Correio Braziliense
Há que se considerar o peso do Brasil, da
Colômbia e do México nas articulações diplomáticas sobre a Venezuela, comparado
ao do Chile, que é bem menor
A visita oficial do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva ao Chile, onde se encontrou com o presidente Gabriel Boric,
sinaliza uma mudança de companhia importante para a política latino-americana e
a imagem internacional do petista, desgastada pelo apoio do PT à reeleição
fraudulenta do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro. Quanto mais longe do
venezuelano e mais próximo do chileno, melhor para a democracia e para o
próprio governo Lula.
Gabriel Boric, de 38 anos, é uma nova liderança de esquerda no continente, num país com vasta experiência política. A mais traumática foi o golpe de Estado do general Augusto Pinochet, que destituiu o governo de Salvador Allende e pôs fim à chamada “via chilena” ao socialismo, implantando a mais sanguinária ditadura do continente. O episódio viria a inspirar a proposta de “compromisso histórico” entre os comunistas italianos e a democracia cristã, liderados, respectivamente, por Enrico Belinguer, seu autor, convencido de que a democracia era um valor universal, e Aldo Moro, que viria a ser sequestrado e assassinado pelas Brigadas Vermelhas, em 9 de maio de 1978, o que implodiu o acordo.
A diferença de gerações entre Lula, 40 anos
mais velho, e Boric explica em parte a diversidade de visões de mundo entre
ambos. O chileno foi um dos primeiros chefes de Estado a reagir ao anúncio do
Conselho Nacional Eleitoral (CNE) de que Maduro teria sido reeleito, derrotando
o candidato da oposição Edmundo González. Na rede social X, Boric escreveu que
os resultados anunciados eram “difíceis de acreditar”. No mesmo dia, o corpo
diplomático chileno foi expulso pela Venezuela de seu território, por ter questionado
os resultados do pleito.
Ao contrário, na sua primeira declaração,
Lula pisou na bola: afirmou que o que estava ocorrendo na Venezuela era um
“processo normal”, em que a Justiça poderia resolver o impasse. Pesaram as
velhas relações políticas e ideológicas do petismo com o chavismo, com as quais
Boric não tem nada a ver. O encontro de ambos, nesta segunda-feira, não superou
a diferença de posicionamento, porque o Brasil continua defendendo uma solução
negociada entre o governo Maduro e o candidato de oposição, Edmundo González,
que nesta segunda-feira se proclamou presidente eleito da Venezuela, com apoio
de muitos países.
Depois do encontro com Boric, Lula voltou a
pedir transparência no processo eleitoral da Venezuela, enquanto Boric evitou
comentar o assunto. Nicolás Maduro, no poder desde 2013, foi considerado
reeleito pelos organismos oficiais, controlados por ele, com quase 52% dos
votos. As atas eleitorais, que registram os votos das urnas, ainda não foram
apresentadas até hoje. Com base nas cópias das atas, a oposição afirma que
González venceu as eleições com mais de 70% dos votos.
Lula conversou com Boric sobre as iniciativas
conjuntas com os presidentes da Colômbia, Gustavo Petro; e do México, Lopez
Obrador, em relação a processo político na Venezuela. “O respeito pela
tolerância, o respeito pela soberania popular é o que nos move a defender a
transparência dos resultados. O compromisso com a paz é que nos leva a
conclamar as partes aos diálogos e promover o entendimento entre governo e
oposição”, disse, em coletiva de imprensa.
Integração
Há que se considerar o peso do Brasil, da
Colômbia e do México nessas articulações diplomáticas, comparado ao do Chile,
que é bem menor. Mas, do ponto de vista de imagem na opinião pública
brasileira, Lula tem mais a ganhar ao se aproximar do líder chileno. Elegante,
Boric evitou tratado do assunto para não manifestar sua divergência.
O presidente chileno já teve um entrevero com
Lula por causa da guerra da Ucrânia, quando foi chamado pelo petista de jovem
apressado ao condenar a invasão russa, durante a finalização da cúpula da
Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) com a União
Europeia (UE), em julho do ano passado. Em maio do mesmo ano, após o encontro
da cúpula de líderes sul-americanos no Itamaraty, Boric também criticou a
postura de Lula frente ao governo ditatorial de Nicolás Maduro.
O Brasil é principal destino dos
investimentos chilenos no mundo, enquanto o Chile é sexto maior mercado para
exportações brasileiras. Lula e Boric assinaram 19 acordos e outros atos
bilaterais em áreas que vão do turismo, ciência e tecnologia, defesa, agropecuária
e direitos humanos até as relações comerciais e de investimentos, porém, pouco
diversificados.
O Brasil é o terceiro maior parceiro
comercial do Chile, com um intercâmbio comercial que atinge US$ 12,3 bilhões
por ano. O Brasil é o maior investidor latino-americano dentro do Chile, mais
de US$ 4,5 bilhões, em setores como energia, serviços financeiros, alimentos,
mineração, construção e fármacos. O Brasil também é o principal destino dos
investimentos chilenos no exterior, com quase 30% do estoque total.
Lula destacou a colaboração do Chile nos
grupos de trabalho do G20, cuja presidência está com o Brasil, e Boric disse
que o Chile vai integrar a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, proposta
pelo Brasil. Brasil e Chile são sócios, junto com Paraguai e Argentina, no
Corredor Bioceânico, que ligará o Centro-Oeste brasileiro aos portos do Norte
do Chile, que deverão desempenhar parte central da logística para o acesso a
mercados do Pacífico.
Que bom!
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