O Globo
Não há nada a apontar de positivo na ação do
governo no Congresso e em sua comunicação com a sociedade
Depois de um primeiro ano de vitórias, que
começou ainda antes da posse com a PEC da Transição, o governo Lula carimbou o
semestre perdido no Congresso com a lambança da edição da Medida Provisória
natimorta que pretendia limitar o uso de créditos tributários de PIS e Cofins
para pagar outros impostos. E da pior forma possível: dobrando a aposta no rol
de erros que cometeu noutra MP, a 1.202, aquela editada na virada do ano que
simboliza o início das agruras de Lula no Congresso.
Nos dois casos, está um expediente equivocado de Fernando Haddad: apostar em medidas unilaterais, não explicadas nem negociadas, para tentar sanar problemas de arrecadação.
As derrotas seguidas, em todas as muitas
frentes em que a MP 1.202 pretendeu passar por cima de decisões anteriores do
Congresso, deveriam ter ensinado algumas lições a um ministro que vinha
ganhando todas até então, driblando resistências em setores hostis e levando a
melhor nas disputas internas com o titular da Casa Civil, Rui Costa.
Mas não: ao buscar a compensação para a
fragorosa e lenta derrota na novela da desoneração da folha de pagamentos,
Haddad incorreu na mesma receita desastrosa, desta vez com uma medida que
atingiu em cheio vários setores da economia bastante vocais, como o
agronegócio, imediatamente bombardeada pela oposição.
O resultado de apostar de novo na
autossuficiência justamente num momento em que sucessivas derrotas demonstram a
tibieza da articulação política de Lula no Parlamento foi o carimbo de
“devolvida” que Rodrigo Pacheco pespegou na MP, não sem antes avisar a Lula e
aos ministros que o faria, e imediatamente.
Haddad demonstrou ao longo de 2023 o tino
necessário para entender que navegava em mares duplamente bravios: um mercado
que não o via como capacitado a gerir sobretudo o ajuste fiscal e uma ala
política de seu próprio lado, disposta a gastar como se não houvesse amanhã.
Articulou politicamente seus projetos, prevaleceu sobre o PT gastador.
Mas aí parece ter relaxado e deixado aflorar
uma das características mais apontadas pelos aliados e adversários em seu
período de prefeito: certa arrogância de quem prefere ter razão a vencer.
Assim, ele insistiu até o último minuto em argumentar a favor da “MP do
apocalipse”, como a medida devolvida foi apelidada.
Como nos casos do Perse, o programa do setor
de eventos, e de outros benefícios em que resolveu mexer, argumentou que as
compensações de PIS/Cofins estavam eivadas de fraudes. Mas fez isso a
posteriori, sem convencer os setores econômicos nem o Parlamento.
Diferentemente dos embates anteriores, em que
sempre saiu respaldado por Lula, neste episódio o ministro levou uma anotação
na caderneta. O presidente não gostou de ficar exposto bem na hora em que vinha
se dispondo a entrar mais diretamente na articulação política.
A MP devolvida caiu no colo do presidente, e
esse desgaste enorme no pior momento de Lula desde a posse serviu para agravar
a crise entre os titulares da Fazenda e da Casa Civil, a quem auxiliares de
Haddad culpam pela alta temperatura que a fritura atingiu no caso.
Há semanas venho escrevendo sobre a falta de
iniciativa política do governo. Mas a cada crise autoimposta fica a imagem de
que Lula está num mar revolto e é atingido por uma nova onda antes mesmo de se
recuperar de um caldo.
A MP devolvida e o vexaminoso leilão para a
compra de arroz, anulado após suspeitas de irregularidades e evidências claras
de amadorismo, pelo menos, coroam um semestre desastroso, em que não há nada a
apontar de positivo na ação do governo no Congresso e em sua comunicação com a
sociedade.
Por ora, a economia vai se mantendo, mas a
preocupação com tanta inépcia e a tragédia no Rio Grande do Sul são nuvens que
ameaçam também o segundo semestre, se não houver uma tomada de rédeas por parte
do presidente que vá muito além de tomar café com deputado e jogar conversa
fora.
" ...se não houver uma tomada de rédeas por parte do presidente que vá muito além de tomar café com deputado e jogar conversa fora. "
ResponderExcluirObviamente, não é fácil ou para qualquer um ser presidente de um país complexo como o Brasil, mas nada que uma cervejinha não resolva, não é mesmo?
😏😏😏
Sei.
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