Folha de S. Paulo
Para pesquisadores, modelo brasileiro se
impôs ao autoritarismo de Bolsonaro
O modelo brasileiro de democracia se impôs ao
autoritarismo de Jair Bolsonaro. Essa a conclusão do livro "Por que a Democracia Brasileira Não Morreu?", dos
cientistas políticos Marcus André Melo (UFPe) e Carlos Pereira (FGV-RJ).
Do muito que se tem escrito sobre a
turbulência política que engolfou o Brasil desde 2013, a obra é sem dúvida a
mais ambiciosa e desafiadora. Na contramão do senso comum, sustenta que nossas
instituições políticas são fortes —e o demonstra tratando não só dos quatro
anos do governo Bolsonaro, mas de todo o agitado período que o antecedeu,
incluindo o impeachment de Dilma Rousseff e o curto mandato de Michel Temer.
O argumento central do livro é que o peculiar arranjo institucional do país freou o impulso autoritário cevado no Palácio do Planalto. Esse arranjo, que os cientistas políticos chamamos "consociativo", constitui um mecanismo eficaz para impedir a concentração de poderes em um único centro de decisões.
De um lado, Federação, pluripartidarismo (e,
em consequência, governos de coalizão); separação de Poderes; Judiciário forte
e autônomo; Banco Central independente. Some-se a isso uma imprensa autônoma e
uma vigorosa sociedade civil. O resultado é um breve contra as chances de êxito
de um candidato a déspota.
De fato, as democracias chamadas
"consociativas" incentivam a moderação ao favorecer soluções
negociadas entre Executivo e Legislativo; entre oposição e situação no
Congresso; e entre partidos da base do governo. Possuem assim instrumentos poderosos
e eficazes de autopreservação.
Mas, como nem tudo é perfeito, aquilo que as
faz resistentes a incursões autoritárias também as torna morosas para produzir
resultados ansiados pelos eleitores. Nenhum líder —ou partido— consegue fazer
prevalecer suas propostas.
A existência de governos de coalizão,
expressando a diversidade das legendas que os compõem e sua força relativa no
Legislativo, dificulta eventuais tentativas de atribuir responsabilidades por
erros ou malfeitos. Tudo precisa ser negociado no Congresso —nem sempre de
forma republicana— e pode ser submetido ao controle de constitucionalidade pela
Suprema Corte.
Tais arranjos exigem dos governantes clareza
dos limites de seu poder, bem como doses às vezes incomuns de paciência e
habilidade para montar suas equipes e obter apoio parlamentar.
Por isso, embora seja firme a sua democracia,
o país patina há anos para cortar privilégios; reduzir desigualdades;
equilibrar o Orçamento; ou, enfim, achar a rota do crescimento sustentável.
Como se vê, os tropeços do governo Lula também têm raiz institucional.
Muitto bom!
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