O Globo
Eleitorado quer mudar radicalmente a situação, e Macron dificilmente conseguirá reverter esse ambiente
A direita política colheu uma série de
vitórias nos últimos dias na França e nos Estados Unidos, que repercutem na
direita brasileira. A decisão da Suprema Corte americana de dar a Donald Trump
uma imunidade parcial nos processos a que responde favorece-o na corrida
presidencial, afastando a possibilidade de vir a ser julgado antes das eleições
de novembro.
Além desse efeito prático, a maioria
conservadora da Suprema Corte deu argumentos à visão da direita internacional,
especialmente aos bolsonaristas, que identificam na decisão a confirmação de
que o ocorrido no Brasil pode não ter sido uma tentativa de golpe, mas uma ação
presidencial dentro de suas prerrogativas.
Assim como Trump tinha direito de pedir ao secretário de Estado da Georgia que “encontrasse” mais votos para ele em sua região, Bolsonaro também poderia ter “consultado” ministros e assessores sobre reações à vitória de Lula na eleição presidencial.
A visão conservadora da maioria dos juízes da
Suprema Corte dos Estados Unidos também chancela a estratégia de controlar a
mais alta Corte do país com nomeações a dedo. Além do mais, a provável eleição
de Trump nos Estados Unidos levará ao governo um aliado incondicional da
direita brasileira, com ligações pessoais com os Bolsonaros.
O mesmo não acontecerá com uma possível
vitória da direita francesa, na pessoa de Marine Le Pen. Ela já disse
anteriormente que atitudes e linguajar como os de Bolsonaro não são aceitáveis
na França. A resposta do eleitorado francês à decisão de Emmanuel Macron de
antecipar as eleições está muito clara, a maioria da população reafirmou que
quer mudanças, quer isolá-lo no poder.
Ele pode fazer acordo com a esquerda e manter
a maioria, mas isso não lhe dará força. Pelas previsões, o centro chefiado por
ele praticamente desapareceu, foi engolido pela frente de direita. A chance de
ele retomar um governo com qualidade e força é mínima. Ficará isolado no
Congresso, sem condições de decidir as questões internas. Terá presença na
política externa e na defesa, setores importantes num momento de crise
internacional e de guerras que envolvem a Europa, com questões delicadas, como
a posição francesa em relação a Putin.
A vitória da direita mostra que o centro que
apoiava Macron foi para a direita, e a extrema direita foi para o centro. Essa
combinação pode deixá-lo isolado na Presidência e na coabitação, sem poder.
Haverá crises permanentes. A manobra que ele tentou para esvaziar a extrema
direita foi errada; ao contrário, fortaleceu-a.
É um sinal claro de que o eleitorado quer
mudar radicalmente a situação, e Macron dificilmente conseguirá reverter esse
ambiente. A direita e a extrema direita têm ganhado terreno no mundo todo,
principalmente na Europa. O momento não é bom para o centro democrático. O fato
de o partido de Macron ter chegado em terceiro lugar no primeiro turno mostra
que os eleitores de centro acompanharam o movimento de Marine Le Pen, que
também mudou de atitude, a ponto de não ser vista mais como política de extrema
direita por muitos setores da sociedade.
O mesmo perfil de centro-direita é buscado
pelos possíveis sucessores de Bolsonaro no Brasil. Todos os governadores vistos
— inclusive por Lula — como potenciais candidatos à Presidência se distanciam
da agressividade de Bolsonaro, especialmente o de São Paulo, Tarcísio de
Freitas. Pagar tributo, no entanto, faz parte do jogo eleitoral, e isso obriga
Tarcísio a adotar medidas estapafúrdias como as escolas cívico-militares ou a
visão autoritária na segurança pública.
Talvez obrigar não seja o melhor termo para
definir a situação. Pode ser que Tarcísio considere que esses exemplos de
radicalização sejam mesmo a solução para questões tão fundamentais como
segurança pública e educação.
Momento infeliz.
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