Valor Econômico
Ideia surgiu em 2003, em Santa Catarina, e já passou por Palocci, Mantega e Levy
Depois de dedicar toda sua carreira política
pela aprovação da reforma tributária, o deputado Luiz Carlos Hauly (PODE-PR)
estava fora do Congresso Nacional na atual legislatura. Numa reviravolta do
destino, ganhou uma cadeira na Câmara dos Deputados em junho de 2023, quando o
procurador Deltan Dallagnol perdeu seu mandato. Assim, pôde participar das
votações históricas que mudaram o sistema tributário brasileiro.
As contribuições de Hauly, do já falecido
deputado federal Mussa Demes (1939-2008) e do engenheiro Miguel Abuhab no
debate da reforma tributária foram reconhecidas pelo secretário extraordinário
da Reforma Tributária, Bernard Appy, em audiência na Câmara dos Deputados no
início deste mês.
Abuhab é o “pai” do “split payment”, a base tecnológica em que se ancora toda a reforma dos tributos sobre o consumo que o Brasil adotará. É o sistema que vai recolher os tributos automaticamente, além de transformar o complicado sistema de créditos e débitos tributários em algo parecido com uma conta corrente.
“É super tech!”, entusiasma-se Hauly. O novo
modelo “rompe com o velho modelo de crédito escritural”. E permite a cobrança
eletrônica que, na visão do deputado, “é o coração do IVA”.
Hauly é um antigo defensor do “sistema
Abuhab”, que agora será implementado com o nome de “split payment”. A
ferramenta estava presente na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 293, de
2004, e na PEC 110, de 2019, ambas relatadas por Hauly.
A PEC 293 foi aprovada em comissão especial
em dezembro de 2018. Porém, o impulso da reforma se perdeu com o fim daquela
legislatura. A PEC 110 foi fundida na PEC 45, aprovada no ano passado.
Além do “split”, ambas as propostas de Hauly
contemplavam o “cashback”, também adotado na atual reforma.
O “sistema Abuhab” tem mais de 20 anos. À
coluna Abuhab contou que a ideia surgiu em 2003, quando ele cuidava da
escrituração fiscal de cerca de 4.000 empresas em Santa Catarina. O então
governador do Estado, Luiz Henrique da Silveira (1940-2015), lhe pediu uma
solução tecnológica para simplificar o Imposto sobre a Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS).
“Se conseguirmos separar, no boleto, o valor
da mercadoria e o valor do imposto, o valor da mercadoria vai para o fornecedor
e o valor do imposto vai direto para o governo”, conta. O sistema está descrito
no livro “Devo, não nego, pago quando receber” (Livros de Safra, 2017), de
autoria de Abuhab.
Empolgado com a ideia, Luiz Henrique levou
Abuhab para conversar com o então ministro da Fazenda, Antonio Palocci. A ideia
também foi apresentada ao sucessor de Palocci, Guido Mantega. “Foram coisas
muito dispersas e não deu certo”, relata.
A ideia foi apresentada também ao sucessor de
Mantega, Joaquim Levy. Esse encantou-se, mas não teve tempo de implementá-la.
Já fora do ministério, Levy ocupou o cargo de
diretor financeiro do Banco Mundial. Levou Abuhab para expor sua ideia em
Washington. “Ele me falou pela primeira vez em 2015 e vi que era o caminho”,
conta o ex-ministro.
Naquela mesma época, Abuhab foi levado por
amigos para apresentar sua ideia no Centro de Cidadania Fiscal (CCif), criada
por Appy para formular a reforma tributária.
Como mostrou este jornal, o sistema será
pioneiro no mundo. Exigirá investimentos em adaptação nos bancos e nas
operadoras de meios de pagamentos. Governo e setor privado discutirão os
detalhes.
O próprio Abuhab está, pelo menos até agora,
fora dos trabalhos de implementação do sistema. Isso, admite, o deixa “um pouco
magoado”.
Nos bastidores da Fazenda, o que se ouve é
que os trabalhos de detalhamento da reforma estiveram a cargo do setor público:
União, Estados e municípios. No entanto, outros participantes serão chamados.
A ideia de unir os meios de pagamento e o
sistema eletrônico de cobrança de tributos, duas coisas que o Brasil faz bem,
já poderia estar em operação, diz Abuhab. Não seria difícil, do ponto de vista
tecnológico, colocar uma informação nos boletos para transferir de forma
automática para os cofres públicos os impostos embutidos no valor pago.
É preciso que o “split payment” dê certo,
pois toda a modernização e simplificação da reforma tributária depende dele. Os
mais otimistas do governo veem nesse sistema uma inovação que poderá ser
exportada e tornar-se uma referência global, como ocorreu com o Pix. Tomara que
estejam certos.
Simulador
O Banco Mundial tornou público um simulador
de alíquota da reforma tributária, o SimVAT. Mostra quanto a “bondade” de um
lado resulta em “maldade” do outro.
Por exemplo: zerar a alíquota e acabar com o
cashback, como quer parte dos parlamentares, elevaria a alíquota geral para
28,3%, se a ideia for não ter perdas na arrecadação. Atualmente, a alíquota
está estimada em 26,5%.
A ferramenta permite calcular diferentes
combinações. É uma aposta do governo para embasar tecnicamente os debates no
Congresso. Pode ser acessada em datanalytics.worldbank.org/simvat/
Muito interessante! Eu nada sabia sobre o engenheiro catarinense que teve a ideia e iniciativa.
ResponderExcluirLendo e aprendendo.
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