Folha de S. Paulo
Presidente eleita terá de escolher se manterá
a trilha populista de AMLO
Atributos próprios, máquina governamental e o
apoio de um presidente com altíssima aprovação deram a Claudia Sheinbaum uma
vitória sísmica na disputa pela Presidência do México,
no domingo (2).
Com a legitimidade de quem recebeu mais votos
que todos os adversários juntos e a folgada maioria obtida por seu partido, o
Movimento de Regeneração Nacional (Morena), nas duas Casas do Congresso, ela
terá de decidir o que fazer com a herança que lhe terá deixado seu padrinho,
Andrés Manuel López Obrador, ou AMLO,
como o mundo se habituou a chamá-lo.
Eleito com a promessa de regenerar a política mexicana, combatendo a corrupção e a violência do crime organizado —e as elites suas beneficiárias—, durante os seis anos de estada no Palácio Nacional ele seguiu com indiscutível competência o roteiro dos populistas de esquerda em toda parte.
Ao mesmo tempo, fez o que sabia para
concentrar poder no Executivo. Deu aos militares posições importantes na
segurança e na administração de grandes obras públicas e fez o que podia para
domesticar as instituições de controle vitais para a democracia. Assim,
despejou fogo cerrado sobre o Judiciário e o Instituto Nacional Eleitoral, que
monitora as eleições para garantir sua lisura. Atacou a imprensa e os
jornalistas, os quais acusou de receberem dinheiro sujo.
No campo dos valores, adotou com gosto a
retórica reacionária: chamou os intelectuais de "alcaguetes"; as
feministas de "braço da direita"; os ambientalistas de "fingidos
e chantagistas"; a Universidade Autônoma do México de
"neoliberal".
A lei que proíbe a reeleição o impediu de
consumar sua obra.
Mesmo assim, em final de mandato, propôs
emendar 51 dos 136 artigos da Constituição. Se a jogada passar pelo novo
Congresso, serão atingidos em cheio os mecanismos de freios e contrapesos
próprios das democracias. E o país poderá retroceder ao sistema autoritário de
partido hegemônico, ou coisa que o valha, que durou 70 anos (de 1920 a 1990).
Vinda da esquerda, Claudia Sheinbaum terá de
escolher se continuará na trilha populista de seu padrinho.
Até lá, a esquerda para a qual democracia e reforma social são siamesas não
poderá comemorar a vitória da primeira mulher a chegar à Presidência de um país
que se distingue pelo machismo.
Coitada!
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