O Globo
Petrobras e Venezuela são temas sem relação
óbvia, mas que têm grande potencial de desgaste para Lula e o PT
O governo Lula não teve respiro em 2024. Da
relação truncada com o Congresso à política externa, o que se vê é um
presidente com dificuldade para pôr em marcha seu plano de recuperação da
popularidade, de que faz parte, por ora, a retomada da agenda de eventos
políticos e lançamentos de obras país afora, mas que disputa espaço com os
incêndios que ele precisa apagar em diferentes frentes.
A crise que pode levar à queda do presidente
da Petrobras não vem de hoje. Já teve diferentes graus de intensidade, mas a
situação de Jean Paul Prates parece ter chegado a um ponto de não retorno, uma
vez que nem a solução para o impasse na distribuição de dividendos
extraordinários parece mais capaz de lhe garantir sobrevida.
Até ministros que vinham atuando como bombeiros e fazendo contraponto à dupla Rui Costa e Alexandre Silveira para preservar Prates parecem ter entendido que não vale a pena manter uma disputa interna quando Lula não parece mais disposto a bancar o comandante da petroleira.
Para Fernando Haddad, parece ser mais
relevante assegurar que Costa e Silveira deixem de interditar o pagamento dos
dividendos, uma vez que não é possível lhes dar nenhuma outra destinação, e
esses recursos, ainda que extraordinários, serão bastante bem-vindos num
momento em que o Legislativo dificulta a aprovação de medidas que garantiriam
outras fontes de recursos para os cofres da União.
Deixado sem pai nem mãe, Prates se
enfraquece. O mais cotado para substituí-lo, o atual presidente do BNDES,
Aloizio Mercadante, é alguém que, no início do governo, o PT tentou cacifar
como “contraponto” à política econômica de Haddad, mas que teve a cautela de
evitar que a narrativa prosperasse a ponto de antagonizá-lo com o ministro da
Fazenda. Passado um ano e alguns meses da posse de Lula, são comuns no mercado
elogios à mudança de Mercadante na interlocução com esse e demais setores da
iniciativa privada.
Além da necessidade de manejar uma crise,
como a da Petrobras, que pode ter consequências concretas no valor de mercado
da empresa, Lula também se vê premido pela escalada do aliado Nicolás Maduro em
sua campanha pela “anexação” à Venezuela do território de Essequibo,
pertencente à Guiana. É um grande clichê dizer que autocratas como Maduro
lançam mão, quando pressionados, da cartada de recorrer a uma campanha de
anexação para se fortalecer internamente.
A campanha pela incorporação da região que se
mostrou rica em jazidas de petróleo é vista pelo ditador como uma forma de
demonstrar força e garantir a vantagem numa eleição já marcada pela absoluta
falta de equilíbrio de condições entre ele e os poucos que conseguiram se
registrar para enfrentá-lo nas urnas.
As viradas de mesa eleitorais já tinham
forçado Lula a ensaiar uma leve mudança no discurso de aval absoluto ao aliado,
fato que não foi bem recebido em Caracas. Agora, com o novo ato na encenação da
campanha por Essequibo, o governo brasileiro ainda parece atônito, disposto a
aguardar para ver se é apenas uma bravata ou se Maduro dará mais algum passo
para tentar tirar a tal anexação do papel. Se fizer isso, Lula terá de descer
do muro, não só pela razão óbvia de que uma ação militar de Maduro implicaria passar
por território brasileiro, mas pelas consequências graves na geopolítica
continental e global.
Petrobras e Venezuela são temas sem relação
aparente, mas que têm em comum, além da gravidade individual das duas crises, o
fato de serem assuntos com grande potencial de desgaste para Lula e o PT ,
comumente usados com sucesso pela direita bolsonarista para fustigá-los.
Manejar a contento as duas crises, portanto, é condição essencial para o
presidente sair da situação que não chega a ser alarmante nas pesquisas, mas
que tem sido incômoda.
Pois é.
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