O Globo
Regulamentação agora vai passar pela batalha
da aprovação em um Congresso com poderes excessivos
A solenidade e as palavras confiantes do
ministro Fernando
Haddad, ao entregar a regulamentação da Reforma
Tributária, eram as de uma pessoa vitoriosa. Cada passo dessa
reforma tão esperada é um feito, de fato. Agora os 500 artigos e as 300 páginas
que prometem simplificar a vida dos contribuintes brasileiros precisam ser
digeridos, entendidos e, quem sabe, aprovados sem maiores distorções. No meio
do caminho tem um Congresso que chegou a um ponto de hostilidade tal que o
governo terminou o dia ontem achando que havia vencido uma queda de braço
apenas porque adiou a votação dos vetos.
A tarde de ontem de Brasília era a cena exposta da difícil governabilidade do Brasil. Ministros correndo atrás de deputados, em reuniões urgentes e sequenciais, tudo para tentar evitar a derrubada dos vetos presidenciais. Chegou ao absurdo de o governo liberar emendas para que o Congresso não derrubasse o veto às próprias emendas. Explicando melhor. Um dos vetos de Lula recaiu sobre uma parte das emendas de comissão, 10% de tudo o que os congressistas abocanham do orçamento público, ou seja, R$ 5,6 bilhões. Para que esse veto não fosse derrubado, o governo prometeu liberar R$ 3,6 bilhões. Noves fora, nada. É muito desgaste por um mero adiamento.
Para aumentar as chances de aprovação da
regulamentação sem que o projeto seja desfigurado, o Ministério da Fazenda
conversou com os estados e municípios durante a elaboração. Haddad disse que a
preparação do projeto “foi acompanhado de ponta a ponta por representantes de
estados e municípios”. Fez isso como estratégia para reduzir as reações
federativas. Mas este é um ano eleitoral, num país polarizado, com governadores
querendo eleger seus prefeitos no máximo de municípios. E com municípios em
disputa. Além disso, em ano de pleito, o funcionamento do Congresso será
encurtado. Qual a chance e quanto custará aprovar essa regulamentação por
melhor que ela tenha sido formulada?
O governo tem tido muito mais dificuldade de
organizar sua coalizão, em relação aos dois primeiros mandatos. Naquela época,
o governo tinha maioria, alta popularidade, e um Congresso com partidos com
alguma coesão e liderança. A desorganização dos últimos anos, com o avanço do
Congresso sobre a execução orçamentária torna mais difícil, mais caro, mais
penoso qualquer projeto de governo. Bolsonaro que não tinha proposta alguma —
ele mesmo chegou a dizer que veio para destruir e não construir — entregou poderes
excessivos e o orçamento secreto ao Congresso. Fazer o caminho de volta tem
sido cada vez mais difícil, porque os partidos são mais do que nunca
ajuntamentos aleatórios sem lideranças e sem ideias.
O governo também tem errado. Vive-se a
estranha situação de o chefe da Casa Civil ter que fazer reuniões que caberiam
ao articulador político, porque o presidente da Câmara não fala com o
articulador político. Pirraça ou não de Arthur Lira,
o fato é que a incapacidade de Alexandre
Padilha exercer todas as atividades do cargo exibe mais uma
faceta da desorganização geral na relação entre Executivo e Legislativo.
Na terça-feira às seis da tarde, o governo
ainda achava que era possível conter em 29 subsetores a concessão tributária
para o setor de eventos, o Perse. O governo quando começou a negociar queria
que os beneficiados com a suspensão dos pagamentos de impostos federais fossem
apenas 12 subsetores. O Congresso queria que fosse 44. Negociou-se um limite de
29. E acabou sendo aprovado para 34. Todo mundo cedeu? Sim, mas o governo teve
que ceder mais, até porque no início dessa conversa, o ministro Fernando Haddad
queria o fim do programa de estímulo fiscal que foi pensado para o setor de
eventos durante a pandemia.
Quando apresentou a regulamentação da Reforma
Tributária, o ministro Fernando Haddad descreveu um mundo há muito tempo
desejado pelo Brasil, com investimentos e exportações desonerados, com produtos
de consumo popular com preços mais baixos, sem cumulatividade de impostos. “O
conjunto de benefícios desta reforma é inestimável”, concluiu o ministro.
Mas agora tudo passará pelo campo minado da
negociação com o Congresso, processo no qual para aprovar mesmo medidas
técnicas e com benefícios para o país, o governo precisa entregar parte do
próprio mérito da medida. Adiar os vetos é fácil, e inútil. Aprovar a
regulamentação será uma difícil batalha.
É verdade.Eu tô parecendo a Sabrina Sato,rs.
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