Não tenho dúvida de que realizará com maestria a tarefa de preservar o poder de compra da moeda, sem ignorar o PIB e o emprego
Conheço Gabriel Galípolo há tempos. Quem nos
apresentou foi um estimado professor em comum, José Marcio Rego. Já presenciei,
em muitas ocasiões, sua capacidade de analisar a economia nacional, sob
perspectiva teórica e histórica; sempre com bom humor. Tem capacidade de
entrega e dialoga com diferentes interlocutores, de matizes distintos, em
benefício dos propósitos a que se dedica.
A notícia de que Galípolo será indicado à
presidência do Banco Central (BC) é um bom agouro, que chegou pela boca do
próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na tarde de ontem. Não tenho
dúvida de que realizará com maestria a tarefa de preservar o poder de compra da
moeda, sem ignorar o PIB e o emprego.
A condução da política monetária é um desafio complexo, técnica e politicamente. Destaco quatro requisitos: capacidade de comunicação, fundamentação técnica das decisões, uso permanente dos experientes servidores da autoridade monetária e boa interlocução com o governo, o Congresso, o mercado, a academia e a chamada economia real.
A autonomia operacional do BC consolidou-se
com o próprio sistema de metas à inflação, em 1999, no governo FHC. O novo
regime complementava-se por outros dois pilares: a responsabilidade fiscal,
materializada nas metas de superávit, e a flutuação da taxa de câmbio, com
livre mobilidade de capitais.
Por alguns anos, após o Plano Real (1994)
debelar a hiperinflação, a âncora cambial serviu ao propósito de evitar o
retorno do fantasma. A saber, o manejo do preço do dólar medido em reais, isto
é, a taxa de câmbio, permitia influenciar o nível de preços, em que pesem os
efeitos deletérios do real apreciado sobre a produção.
Ninguém mais aceitaria a volta de um regime
econômico marcado por carestia e falta de previsibilidade. Mas, para suplantar
a âncora cambial e estimular a entrada de capitais de boa qualidade no País,
foi preciso formular uma nova política econômica.
Trocou-se a âncora cambial pela fiscal. As
metas para a inflação seriam fixadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN),
composto pelos ministros do Planejamento e da Fazenda e pelo próprio presidente
do BC. O Conselho de Política Monetária (Copom) do BC fixaria a meta Selic para
cumprir esses compromissos. As metas de superávit primário levariam, no longo
prazo, à redução dos juros.
O Copom deve usar com autonomia os
instrumentos à sua disposição, mormente, a meta Selic, referência para os juros
praticados no mercado, que troca recursos por títulos públicos e vice-versa
(incluídas, aqui, as chamadas operações compromissadas), sujeitos à Selic.
Daí a importância do BC. Se ele é capaz de
influenciar o custo do crédito, por meio da Selic, então pode colaborar para
domar as pressões advindas do consumo, por exemplo, sobre a inflação.
Essa complexa política de juros precisa
blindar-se de interesses estranhos aos já elucidados. Mas seus gestores devem
satisfações à sociedade. É por essa razão que a lei determina a ida periódica
do representante do BC ao Congresso, aliás.
A Selic é um instrumento de política
econômica e, assim, a veleidade de levar o juro a este ou àquele patamar é só
isto: puro desejo. Quanto maior a capacidade e a disposição do governo em
cumprir as regras legais previstas para a política fiscal, com vistas à
obtenção das condições de sustentabilidade da dívida pública em relação ao PIB,
tanto maiores as chances de se ter juro civilizado. Sem isso, nada feito.
A ida do ex-secretário-executivo do
Ministério da Fazenda para a Diretoria de Política Monetária, a mais técnica de
todas as nove cadeiras, foi bem aceita. O mesmo tende a acontecer com sua
indicação para presidi-lo, confirmada ontem.
Galípolo tem experiência nos setores público
e privado. Ocupou postos importantes no governo do Estado de São Paulo, na área
de concessões e parcerias público-privadas, presidiu o Banco Fator, foi
secretário-executivo do Ministério da Fazenda e exerce, atualmente, mandato
como diretor do BC.
Nesse último cargo, que é bastante técnico,
apresentou amplo conhecimento do mercado, especialmente no que se refere aos
títulos públicos e ao dólar. Incorporou a ideia da boa gestão como sinônima de:
boa interlocução com os mercados, aqui e lá fora, de modo transparente;
capacidade de comunicação fundamentada nos documentos oficiais; e flexibilidade
para lidar com a política. Está forjado para o novo desafio.
É sintomático que Galípolo tenha conquistado
a burocracia permanente do BC em tão pouco tempo. Ela é reconhecida pelas
elevadas competência técnica e capacidade analítica. Ali, a música toca sempre
afinada, sem notas amassadas e melodias confusas. Não aceita maus dançarinos,
vale dizer.
Por fim, sobre a relação entre o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva e o economista Gabriel Galípolo, só vejo vantagens. É
natural que o presidente se preocupe com o custo do crédito, o desemprego, a
inflação e o crescimento econômico. Cabe aos dirigentes do BC o diálogo, dentro
das limitações e obrigações impostas por seus mandatos.
Boa sorte a Gabriel Galípolo no processo, que
ainda contará com a indicação formal do presidente e a sabatina e aprovação
pelo Senado.
Para o colunista, "as chances de se ter juro civilizado" dependem da capacidade e disposição do governo em cumprir as regras legais previstas para a política fiscal. Até parece que o desejo de lucro máximo dos agentes emprestadores do mercado financeiro não existe, estes agentes financeiros só acompanham as ações e decisões governamentais e estipulam suas altas taxas com base nestas...
ResponderExcluirO custo do crédito depende muito mais dos agentes financeiros do que do Banco Central ou do Governo Federal em geral.
ResponderExcluirTemos uma das maiores taxas de juros do mundo. Galípolo tem que começar a acabar com isto, mesmo contra os interesses do mercado financeiro.
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