Analisaremos ainda a utilização estratégica desse fenômeno por movimentos globais como método de cooptação das massas, para utilização política. Neste contexto, torna-se essencial investigar não apenas as causas individuais, mas também o papel e influência dessa “ignorância orgulhosa”, dentro de estruturas sociais mais amplas, visando assim desenvolver estratégias eficazes para mitigar seus efeitos profundamente prejudiciais em nossa sociedade.
Os limites intrínsecos da cognição humana, delineados pela teoria da atenção limitada do economista Herbert Simon, destacam que, diante do volume crescente de informações, nossas mentes enfrentam uma escassez inevitável de atenção, este desafio não só dificulta a absorção completa do conhecimento, mas também propicia lacunas e distorções na compreensão, essas lacunas por vezes serão preenchidas de forma superficial com dados e impressões pré-existentes no observador, sejam essas informações pertinentes ou não, por vezes a simples aparência de encaixe já basta para tornar esse pensamento como parte da equação, num exemplo rasteiro em uma fenomenologia rasteira de “pareidolia” intelectual.
A influência desses vieses cognitivos tornam-se evidentes na forma como interpretamos as informações apreendidas, a tendência à confirmação, onde indivíduos buscam validar suas próprias opiniões já preexistentes, contribui para a perpetuação de ideias limitadas e simplórias, que segue seu fluxo com a socialização entre pessoas com mesmas premissas e interesses, transformando-se em um veículo de transmissão de crenças equivocadas, criando um ambiente propenso à ignorância, validação e repasse de conhecimentos precários ou totalmente equivocados no aspecto básico de realidade, teoria cientifica ou até o mais básico senso comum.
A expansão contínua da complexidade do conhecimento é um desafio contemporâneo, na era da especialização, a profundidade em um campo muitas vezes implica na superficialidade em outros, a ignorância não surge apenas da falta de acesso, mas também da dificuldade em assimilar informações em meio a uma variedade de tópicos complexos e cada vez mais específicos, especializados e detalhados.
A expansão contínua da complexidade do conhecimento representa um desafio significativo na contemporaneidade, na era da especialização, onde o conhecimento é fragmentado em campos cada vez mais estreitos e específicos, a busca por profundidade em uma área muitas vezes acarreta em uma superficialidade em outras. Esse fenômeno não apenas aumenta a probabilidade de lacunas de conhecimento, mas também contribui para a emergência da ignorância, esta não é simplesmente resultado da falta de acesso à informação, mas também da dificuldade em assimilar um volume crescente de dados em meio a uma miríade de tópicos complexos, cada vez mais especializados e detalhados.
A sobrecarga de informações e a dispersão dos campos de estudo tornam desafiador para os indivíduos manterem-se atualizados e compreenderem plenamente as nuances de cada informação, a complexidade crescente do conhecimento acaba por contribuir para a perpetuação da ignorância em meio à crescente abundância de informações, um fenômeno que é profundamente paradoxal, o aumento do volume de informações e sua maior acessibilidade acabam por alimentar o próprio fenômeno da desinformação.
O componente emocional, incluindo o medo do desconhecido, muitas vezes obstaculiza a busca por um conhecimento mais elaborado e profundo, a psicologia do chamado “conforto da ignorância” é palpável, pois as pessoas optam frequentemente por permanecer mergulhadas nesse caldo, evitando assim enfrentar a complexidade e perplexidade do mundo real. Outro ponto fundamental que não podemos menosprezar é o componente da vaidade humana, esse associado a compreensão limitada dos fatos gera como vemos atualmente verdadeiras hordas de idiotas orgulhosos de suas idiotices, como descrito pelo dramaturgo T.S. Eliot, esse fenômeno adiciona uma camada a mais de resistência por parte destas pessoas à busca pelo conhecimento real dos fatos, ou melhor, as, distância totalmente desse caminho.
Na sociedade contemporânea, a crescente confiança dos ignorantes se destaca como um fenômeno intrigante e desafiador, principalmente quando adentramos a era da informação, ocorre que, como vimos por mais paradoxal que pareça, esse período histórico fornece um terreno propício para a disseminação de informações descontextualizadas ou mesmo mentirosas, o excesso de informações frequentemente resulta em uma compreensão superficial das situações, gerando uma oportunidade de criação de narrativas ao gosto do freguês, e esse consumidor opta pelo sabor da informação mais agradável ao seu paladar.
Entretanto, a trama da inverossimilhança tem seu início na réplica da informação recebida, agregando por vezes novos pontos, por fim, extrapola para uma pós-verdade onde as informações são inventadas seja por interesses inconfessáveis, da qual falaremos adiante, seja pelo fato do replicador acreditar de fato que é portador de um conhecimento secreto e real, mas que o grande público incauto ainda não se apercebeu dessa informação preciosa que só este conhece, cabendo a ele assim como uma espécie de iluminado, passá-la adiante, pelo bem do conjunto da sociedade.
O efeito Dunning-Kruger, é um viés cognitivo, descrito pelos pesquisadores David Dunning e Justin Kruger que influencia o comportamento das pessoas, fazendo com que elas acreditem saber mais do que realmente sabem ou que são mais competentes do que realmente são, ressalta a ironia de uma ignorância excessiva alimentando uma autoconfiança elevada e totalmente descabida. A vaidade associada à compreensão limitada dos fatos é uma manifestação sutil, mas significativa, da ignorância, aqueles que se apegam a noções superficiais muitas vezes percebem a profundidade do entendimento como desnecessária, essa vaidade emerge quando a incapacidade de reconhecer a própria ignorância é substituída por uma falsa sensação de sabedoria.
