Folha de S. Paulo
Política de governo paulista para cracolândia
abusa de internações involuntárias, que deveriam ser excepcionais
Deu na Folha que o número de internações involuntárias de usuários de crack
na capital paulista disparou no último ano. Ao que tudo indica, isso é um
reflexo da política de combate às drogas adotada pelo governo de Tarcísio de Freitas.
Há poucas coisas tão complexas e difíceis quanto os transtornos mentais. Se, em
condições normais, a marca do ser humano já é a diversidade, ela ganha escala
logarítmica quando falamos de doenças mentais.
Aí, cada caso é um caso. O que funciona para um paciente ou mesmo para muitos
pacientes não funciona para outro grupo, de modo que o sistema precisa ter
abertura para lidar com múltiplas situações.
Mesmo com esse considerando, penso que é um
erro abraçar uma política pública que amplie as internações involuntárias. Há
muito poucas vagas para tratamento de dependentes de álcool e drogas no SUS e a procura é grande. A maior
parte das pessoas que deseja uma internação não a consegue. Os índices de
sucesso desse tipo de tratamento, que já não são brilhantes quando o paciente
quer submeter-se a ele, pioram significativamente quando ele é imposto contra
sua vontade. Parece óbvio, portanto, que as escassas vagas devem ser destinadas
àqueles que têm maiores chances de utilizá-las bem.
Outra objeção é de ordem jurídica. A lei nº 10.216, que disciplina as internações involuntárias, é
um escândalo. Ela permite que um indivíduo seja privado de sua liberdade, em
tese sem limite de tempo, por determinação de um psiquiatra (e não de juiz) e
sem direito a segunda opinião médica ou revisão judicial, o que é assegurado
até a assassinos confessos.
Na forma em que está, a lei funciona não só para promover intervenções
genuinamente sanitárias, mas também, e aí de forma deturpada, como ferramenta
de controle policial. Não é uma coincidência que governos irredutivelmente
autoritários como o de Freitas morram de amores pelas internações
involuntárias.
Não sabia disso!
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