Folha de S. Paulo
Não existe razão teórica para privar de
segundo turno habitantes de cidades com menos de 200 mil eleitores
Entre os muitos déficits democráticos
consagrados pela Constituição brasileira
está a regra de que apenas
municípios com mais de 200 mil eleitores fazem um segundo turno na eleição para
prefeito, caso nenhum dos candidatos obtenha mais de 50% dos
sufrágios válidos na primeira votação.
O segundo turno pode ser descrito como um mecanismo que dá materialidade à rejeição. Na prática, ele permite aos eleitores vetar o postulante mais detestado —uma providência razoável num sistema que visa a conter radicalismos e promover o entendimento.
Outra característica interessante do segundo
turno é que ele favorece expressões mais autênticas do voto. Quando o pleito é
em duas etapas, o eleitor pode dispensar o voto útil na primeira. Fica menor o
risco de uma força que tenha a maioria (esquerda ou direita) perder a eleição
porque saiu dividida, enquanto o outro lado veio com candidato único.
Eu ao menos não consigo vislumbrar nenhuma
justificativa teórica para sustentar que apenas moradores de cidades grandes
devem beneficiar-se do instituto do segundo turno, enquanto os habitantes de
municípios menores dele ficam privados. Até onde vai minha memória, o
legislador criou a regra dos 200 mil apenas para reduzir custos —um critério
não exatamente republicano.
Creio que essa discriminação contra as
cidades pequenas deveria ser revista. O caminho mais "intuitivo" é
estender o segundo turno a todas as cidades, independentemente do tamanho, mas
existem outros. Uma solução mais ousada seria adotar, para todas as eleições majoritárias,
algum tipo de votação ranqueada, em que o eleitor ordena os candidatos segundo
sua preferência.
Uma vantagem desse sistema é que ele
permitiria obter um resultado semelhante ao de votação em dois turnos com uma
única ida à urna. Há um interessante debate teórico em torno desses sistemas e
seus efeitos mais sutis. A desvantagem óbvia é o custo de aprendizado.
Sei.
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