Valor Econômico
A elite do setor privado reclama bastante dos impostos excessivos, mas finge não saber que a carga tributária é regressiva no Brasil e que, portanto, os ricos pagam menos impostos do que deveriam
A imprensa tem publicado críticas corretas aos excessivos privilégios angariados de diversas formas pela elite do funcionalismo público, em particular do Poder Judiciário. São muitas as matérias que denunciam os rendimentos dos membros da magistratura federal e estadual, entre outros, muito superiores ao teto constitucional ditado pelos salários de ministros do STF. A concessão desses benefícios é autorizada e, muitas vezes, estimulada pelos órgãos superiores e conselhos do Poder Judiciário, sendo várias dessas vantagens com caráter retroativo e isentas de incidência de imposto de renda.
O tamanho do grupo beneficiado é
relativamente reduzido frente ao número total de servidores públicos, de forma
que o custo desses privilégios não é tão expressivo frente aos gastos totais
com a folha de pagamentos. Essa baixa representatividade no resultado fiscal
contribui para que os especialistas em contas públicas se esquivem de críticas
aos cada vez mais frequentes penduricalhos.
A má alocação dos recursos públicos é o
padrão histórico no Brasil. Os desvios dificilmente são averiguados e, quando
são, dificilmente são punidos. Os casos são tão estapafúrdios que quase ninguém
parece surpreso quando o governo promete cortar cerca de R$ 25 bilhões em
malfeitos na liberação de benefícios de programas previdenciários. Do mesmo
modo, o superfaturamento de obras e a malversação nas compras públicas são
frequentes, a ponto de órgãos públicos nem levarem muitas vezes ações judiciais
adiante, sob a alegação de que os responsáveis se comprometeram a ressarcir os
desvios.
No fundo, poucos da elite percebem que os
benefícios excessivos e injustos são obstáculos ao desenvolvimento
É compreensível, portanto, que os
representantes empresariais reclamem por carregar um setor público pesado, caro
e ineficiente, bem como por atuar em ambiente inóspito, com um sistema
jurisdicional instável e mudanças regulares de regras que desestimulam o
empreendedorismo e a atividade econômica. Há muita verdade nessas alegações,
apesar desses mesmos agentes se empenharem muito para conseguir mais e mais
vantagens, como renúncias tributárias, proteção de mercado e renegociações e
perdões de dívidas. O lobby desses representantes nos gabinetes de autoridades
federais e dos entes regionais no Executivo, Legislativo e Judiciário faz parte
da rotina e termina por tornar o ambiente de negócios ainda mais disfuncional.
Por incrível que pareça, essa luta por
privilégios já não causa indignação, com poucas organizações se dedicando ao
combate à concessão de vantagens para grupos específicos. O entendimento
enraizado é de que o papel do Estado é mesmo o de atender todas as demandas da
sociedade, não havendo a clareza de que a concessão de benefícios para um grupo
diminuiu o espaço para o atendimento das necessidades dos outros. Os cofres
públicos são vistos como ilimitados, com a concessão de vantagens para uns não
sendo interpretada como um impeditivo para a oferta de benefícios para os
demais. Ao mesmo tempo em que há uma rejeição contra o aumento da carga
tributária e um empenho de diversos grupos a favor da redução de impostos sobre
seus setores, não há uma busca pela redução de gastos ou o corte de renúncias
tributárias reconhecidamente ineficazes.
A elite do setor privado reclama bastante dos
impostos excessivos, da dívida pública elevada e da usual ineficiência do setor
público, mas finge não saber que a carga tributária é regressiva no Brasil e
que, portanto, os ricos pagam menos impostos do que deveriam frente à carga
média de tributos. Ademais, o discurso omite os disseminados privilégios
amealhados ao longo do tempo, que são bastante questionáveis e alguns até
risíveis:
Isenção de impostos sobre dividendos:
estruturas societárias adotadas em instituições financeiras, escritórios de
advocacia, empresas de consultoria, órgãos de imprensa, entre outros segmentos,
para evasão do imposto de renda sobre o trabalho.
Sistema Simples e empresas unipessoais: a
ampliação dos limites para classificação no Simples e a expansão de empresas
unipessoais reduzem o pagamento de impostos de empresários e de profissionais
liberais sem nenhuma comprovação sobre a obtenção de benefícios para a
economia, como aumento da produtividade e ampliação do número de postos de
trabalho.
Gratuidade em universidades públicas:
excetuando-se os beneficiados por cotas, os alunos são, em sua grande maioria,
pertencentes às classes mais abonadas da sociedade.
Abatimento do imposto de renda para despesas
com educação, saúde e previdência privada: entre os muitos abatimentos, a
classe mais rica se beneficia do desconto em seus gastos com serviços privados.
Financiamentos subsidiados e renúncias
tributárias para bens de luxo: a classe mais rica é beneficiada por renúncias
tributárias em setores como, por exemplo, aviões e embarcações de luxo, tendo
sido aquinhoada no passado recente por financiamento público com taxas
reduzidas para compra de jatos executivos.
Redução de impostos para aquisição de
veículos por acidentados: a legislação dúbia e a fiscalização deficiente
permitem que pessoas acidentadas, por exemplo, esquiando em estações de luxo,
mantenham esse privilégio mesmo após a recuperação plena.
Táxis para transporte privado: aquisição de
táxis pela elite paulistana em nome de seus motoristas particulares para
permitir o trânsito em faixas exclusivas.
As respostas dos beneficiados do setor
privado quando questionados sobre esses privilégios são idênticas às utilizadas
por representantes da elite do funcionalismo público: as medidas estão em plena
consonância com a lei, geram postos de trabalho e crescimento para o país.
Ademais, a maioria da elite não se identifica como privilegiada e não reconhece
que a renda não precisa ser tão alta para se fazer parte da minúscula minoria
rica do país. No fundo, poucos da elite percebem que os benefícios excessivos e
injustos são um dos obstáculos ao desenvolvimento do país. Nesse ambiente, o
corte de privilégios é, terminantemente, uma luta inglória.
PERFEITO! Cada um quer um privilégio pra chamar de seu... E os empresários que mais criticam o Estado são frequentemente os que mais mamam nas tetas públicas. Discretamente, lógico.
ResponderExcluirEXECELENTE ARTIGO, PARTE RELEVANTE DO ORÇAMENTO DA UNIÃO É " CAPTURADO " PELAS ELITES EMPRESARIAS DE CAPITAL NACIONAL E
ExcluirINTERNACIONAL E PEKAS ELITES DO SERVIÇO PÚBLICO !!!
Perfeito!
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