quinta-feira, 18 de julho de 2024

William Waack - Problema de política

O Estado de S. Paulo

A sensação é a de que tudo parece que só se complica

Incapacidade política por parte do governo Lula está ajudando a aumentar a decepção de vastos setores da economia com dois grandes temas de forte impacto: desoneração das folhas de pagamento e regulamentação da reforma tributária.

No caso da desoneração comprou-se uma briga com o Congresso na suposição de que o respaldo político e jurídico do STF compensaria a falta de votos do Planalto. O resultado é uma formidável confusão que produziu um limbo contábil para empresas. Nem se fala do mérito da questão, que ficou esquecido.

Técnicos da Receita e do Senado disputam qual o tamanho do buraco que terá de ser coberto por conta de desonerações, mas a questão está no âmbito da política. O Congresso tem uma formidável capacidade de encurralar o Executivo quando se sente encurralado – e é o que acontece no momento.

Não há qualquer chance hoje de aumento de alíquota de impostos para compensar desonerações, tal como sugerido pela Fazenda (leia-se Receita). Não “há clima”, como se diz no Legislativo, para ajudar um governo pouco empenhado em cortar gastos. Despesas criadas pelos parlamentares são parte do problema, mas o governo não sabe pressioná-los.

A questão da regulamentação da reforma tributária é ainda mais complexa do ponto de vista da política. Ela expõe situação que se agrava ao longo de sucessivos governos: a incapacidade do sistema político de equilibrar demandas regionais ou setoriais tendo como horizonte final o conjunto do País.

É bastante óbvio que benefícios de um lado teriam de ser compensados por sacrifícios de outro. Mas o Congresso, onde os puxadinhos dos puxadinhos são erguidos, não tem condições de ser “condutor” nem “árbitro” numa questão dessa magnitude.

Circunstâncias atuais tornaram a situação mais precária. Os mais variados grupos representando setores da economia, categorias profissionais e regiões do País operam com desenvoltura no Legislativo, em ambiente de permissividade. Tributaristas se queixam de demandas pouco republicanas em negociações sobre inclusão ou exclusão de impostos, por exemplo.

A regulamentação da reforma, com seus regimes específicos, exceções e impostos seletivos, ameaça o próprio espírito da reforma e a promessa pouco crível de que não haverá aumento da carga. O “teto” de uma alíquota geral nos 26,5% é ridicularizado por especialistas.

Talvez os operadores políticos do governo, começando por Lula, não tenham percebido o quanto esse ambiente de que “tudo parece que só se complica” impacta na capacidade de dialogar com setores produtivos. Preferem falar de problemas de comunicação. Mas é problema de política, mesmo.

 

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