O Globo
Em tempos de eleições municipais, vale refletir sobre a importância das cidades e o resultado das intervenções estatais
Ao analisar a baixa produtividade da economia
brasileira, o que significa produzir pouco dado o capital instalado e a mão de
obra alocada, é necessário compreender que parte do problema decorre de
ineficiências causadas pelo mau funcionamento das cidades.
Em tempos de eleições municipais, vale
refletir sobre a importância das cidades e o resultado das intervenções
estatais.
O erro mais comum em nossa tradição intervencionista, nos três Poderes, é desconsiderar as leis de mercado, ou seja, a resposta dos preços — no caso, da terra e de imóveis — a fatores que afetam a demanda e a oferta. As dinâmicas econômicas (como a saída da indústria e a atração de serviços nas cidades grandes) e choques exógenos (como a pandemia) afetam preços e promovem a reciclagem do uso da terra.
Temos uma tendência de responder às mudanças
com mais legislações quando, na verdade, seria necessário maior flexibilidade
nas regras do jogo, algo ainda mais improvável em um país que valoriza pouco as
evidências empíricas e tem máquina pública muito engessada.
Fechar os olhos a preços, achando que tudo se
resolve com leis, acaba gerando mais distorções e ineficiências. Um erro comum
é criar legislação muito rígida, complexa e detalhista para o uso e ocupação do
solo, o que encarece construções e agrava os problemas urbanos.
O preço da terra direciona as inovações e os
investimentos privados nas várias regiões das cidades. Preços elevados em
regiões centrais são incentivos naturais para o uso mais eficiente de espaços,
como evitar recuos nas construções, verticalizar e permitir habitações ou
escritórios com áreas menores. Dessa forma, pode-se viabilizar a moradia de
pessoas com renda baixa e negócios menores nessas regiões.
Mesmo bem-intencionadas — visando evitar
grandes sombras, congestionamento, destruição do patrimônio histórico e a
gentrificação (quando transformações de áreas urbanas provocam sua valorização
e o deslocamento de antigos moradores) —, as restrições construtivas em regiões
centrais acabam, muitas vezes, causando mais problemas. Ao criarem espaços
vazios e subutilizados, encarecem os imóveis e elevam os custos de transporte.
De quebra, as muitas exigências sobre imóveis
tombados inviabilizam a preservação de prédios históricos. Pode-se até
preservar a moradia de uns poucos, mas ao custo de empurrar outros muitos
tantos para bairros distantes, longe dos serviços públicos e das oportunidades
de trabalho, especialmente diante das deficiências do transporte público.
Enquanto isso, muitas vezes os mais pobres preferem morar precariamente em
regiões mais próximas do centro.
O mercado de trabalho é elemento central. Não
é o planejamento da cidade que a faz prosperar, mas sim o crescimento do
mercado de trabalho, aponta Alain Bertaud no livro “Ordem Sem Design”. O mau
uso e ocupação do solo prejudicam o funcionamento do mercado de trabalho.
Cidades disfuncionais implicam maiores fricções que dificultam a
correspondência (matching) entre oferta e demanda de trabalho, bem como a
qualificação de pessoas às demandas do mercado.
A subocupação dos centros urbanos, regiões
com maior infraestrutura, é má notícia para o crescimento econômico. A maior
concentração e interação de pessoas e negócios é alavanca para disseminação do
conhecimento, inovação e empreendedorismo, o que significa maiores ganhos de
produtividade.
Além disso, há ganhos decorrentes das maiores
escalas de produção, da especialização dos negócios e dos menores custos de
transação. É isso que faz as grandes cidades serem mais produtivas do que as
cidades menores.
Cidades maiores e menores se complementam.
Algumas atividades que requerem grandes plantas e dependem menos de mão de obra
mais sofisticada tendem a ser mais rentáveis em cidades menores, encomendando
os serviços nas grandes cidades. A internet contribui para as cidades se
especializarem em seus talentos.
Precisamos questionar os candidatos às
prefeituras sobre as políticas de uso e ocupação do solo e sobre a provisão de
infraestrutura para o deslocamento rápido e barato, além de como explorar as
potencialidades das cidades, preservando a liberdade para empreender e migrar.
É necessário entender as necessidades locais
e a reação dos mercados às intervenções estatais. Economistas urbanos e
urbanistas precisam interagir mais.
Excelente análise! Parabéns à autora, e ao blog que divulga seu trabalho!
ResponderExcluirVerdade,excelente mesmo.
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