O Estado de S. Paulo
Um grande nível de caos existe não apenas no conjunto das leis tributárias, mas, principalmente, na cabeça das pessoas
A reforma tributária está sendo comemorada
como um grande avanço. Os mais prudentes dizem que é uma reforma possível,
longe da ideal.
Para mim, existem aspectos muito brasileiros
em todo esse esforço. O que era destinado a superar a grande confusão
tributária acabou resultando em algo muito confuso, apesar das melhoras. O que
nos leva a suspeitar que um grande nível de caos existe não apenas no conjunto
das leis, mas, principalmente, na cabeça das pessoas.
A primeira constatação aparece na maneira
como querem simultaneamente uma ampla isenção e uma tarifa baixa. É evidente
que, quanto maior o número de produtos excluídos da cobrança, isso vai refletir
nos outros.
A solução mágica foi determinar uma tarifa máxima, de 26,5%. Uma vez determinado esse patamar, era possível incluir entre os isentos, por exemplo, a carne, inclusive os tipos mais caros, consumidos por pessoas de alta renda.
Eles conseguiram resolver a relação entre
duas variáveis fixando apenas uma delas. É como dizer que só posso gastar R$ 5
mil por mês mas vou comer todos os dias em restaurantes e fazer uma viagem à
Europa.
Nas discussões de reforma tributária que
presenciei, foram muitas ao longo desses anos, sempre surgiu a questão
ambiental. Agora, parece que levaram um pouco mais a sério, mas ainda assim
decidiram incluir o carro elétrico no chamado imposto do pecado.
O raciocínio é este: as baterias depois de
usadas são poluentes. Avariam o carro elétrico só depois de sair de circulação,
abstraindo o tempo de uso.
Existe sempre algo de subjetivo na escolha
dos produtos a serem isentados. Pessoalmente, não isentaria o açúcar e faria
uma carga para que fossem taxados com ênfase os alimentos ultraprocessados.
Minha opinião é baseada em conselhos de
médicos e nutricionistas. Mas parece que a questão da saúde pública não foi
avaliada em profundidade.
Quando digo que a reforma tributária foi o
maior avanço dado pelo Congresso, o faço com resignação. Não é possível esperar
grandes saltos no Brasil de hoje.
O próprio governo se empenhou na questão da
carne. Foi uma proposta de campanha de Lula da Silva, logo era preciso
incluí-la na lista dos não taxados. O resultado real no preço da carne virá nos
próximos anos, mas o ganho simbólico é imediato.
Não se pode criticar o governo por querer
agradar seu eleitorado básico nem por tomar precauções para não ser suplantado
nas próximas eleições.
Mas é possível duvidar da eficácia dessas
táticas. Há alguma coisa no Brasil que vale a pena relacionar com a Inglaterra,
apesar das diferenças.
Tive a oportunidade de presenciar o fim de um
ciclo conservador e o início de uma era trabalhista, na eleição de Tony Blair.
No período em que estiveram fora do poder, os trabalhistas se renovaram para
conduzir o seu próprio ciclo.
O mesmo aconteceu agora, com a vitória nas
últimas eleições. O Labour passou para estar pronto na alternância.
Muito possivelmente, no Brasil, a alternância
entre conservadores e social-democratas também acontecerá. A diferença é que as
forças fora do poder não se preparam nem se transformam para um novo ciclo.
Creio hoje, passados quase dois anos de novo
governo, que vivemos esse problema. O período de travessia do deserto da
esquerda não foi utilizado para uma renovação no mínimo de ideias.
O resultado de tudo isso potencialmente pode
encurtar o ciclo. Há varias desvantagens de enfrentar uma nova batalha como se
fosse a antiga. As circunstâncias são outras e as respostas à situação
transformada são muito pobres, fora do lugar.
Por outro lado a incompreensão dos erros
passados é muito perigosa diante de uma opinião pública cada vez mais exigente.
Episódios como a manutenção no cargo de um
ministro das Comunicações indiciado pela Polícia Federal, a volta com todo o
prestígio dos irmãos Batista, aparentemente favorecidos por uma medida
provisória milionária, a demissão de três gerentes da Caixa Econômica que se
colocaram contra uma compra de R$ 500 milhões de letras financeiras do Banco
Master – tudo isso fortalece a visão de que nada mudou quando a esquerda estava
fora do poder.
Por que existir mudanças da esquerda se a
direita, por seu turno, continua mergulhada nos próprios erros?
É exatamente disso que estou falando. Não se
trata de julgar nenhuma das duas forças, mas apenas constatar como são fiéis
aos seus erros e como isso significa que não avançaremos muito, enquanto formos
prisioneiros da polarização.
No momento, vivemos uma situação interessante
na França. Houve uma unidade para vencer ou pelo menos barrar a ascensão da
extrema direita. De uma certa forma, guardadas as proporções, foi o que
aconteceu no Brasil nas eleições.
Passado o momento das comemorações, tanto
aqui como lá, torna-se evidente que a motivação eleitoral não basta, isto é,
não se trata apenas de derrotar o adversário.
É preciso ter um programa e realizar um bom
governo para que o ciclo no poder seja mais longo, não por simples vontade de
poder, mas para que haja tempo para realizar o projeto e provocar
transformações duradouras, dessas que a própria alternância não consegue
destruir.
O Brasil precisa de projetos de Estado, não de estratégias eleitoreiras de partidos, grupos de políticos bandidos, religiosos pilantras ou empresários meramente oportunistas. ( Sonhar ainda não paga imposto. )
ResponderExcluirÓtima coluna !
Nada pode dar certo em um país liderado por um bandido corrupto e condenado. Sentado no Palácio do Planalto quando deveria estar na prisão já que jamais foi inocentado. E foi condenado em terceira instância judicial e por 10 juízes. Os combatentes da corrupção, inclusive juízes, sofrem hoje perseguição dos aliados deste desgoverno. O exemplo vem de cima. Com Lula ou com Bolsonaro continuaremos na mediocridade de sempre. Pobre (e rico) país cego por ideologias nefastas lideradas por políticos profissionais medíocres que não valem o que comem.
ResponderExcluirApoiado.
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