O Globo
Pesquisa mostra o lado conservador do país
O Instituto da Democracia pôs na rua uma
pesquisa que mostrou a superposição de algumas agendas entre os eleitores
de Lula e
os de Jair
Bolsonaro. Com grande felicidade, ela se chama “A cara da democracia no
Brasil”. Para cabeças polarizadas, a cara da democracia brasileira não é boa.
Nenhum radical, seja de qual credo for, gostará dos resultados do trabalho,
compilado pelo pesquisador João Feres Júnior, da Uerj, e mostrado pelo repórter
Bernardo Mello.
Um em cada dois eleitores de Lula é contrário às saidinhas de cidadãos encarcerados, e 57% são contrários à proibição de vendas de armas de fogo. Em 2005, o país levou o assunto a referendo, e a restrição foi derrubada por mais de 60% dos votos, mas virou falta de educação lembrar esse resultado. Legalização do aborto? Sessenta e nove por cento são contra.
No campo de Bolsonaro, esses números são obviamente mais robustos, mas na sintonia fina voltam a surpreender: se 83% dos eleitores do capitão defendem a militarização das escolas públicas, são acompanhados por 61% dos eleitores de Lula. Mais: 55% dos eleitores de Bolsonaro defendem a pena de morte. Parece pouco, porém no campo de Lula essa percentagem é de 42%.
Opiniões desse tipo desse tipo podem chocar
os bem-pensantes, mas o que a pesquisa pretende mostrar é como o povo da
amostra pensa. Aceita-se isso ou segue-se o conselho do professor Antônio
Delfim Netto em 1985, quando Jânio Quadros derrotou Fernando
Henrique Cardoso na disputa pela Prefeitura de São Paulo:
— Vão precisar mudar de povo.
A cepa conservadora do eleitorado brasileiro
está aí. O Brasil tem um eleitorado conservador em relação à segurança pública
e aos costumes.
Os eleitores de Bolsonaro e Lula não são
semelhantes em relação a alguns temas: 23% de um são contra o Bolsa Família,
no outro lado só 9% (14% não opinaram).
De certa maneira, criaram-se dois
estereótipos. O do sujeito que votou em Bolsonaro ficou previsível. O de Lula
deveria levar seus explicadores do Brasil a calçar as sandálias da humildade. A
“cara da democracia” compilada por Feres mostrou que mais de 20% dos eleitores
de Lula são favoráveis à prisão de mulheres que interrompem a gravidez (36%), à
privatização da Petrobras (37%)
e contrários à punição de militares que participaram do 8 de Janeiro (29%).
Depois de dez anos da demonstração das virtudes das cotas raciais nas
universidades, 35% dos eleitores de Lula são contra. Do lado de Bolsonaro, são
52%.
Colocando esse número ao lado do 1,8 ponto
percentual que deu a vitória a Lula, percebe-se o vigor de uma das Leis de
Heitor Ferreira:
— Muitas vezes, não é um candidato que ganha,
só outro que perde.
Bolsonaro perdeu em 2022, como o PT perdeu
em 2018. Num exercício de passadologia, qual teria sido o resultado da eleição
se Bolsonaro não tivesse pronunciado as palavras “vacina” ou
“cloroquina”?
A agenda progressista tem virtudes, até porque a do regressismo amarrou o Brasil à escravidão e ao contrabando de negros. Mesmo assim, não é desse modo que marcham as sociedades. Quem ouvia Martin Luther King em 1963 jamais imaginaria que, em 2024, Donald Trump estivesse de novo com um pé na Casa Branca.
Perfeito!
ResponderExcluirExatamente!
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