Folha de S. Paulo
Se os templários da Lava Jato desmoralizaram
o combate à corrupção, definitivamente não a inventaram
O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal
Federal (STF), cravou mais um prego no caixão da Operação Lava Jato, ao anular
todos os atos da turma de Curitiba contra Marcelo Odebrecht.
Em fevereiro último, Toffoli suspendera os
pagamentos de multas que somavam bilhões de reais, estabelecidas pelo acordo de
leniência firmado entre o Ministério Público e a empreiteira fundada pelo avô
de Marcelo, Norberto Odebrecht.
Cinco meses antes, o mesmo Toffoli anulara as provas entregues pela Odebrecht (hoje rebatizada como Novonor). As evidências expunham a corrupção em 49 contratos firmados com órgãos públicos nacionais e em uma dúzia de países estrangeiros, nos quais a construtora reconheceu ter desembolsado US$ 788 milhões em propina.
Sempre haverá juristas a justificar os atos
do ministro à luz dos tropeços legais do juiz Sérgio Moro e dos promotores
liderados por Deltan Dallagnol. De fato, além de ineptos, serviram aos
políticos e líderes civis decididos a abreviar a estada do PT no poder pelo
impeachment de Dilma Rousseff – abrindo caminho para a extrema-direita na
política. Deu em Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto, em Moro e Dallagnol no
Congresso.
Em resumo, se os templários da Lava Jato
desmoralizaram o combate à corrupção, definitivamente não a inventaram. Da
mesma forma, a intimidade nefasta – e igualmente lucrativa – entre empresas,
partidos e agentes públicos antecede a era do PT, o qual, no governo, se
adaptou alegremente ao arranjo.
De certa maneira, o recurso à corrupção é
sempre instrumento ao alcance de todos quantos pretendam manipular as
engrenagens da disputa pelo poder. Mas, nas democracias, se nem sempre é
possível prevenir a roubalheira, há que combatê-la com realismo, leis
bem-feitas e bem aplicadas. A inevitável exposição das falcatruas, graças à
liberdade de informação e à vigilância interessada das oposições ao governo,
ajuda a minar a confiança nos mandatários e nas regras que sustentam os
sistemas representativos.
Em países onde renitentes desigualdades cavam
abismos entre elites e povo, governantes e governados, a corrupção política,
trazida à luz do dia – o mais eficaz detergente, como já se disse – alimenta
paradoxalmente a descrença generalizada nos "de cima", cevando a
convicção de que são todos iguais e os seus crimes jamais serão punidos.
As decisões do ministro Toffoli, para alívio
do Centrão e sob o velado aplauso de setores da esquerda democrática, só podem
alimentar o discurso antissistema dos populismos de todos os feitios que, de
tanto em tanto, desfiguram o jogo político brasileiro.
Pode ser.
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