O Globo
Se não houver uma agenda de futuro, todo o
país pagará um preço alto. A longa agonia dos gaúchos deveria nos ajudar a ver
o essencial
A Petrobras está no centro do debate, de novo. E, como das outras vezes, não se discute o essencial. Qual o futuro de uma petrolífera num mundo em que a mudança climática já está cobrando uma conta alta do país em vidas humanas e em devastação material e econômica? Esse é o essencial, mas não é uma questão que tenha provocado a troca de Jean Paul Prates por Magda Chambriard. A mudança na estatal tem a ver apenas com o grau de simpatia ou antipatia que cada pessoa desperta no Palácio do Planalto. Ambos têm a mesma agenda e a mesma aceitação de interferências políticas na gestão.
O Brasil se mobiliza pelo Rio Grande do Sul,
mas a tragédia não provoca uma mudança de rumo coerente com a dimensão do que
está diante dos nossos olhos. Houve uma discussão emblemática no Senado essa
semana, quando se debatia o projeto para a criação de um Plano Nacional de
Adaptação às Mudanças Climáticas, de autoria da deputada Tabata Amaral. O
senador Flávio Bolsonaro conseguiu adiar por um dia a votação do projeto. Ele
disse que havia poder demais na mão dos órgãos ambientais, e falou coisas
assim: “Eu pergunto: o que está acontecendo no Rio Grande do Sul tem relação
com emissão de carbono ou tem relação com o zoneamento urbano em todas as
cidades impactadas? Com queima de petróleo ou com questões geográficas?” É a
oposição sendo negacionista, a mesma que tentou impedir a adoção das medidas
sanitárias na pandemia que matou mais de 700 mil brasileiros.
O governo, contudo, diz estar aberto aos
avisos da ciência. Da Petrobras, quer mais petróleo mesmo que isso signifique
explorar nas costas da Amazônia, com todos os riscos envolvidos para o bioma
brasileiro que é o mais importante na definição dos rumos da mudança do clima.
A ideia de abrir essa nova fronteira da exploração de petróleo era defendida
por Jean Paul Prates e será defendida por Magda Chambriard. Nenhum dos dois
representa um projeto de levar a Petrobras a ser uma empresa de energia,
agregando fontes sustentáveis.
O plano da presidência da empresa continuará
o mesmo. Recomprar uma refinaria na Bahia, concluir a refinaria Abreu e Lima,
com seu histórico de sobrepreço e corrupção, ter uma política que agrade o
presidente da República, usar a petrolífera para induzir crescimento em outros
setores da economia como a indústria naval. Cada um desses pontos é bem
discutível. Não faz sentido gastar o dinheiro da estatal para reestatizar uma
refinaria, a Petrobras já tem outras sob seu controle. A refinaria Abreu e Lima
só poderia ser retomada após medidas para aumentar a transparência. O governo
está convencido de que em refino é preciso ter escala para ser eficiente, e por
isso vê a unidade de Pernambuco como o ideal. O programa de a Petrobras cumprir
planos de desenvolvimento do governo na área naval, por exemplo, já deu errado
no passado. A política de preços que Jean Paul Prates diz que entregou foi a
que o presidente Lula pediu.
Não há, em todos esses pontos, uma diferença
entre os dois gestores, o demitido e a admitida. Não há também qualquer debate
com visão estratégica sobre o futuro de uma produtora do combustível de alta
emissão de gases de efeito estufa no tempo em que se discute transição
energética, meta de redução de emissões e segurança climática. Não existe um
planejamento sólido, coerente, e prioritário para preparar o país para
enfrentar os efeitos da mudança climática nem quando, diante de nossos olhos,
há um estado náufrago, lutando para emergir de águas que teimosamente não
baixam.
A tragédia do Rio Grande do Sul e o futuro da Petrobras deveriam estar sendo vistos de forma integrada pelo governo. A proteção aos biomas, inclusive o pampa, teria que estar no radar do Congresso. Mas não está, pelo contrário. O pacote antiambiental deu apenas uma parada para ver se a boiada consegue passar sem que a vejam. Muita gente luta dentro do governo para que o país perceba o que o planeta exige de todos nós nesse tempo perigosamente mutante, mas quem defende o meio ambiente é visto como se estivesse perseguindo uma agenda pessoal. Cada aprovação de medida que facilita o aumento do desmatamento é apresentada como uma “derrota da Marina”. A derrota é de todos nós. Se não houver uma agenda de futuro, todo o país pagará um preço alto. A longa agonia dos gaúchos deveria nos ajudar a ver o essencial.
Muito bom!
ResponderExcluirTem até o projeto de um deputado querendo desmatar as encostas,segundo ele pra evitar o desmoronamento,sendo que as raízes das árvores é que ajudam fixar a terra.
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