Folha de S. Paulo
Há mais ânimo no mercado de capitais e de
crédito; comércio, serviços e emprego avançam
Jamais as empresas haviam tomado tanto
dinheiro no mercado de capitais. Pelo menos no mercado de renda fixa, o volume
é recorde, em termos reais, nos últimos doze meses, até junho. Trata-se aqui de
crédito por meio da venda de debêntures e outros títulos de dívida. O dinheiro
é usado em capital de giro, investimento na
expansão do negócio, melhora do endividamento etc.
É um dos sinais de ânimo na economia, apesar do azar da virada financeira nos EUA, da bagunça sobre metas fiscais e da catástrofe no Rio do Grande do Sul. Pelo menos no que diz respeito ao andamento geral da economia, o efeito do desastre horrível que se abateu sobre os gaúchos parece ter sido menor do que o esperado.
Os números do mercado de capitais estão no
balanço divulgado nesta quarta-feira (17) pela Anbima (Associação Brasileira
das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais). Esse mercado se recuperou
do desastre do início do ano passado, causado pela revelação dos crimes na
Americanas, além de outros problemas em empresas, e por causa da taxa de juros ainda
mais alta do que a de agora.
No que diz respeito a novas ofertas de vendas
de novas ações ("IPOs"), o mercado continua em ponto morto.
Ainda assim e apesar do incessante tumulto
brasileiro, parece que empresas e potenciais credores estão um pouco mais
propensos a correr risco, melhora que é notável no mercado de renda fixa desde
março. Também no crédito bancário se percebe recuperação.
O total de concessões (novos empréstimos)
cresceu 4,1% nos últimos 12 meses, até maio (em comparação com igual período do
ano passado, em termos reais). No caso de empresas (pessoas jurídicas) a alta
foi menor, de 1,9% em doze meses. Mas o total de concessões anuais estava no
vermelho até fevereiro.
O total de crédito em relação ao PIB estimado
mensalmente pelo Banco Central estava em 53,7% em maio. Quer dizer, mais ou
menos na mesma dos últimos meses, é verdade, mas maior do que em maio do ano
passado.
Quanto à atividade econômica, o faturamento
de comércio e serviços cresceu bem mais do que o esperado em maio. Pode bem ser
que o PIB cresça ao menos 2,5% neste 2024. A julgar pelos dados disponíveis até
agora, é possível que os bons números do emprego e dos salários sustentem o
consumo, apoiado um tanto mais pela melhora do crédito bancário.
Dadas as limitações crônicas do crescimento
brasileiro, as perspectivas são razoáveis —no curto prazo.
Um risco difícil de estimar é o de tumulto
internacional, como aqueles que podem surgir nos voláteis Estados Unidos, com
sua biruta nos juros e na política —há mais
chance de que Donald Trump venha aí.
Há uma incógnita a respeito de quanto vai durar o bom momento do mercado de
trabalho (que já vem de longe e ainda parece mal compreendido pelos
economistas, que de resto não o previram).
Há uma suspeita forte: parte desse ritmo
melhor do PIB dependeu do aumento forte do gasto público, que está chegando a
um limite, de um modo ou de outro (ou a despesa é contida, pelo menos dentro
dos tetos metas do arcabouço fiscal, ou as taxas de juros permanecerão altas).
Há uma certeza: a continuação de um ambiente
mais animado depende de uma queda considerável das taxas de juros, o que ainda
não está no horizonte, e também do preço do dólar —nesse nível em que anda, vai
pressionar a inflação.
O alívio nas condições financeiras, por sua
vez, depende das medidas concretas que o governo federal vai divulgar a partir
da semana que vem: como vai limitar o estouro do gasto deste ano e como será o
Orçamento de 2025. Tapar o sol com a peneira de medidas fiscais fracas vai
jogar areia no motor ainda pequeno da economia dita real.
Pois é.
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