Folha de S. Paulo
Tubérculo, leite, luz e plano de saúde
pesaram mais no IPCA; mau humor geral afeta preços e juros
O preço do arroz aumentou em maio. Mas a
comida que pesou mesmo na inflação do
mês foi a batata, que deu a maior contribuição para a alta
do IPCA entre todos os 387 tipos de produtos acompanhados pelo
IBGE ("subitens").
Batata (alta de 20,61%) e arroz (de 1,47%)
ficaram mais caros especialmente por causa da catástrofe no Rio Grande do Sul,
como era esperado.
Além dos efeitos do desastre, a inflação média
veio um tico pior por outros motivos. Nada nem de longe perto de dramático. Mas
o ambiente de mau humor na economia pesa; a inflação de serviços resiste.
Desde abril, o dólar esteve quase sempre acima de R$ 5,10; anda agora na casa dos R$ 5,30. É risco de alta para produtos com cotação internacional, como petróleo, mas também alimentos.
Sim, o desastre que os gaúchos enfrentam
pesou em maio. Também deve afetar a inflação em junho e, pois, a conta do ano.
Há especulação até sobre como a destruição de solos, equipamentos e instalações
pode afetar a produção gaúcha de alimentos para o ano que vem.
Antes das enchentes, fins de abril, a
expectativa de inflação para maio era de 0,25%, segundo a mediana das projeções
de economistas compiladas pelo Banco Central.
A estimativa mais recente era de 0,4%. Enfim, o IPCA acabou por aumentar 0,46%
no mês. O grosso disso veio do desastre no Rio Grande do Sul.
Quanto à inflação, são pequenas pioras.
Poderiam ser relevadas se as perspectivas em geral para taxas de juros nos
Estados Unidos, controle de gastos do governo no Brasil e dólar não tivessem
piorado.
Em um ano, no acumulado em 12 meses até maio,
o IPCA passou de 3,69% para 3,93%. Pela mediana das projeções compiladas pelo
BC e dado o IPCA verificado até maio, a inflação fecharia este 2024 em 3,98%. A
meta é de 3%. As projeções para 2025 crescem.
Assim, é quase certo que ficaremos com uma
Selic pavorosamente alta, em 10,5% ao ano, até bem entrado o ano de 2025. As
taxas de juros de longo prazo, que não são definidas pelo Banco Central, têm
aumentado, em particular desde fevereiro. Tudo isso terá algum efeito negativo
no crescimento de 2025.
Outras medidas de avanço de preços, também
baseadas nos dados do IPCA, indicam inflação um tico mais persistente. São
medidas de inflação de serviços (mais influenciada pelo custo da mão de obra) e
outras, "núcleos de inflação", que indicam de modo menos impreciso o
que a variação de preços tem a ver com o ritmo da atividade econômica.
E daí?
Essas medidas influenciam
as ideias do Banco Central do que fazer com a Selic e, também,
as estimativas de inflação de quem tem dinheiro para investir e emprestar ao
governo. Várias dessas medidas de núcleos de inflação recuaram, em 12 meses
_melhor. Mas a inflação de serviços aumentou, repita-se _meio ruim.
Em suma, a alta ligeira do IPCA em maio, em parte circunstancial, não teria ou
deveria ter efeito mais duradouro. Mas o clima não está bom.
Praticamente metade da alta do IPCA de maio
veio de batata, leite longa vida, eletricidade, passagem aérea, plano de saúde
e água e esgoto.
A cebola pesou mais na carestia do que o
arroz, que ficou em 17º lugar, com contribuição de 0,01 ponto para o IPCA (a
batata contribuiu com 0,05 ponto da inflação do mês; a cebola, com 0,02).
Surge assim mais uma dúvida a respeito da
necessidade de importar arroz. Não dá para deixar faltar arroz ou tolerar uma
explosão de preços, claro. Em parte, porém, é difícil medir o impacto do
desastre gaúcho na oferta do produto. Por outro lado, se a importação baixar os
preços além da conta, o produtor não vai querer plantar arroz para 2025. Se não
se tomar cuidado, a emenda pode sair pior do que o soneto.
Pode ser.
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