro, sendo indicado logo no primeiro ano de mandato
como titular na importante Comissão de Saúde, além da comissão especial de
Reforma Política, entre outros trabalhos.
Para tirar a prova, Pestana encomendou que os
entrevistadores fizessem as mesmas perguntas sobre o comportamento de outro
parlamentar, seu conterrâneo Júlio Delgado. Os resultados foram igualmente
desapontadores.
A história acima é narrada no livro “Desafios
do sistema político brasileiro”, coletânea de artigos organizada por Bernardo
Sorj e Sergio Fausto e publicada recentemente pela Fundação FHC, para a qual
tive a honra de escrever um capítulo. Essa desconexão entre eleitores e
políticos, também captada por outras pesquisas, tem raízes estruturais, segundo
a análise dos autores convidados.
Eleições disputadas em territórios muito
grandes e populosos distanciam os deputados de seu eleitorado. Eleições caras,
financiadas pela abundância de recursos dos fundos eleitoral e partidário
distribuído de forma concentrada pelos dirigentes partidários, elevam a
barreira à entrada de novos candidatos. Partidos fracos, lançando centenas ou
milhares de candidatos em cada Estado, dificultam a avaliação dos cidadãos e
incentivam o personalismo nas campanhas.
Para discutir soluções para diminuir a
individualização na atuação política, o enfraquecimento dos partidos e a baixa
responsabilização dos políticos perante os eleitores, foi realizado na última
sexta debate com alguns dos autores do livro e três políticos: a deputada
Adriana Ventura, o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia e o próprio Pestana.
Entre as propostas, três opções para um novo
sistema eleitoral poderiam levar a campanhas mais baratas, fortalecendo os
partidos ou aproximando os políticos de seu eleitorado.
No modelo de lista fechada, em vez de
escolher um candidato, o eleitor votaria no partido, que elaboraria uma lista
pré-ordenada de candidatos. No sistema distrital, cada Estado seria dividido em
pequenos distritos, cada qual responsável por uma cadeira de deputado, com os
partidos indicando um único candidato para a disputa.
Um modelo intermediário seria manter o
sistema eleitoral vigente, porém dividindo os Estados em regiões menores, cada
uma delas responsável pela escolha de oito deputados (número equivalente ao dos
menores Estados atualmente).
Todas as propostas têm suas vantagens e
custos, e qualquer mudança exigiria muito debate. Melhorar a qualidade da nossa
política, tornando os representantes mais responsáveis, é tarefa quase
impossível - porém, nunca foi tão urgente.
Verdade.
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