Valor Econômico
Capital federal atrai lobistas de todo o Brasil às vésperas de grandes votações
A primeira vez que o termo “lobbyist”
apareceu no arquivo do “New York Times” foi em 6 de fevereiro de 1857, num
texto de opinião contrário à aprovação do Pacific Railroad Bill, um projeto que
autorizava o governo americano a doar terras públicas e a financiar a
construção das estradas de ferro que cruzariam o país, do Atlântico ao
Pacífico.
A matéria denunciava as intensas negociatas ocorridas no âmbito do Comitê de Terras Públicas, que estava prestes a autorizar a concessão de extensas faixas de terras em Minnesota e Iowa para a instalação dos trilhos e o desenvolvimento urbano nesses territórios ainda inóspitos. O autor designado como “S.” expõe o fenômeno de objetivos privados colocados acima do interesse público. No Brasil, pesquisando no acervo da Biblioteca Nacional e de “Estadão”, “Folha” e “O Globo”, a referência mais antiga que encontrei a “lobista” foi em coluna de Nahum Sirotsky (1925-2015), então correspondente do “Jornal do Brasil” em Nova York, em 8 de dezembro de 1963.
Intitulado “Os mercadores de influência”, o
texto apresentava ao público brasileiro os profissionais especializados que
atuavam junto ao governo e ao Congresso americanos em favor de associações
empresariais e grandes companhias.
Como destacava Sirotsky, “onde há poder há
pressões, tentando orientá-lo para esse ou aquele caminho”. O que distinguia
essa prática nos EUA era que a atividade era regulamentada pelo governo, que
exigia desses profissionais registro em órgão público, transparência a respeito
de quem contratava seus serviços e declaração, para a Receita Federal, das
receitas e despesas incorridas no seu trabalho.
Numa didática descrição, ele explicava que os
lobistas promoviam os interesses de seus clientes por meio da preparação de
documentos e a apresentação de dados para demonstrar, perante as autoridades,
as vantagens da aprovação de seus pleitos.
Além dessa atuação legítima, Sirotsky também
demonstrava que eram comuns técnicas um pouco mais convincentes: “O político
americano é tão sujeito às tentações terrenas quanto qualquer outro. O lobby o
cerca de todas as formas, com festas, apresentando belas jovens, com
contribuições para caixinha de candidato, com presentes”.
Mais de seis décadas depois da coluna de
Nahum Sirotsky descrevendo a atuação dos lobistas americanos, o lobby (ou
relações institucionais e governamentais, como preferem os profissionais da
área atualmente) ainda não é regulamentado no Brasil. Isso não significa,
porém, que não haja trabalho na área.
As últimas semanas foram frenéticas em
Brasília, com muita gente desembarcando na capital a fim de obter alguma
vantagem na reta final de votação, na Câmara, da regulamentação da reforma
tributária.
Foram 805 emendas apresentadas pelos
deputados, defendendo os mais diferentes setores. Ao final, prevaleceram os
lobbies de pecuaristas, frigoríficos, mineradoras, multinacionais de bebidas,
fabricantes de armas, montadoras de veículos e até planos de saúdes de pets.
Na falta de regulação da profissão de
lobista, fica difícil para a sociedade mapear sua atuação nos corredores de
Brasília. Resta a tentativa de rastrear sua atividade por medidas aproximadas.
Tomando como base os microdados de voos divulgados pela Anac e os relatórios de
presença na Câmara, realizei um exercício de comparação entre os desembarques
de passageiros no aeroporto JK e a atividade parlamentar. Brasília hoje é um
importante centro regional, com uma população de alta renda que atrai negócios
que vão muito além do mundo da política. Mas o que se decide na Praça dos Três
Poderes, na Esplanada dos Ministérios e nos seus tribunais continua levando
hordas de interessados ao Planalto Central.
Como se vê no gráfico, em linhas gerais
momentos de baixa atividade parlamentar tendem a diminuir o afluxo de
passageiros. Já em momentos de votações relevantes ou de eventos como a posse
presidencial ou a eleição das Mesas Diretoras, a lotação nas aeronaves dispara.
Em tempos de reforma tributária, o mercado de
influência fica efervescente.
Muito bom! Quando o colunista fala do "fenômeno de objetivos privados colocados acima do interesse público", está resumindo A HISTÓRIA DO BRASIL! De 1500 a 2024.
ResponderExcluirÉ isso aí!
ResponderExcluirSaudade do Nahum Sirotsky, um dos meus mestres do jornalismo e que se tornou também lobista, no melhor sentido do termo.
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