Folha de S. Paulo
Semanas azedas nos EUA e gambiarras para
elevar gasto atrapalham bom início de 2024
O ano começou quentinho na economia. Deu
esperança de um crescimento de ao menos 2% neste 2024. Não é grande coisa, mas
é melhor do que o frio miserável dos anos de 2017 a 2019, de 1,4% ao ano.
Quem sabe possa ser ainda melhor, como torce
o Ministério
da Fazenda. Tomara. Pena que, nas últimas semanas, caíram umas gotas d’água
nesse chope barato e umas moscas na nossa sopa.
Para começar com uma velha história infelizmente sempre atual, o clima voltou a azedar nas finanças, por causa da economia americana. O dólar foi a R$ 5,06; em dezembro, baixara a R$ 4,83.
É ruinzinho para a inflação e
sintoma da percepção de que as taxas de juros americanos
vão cair mais tarde ou menos neste ano, pois a atividade econômica lá está mais
forte do que se esperava e a inflação cai menos do que se deseja.
Assim, as taxas de juros por aqui também
subiram, no atacadão do mercado de dinheiro. Para negócios de prazo superior a
dois anos, estão mais altas do que em agosto de 2023, quando a Selic, a
"taxa do BC", de curtíssimo prazo, começara a baixar.
Para piorar, há fumaças de que a Selic pode
cair mais menos até o final do ano. Não é grande coisa, mas sempre um
transtorno para pobre endividado convalescente, como o Brasil.
A receita do governo foi bem no primeiro
bimestre. Ainda assim, falta muito dinheiro para que se chegue ao déficit zero;
continuam a sabotar o plano de Fernando
Haddad.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco
(PSD-MG), deixou
caducar parte de uma medida provisória, o que pode tirar uns R$ 10 bilhões por
ano do governo. Permite que prefeituras pequenas paguem menos contribuição
previdenciária para o INSS.
Pacheco também dá força à campanha
dos estados para deixar de pagar parte da dívida com a União (o que
significa mais dívida federal, tudo mais constante, dívida que se quer conter
com o déficit zero).
Nesta terça (2), Haddad voltou a falar
de "pacto
entre Poderes", para que as contas públicas não sangrem. Está difícil.
A Petrobras vai pagar menos dividendos, o que
também tira dinheiro do seu principal acionista, a União. O pessoal da Fazenda
diz que não contava com esse dividendo extra. Como falta dinheiro, tanto faz se
a receita entra por outro guichê.
O governo quer diminuir a conta de luz. Pode
até aparecer com engenharias financeiras espertas (que também têm custo), mas o
ministério de Minas e Energia propôs ainda gambiarras que tirariam recursos do
Tesouro.
O setor elétrico é um salseiro, com subsídios
errados e preços altos. Mas de reforma não se fala. Além de complicada e exigir
muito trabalho inteligente, reforma série mexeria com um monte de subsídios
para empresas com amigos no Congresso.
A Fazenda consegue por ora segurar o socorro
para companhias aéreas e agricultura, pois não há dinheiro e, se
houvesse, a ajuda seria no mais das vezes indevida. Mas o assunto não morreu.
Foram para o vinagre as ideias de rediscutir
neste ano a indexação do piso dos benefícios da Previdência ao salário mínimo e
a vinculação de gasto em saúde e educação à receita. Tais despesas vão crescer
e comprimir o já diminuto dinheiro para investimento federal em obras e
equipamentos, de resto picotado de modo ineficiente por emendas parlamentares.
O plano naufragou por causa do clima político azedo e das eleições municipais.
Se houver mudança na meta de déficit zero,
mais adiante, quase certa, menos perspectiva haverá de queda mais rápida de
taxas de juros.
Não é augúrio de desastre. Mas não vamos
muito mais longe. Na verdade, mesmo que Lula 3
fizesse mais mudanças de peso, o crescimento demoraria uns anos mais para
acelerar. Mas estamos tratando aqui de tantas coisinhas miúdas do curto prazo.
Aquele desânimo, de hábito.
Sei.
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