Folha de S. Paulo
Governantes da Venezuela têm muito a perder
em caso de derrota eleitoral, o que pode levá-los a medidas extremas
Receio que Nicolás Maduro e seus lugares-tenentes já tenham queimado a linha da normalidade democrática. Não me parece muito realista o cenário em que, no caso de derrota no pleito presidencial do próximo domingo (28), entreguem o poder e se preparem para disputar a próxima eleição, como recomendou Lula. Pelas pesquisas de institutos independentes, o candidato da oposição unificada, Edmundo González, tem sólida vantagem sobre Maduro, o que é compatível com a escala da ruína econômica que o governo promoveu.
O chavismo do qual Maduro é herdeiro começou
sob a égide da democracia em 1999, mas foi paulatinamente se convertendo num
regime autoritário. Pelo menos desde 2017, quando suprimiu os poderes do
Legislativo eleito, pode ser chamado de ditadura. Nesse período, houve graves
violações a direitos humanos, pelas quais os atuais governantes teriam de
responder em caso de troca de comando. Isso significa que eles têm poucos
incentivos para seguir o script das democracias e muitos para tentar burlá-lo e
permanecer no poder.
Meu palpite, portanto, é que Maduro fará o
que estiver a seu alcance para não entregar o osso. As respostas mais óbvias
seriam invalidar o pleito ou recorrer à fraude eleitoral. Esta última seria
apenas a continuação dos casuísmos contra a oposição que o regime já perpetrou.
Mas pode não ser tão simples, sobretudo se a vantagem numérica de González for
muito grande. Outra possibilidade é fingir que aceita um resultado
desfavorável, mas fabricar uma crise que inviabilize a transferência de poder.
Tempo não faltará. A posse do próximo presidente está prevista só para janeiro
de 2025.
O que torna a democracia o menos ruim dos
sistemas políticos à nossa disposição é que ela permite ao eleitorado remover
pacificamente governantes com os quais não esteja satisfeito. É esse mecanismo
que talvez já não funcione mais na Venezuela,
o que seria trágico.
Na torcida para que Maduro caia de maduro.
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