É fundamental para evitar o efeito Dunning-Kruger, não parar de buscar conhecimento tendo como norte o apoio na teoria cientifica, quando você começa a estudar um assunto complexo, seu primeiro reflexo será achar que já sabe muito sobre aquilo, resistir a essa sensação é o primeiro passo, perseverar na aprendizagem, observar o contraditório e ao final buscar os consensos acadêmicos, tudo isso é fundamental para o desenvolvimento do conhecimento real.
Outros efeitos que emergem dessa intricada trama da inverossimilhança, envolvem uma gama de consequências que são deliberadamente ocultadas ou negadas pelos indivíduos ou grupos que promovem essa distorção da realidade, desde a manipulação das percepções públicas até a influência direta nas opiniões populares, esses efeitos visam principalmente atender a interesses específicos, muitas vezes à custa da verdade e do bem comum.
Por trás dessa fachada de informação distorcida, escondem-se agendas ocultas que buscam manter ou aumentar o poder, a influência ou os lucros de certos setores da sociedade, esse processo pode minar a integridade das instituições democráticas e corroer a confiança nas fontes de informação, levando à polarização social e ao enfraquecimento do tecido democrático, ao mesmo tempo, a propagação deliberada de desinformação pode alimentar o surgimento de um ideário promova propositalmente o sentimento de ódio dentro da sociedade.
Esses efeitos inconfessáveis se estendem para além do âmbito político e social, afetando também a esfera econômica, religiosa e cultural, eles corroem a coesão social, minam a capacidade de alcançar um consenso sobre questões fundamentais e alimentam um clima de desconfiança e hostilidade mútua, assim, não apenas distorce a realidade, mas também tem o potencial de prejudicar profundamente o tecido da sociedade, comprometendo seus valores fundamentais e minando suas bases democráticas.
A ascensão das chamadas fake news e sua prima-irmã, as teorias conspiratórias, adiciona uma dimensão complexa à discussão sobre a ignorância orgulhosa, a disseminação deliberada de informações falsas explora vulnerabilidades cognitivas e emocionais, contribuindo para uma compreensão distorcida da realidade, além disso, movimentos de extrema-direita têm habilmente utilizado esse fenomenologia humana, como ferramenta tática para ação política, manipulando informações para promover agendas específicas e galvanizar a tomada de espaços de poder, e vem replicando esse método em vários países, e em muitos destes obtendo vitórias eleitorais.
Infelizmente, muitos hoje vivenciam uma realidade paralela, onde fatos, comprovações científicas e respostas institucionais são substituídos por qualquer bobagem ignóbil nascida dentro dessa bolha habitada pelos orgulhosos ignorantes e seus próceres. A disseminação deliberada de informações falsas, e feita para explorar deliberadamente nossas vulnerabilidades cognitivas e emocionais, contribuindo para uma compreensão distorcida da realidade, tendo como maior beneficiário o espectro político da extrema-direita, que habilmente instrumentaliza essa pessoas, manipulando informações para promover suas agendas e consolidar sua ascensão ao poder, galvanizando o apoio de uma base alimentada por falsidades e teorias desconexas, que quando desmistificadas, são rapidamente substituídas por outra teoria tão inverossímil quando a inicial, reiniciando assim todo circuito de desinformação.
Em sua obra "O Povo Brasileiro", Darcy Ribeiro, destaca a importância de entender as raízes históricas e sociais da formação da nossa identidade, ele ressalta que a ignorância muitas vezes é resultado de processos de exclusão e marginalização, evidenciando a necessidade de políticas educacionais inclusivas e transformadoras, já nosso maior educador, Paulo Freire, em sua pedagogia da libertação, argumenta que a educação deve ser um processo dialógico e crítico, capaz de capacitar as pessoas a compreenderem sua realidade e transformá-la, ele enfatiza a importância de uma educação libertadora que promova a conscientização e a capacidade de análise crítica, permitindo que os indivíduos verdadeiramente compreendam as informações e construam conhecimento de qualidade.
Muitos pensadores convergem na ideia de que enfrentar a ignorância requer uma abordagem multifacetada, que inclui políticas educacionais inclusivas, pedagogias transformadoras e uma cultura de humildade intelectual, promover uma educação que estimule o pensamento crítico, a curiosidade e a busca pelo conhecimento é essencial para combater a disseminação de informações falsas e manipulativas.
Essa trilha da idiotia orgulhosa se desdobra em várias direções, sendo crucial reconhecer não apenas as raízes desse fenômeno da ignorância, mas também os instrumentos pelos quais ela é disseminada e instrumentalizada, especialmente quando esta é utilizada como arma por movimentos que buscam moldar a narrativa de acordo com interesses próprios, torna-se imperativo abraçar o não saber como meio corajoso para aprender mais, buscando uma educação transformadora, como complemento fundamental da formação cidadã, por fim manter a mente sempre aberta, mas não tão aberta ao ponto do próprio cérebro cair da cabeça.
*Advogado, ex-secretário executivo de Direitos Humanos de Pernambuco
Na teoria tudo é possível.
ResponderExcluirMaria filha...
ResponderExcluir