sábado, 4 de maio de 2024

Dora Kramer - Às favas com a Carta

Folha de S. Paulo

Os Poderes se atritam no Brasil, e os poderosos confraternizam sob sigilo no exterior

Vejam como são as coisas: os Poderes da República se atritam no Brasil de modo transparente enquanto os poderosos confraternizam no exterior em ambiente de obscuridade nada republicana.

Isso sob a égide do sigilo quanto a quem paga, por que paga e a quais propósitos atendem os patrocinadores de convescotes no circuito Londres-Paris-Nova York-Madri-Lisboa.

Alega-se, para tal, a necessidade de estreitar relações entre os setores público e privado, mas não se faz isso por aqui mesmo ou em cenários menos propícios ao deleite dos participantes.

Uma vez um dos participantes perguntou sobre isso ao ex-governador João Doria, um dos idealizadores desse tipo de encontro, e ouviu o seguinte: reuniões no Brasil ou muito perto daqui não teriam o mesmo poder de atração. Ou seja, o pessoal quer aproveitar a viagem na toada da curtição da festa, muito mais que na discussão dos temas propostos.

Sob o ponto de vista recreativo, com alguns senões seria até possível concordar não fosse o fato de que estamos falando da atitude de autoridades.

Personalidades essas submetidas aos preceitos da Constituição, cujo artigo 37 diz entre outros preceitos que a publicidade, a impessoalidade e a moralidade devem reger condutas de todos os agentes, diretos e indiretos, da administração pública. Note-se: "em qualquer dos Poderes".

Dos eventos realizados sob o segredo a respeito de quem os paga, impedindo que sejam detectados possíveis conflitos de interesses entre as partes, participam integrantes dos três Poderes. Isso suscita cobrança a todos eles, mas no caso do Judiciário a falta de cerimônia choca muito mais.

Alcança colegiado cuja prerrogativa é a palavra definitiva sobre contenciosos da República. Os magistrados do STF julgam os outros à luz da Constituição. Portanto, seu cumprimento exige que estejam em atos e palavras submetidos à Lei Maior que, por ora, vários deles mandam às favas.

 

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