O Globo
Governo Lula tem vitorias a comemorar na
economia e política ambiental e correção de rotas a fazer em áreas que podem
alimentar discurso da oposição
Com um ano e meio no cargo e olhando o
futuro, já é possível fazer um balanço de avanços e riscos para o governo Lula.
Ele acerta na economia e acumula pontos na área ambiental, contudo, na política
externa e no pantanoso terreno da corrupção, seus erros e hesitações
alimentarão o discurso da oposição no embate de 2026. Será preciso fazer
correções de rotas nessas áreas. No caso da Venezuela,
já começou a ser feita.
O espectro de Joe Biden perseguirá o presidente Lula se ele disputar a reeleição e já era tempo de pensar em herdeiros políticos no seu campo, até porque quatro mandatos para uma mesma pessoa, ainda que seja possível, não fazem bem à democracia alguma.
A semana passada foi interessante para ver
esses sinais. O desemprego chegou ao menor nível desde 2014, no segundo
trimestre, e a renda subiu 5,8%, na comparação anual. A produção industrial
subiu 4,1% em junho, mostrando o efeito da ajuda rápida ao Rio Grande do Sul. A
inflação está baixa e o crescimento maior do que o previsto. Tudo alimenta a
sensação de conforto econômico.
Na política externa, o país viveu uma
gangorra na crise da Venezuela. Qualquer pessoa que acompanhe o que se passa há
um quarto de século no país vizinho sabe que o chavismo se mantém no poder
usando a mesma estratégia que o bolsonarismo gostaria de ter implantando no
Brasil. Uma vez no poder pelo voto popular, em 1999, Hugo Chávez começou o
projeto de enfraquecer as instituições democráticas, eliminar a imprensa
independente, cooptar as Forças Armadas dando-lhes espaço no poder e acesso a
dinheiro da corrupção. Foi seguido por Nicolás
Maduro neste processo de erosão da democracia por dentro.
Se o presidente brasileiro der o aval a uma
eleição tão suspeita de fraude, como pareceu ao dizer que nada houve de anormal
na Venezuela, dará farta munição à oposição que quer ligá-lo às ditaduras. Como
Lula foi eleito defendendo a democracia contra as intenções golpistas do seu
adversário, se ligar à Maduro é atirar em seu próprio capital político. O
chavismo é o que o bolsonarismo gostaria de ser. A clivagem hoje é entre
democratas e autocratas. Maduro é tão autocrata quanto Viktor Orbán,
da Hungria, amigo de Bolsonaro.
A nota conjunta de Brasil, Colômbia e México acertou ao
pedir verificação imparcial das eleições. Quando assumiu a custódia da
embaixada argentina,
o Brasil lembrou ao presidente Javier Milei os
laços históricos entre os dois países. Em 1982, quando Argentina e Reino Unido entraram
em guerra, o Brasil assumiu a embaixada argentina em Londres e
houve o mesmo simbólico gesto da bandeira brasileira tremulando na
representação diplomática argentina. É esse patrimônio que Milei andava
desprezando.
No debate global do clima, o Brasil fez um
salto de qualidade no governo Lula. Na reunião dos ministros das Finanças do
G20 foi assinada a arquitetura de um novo instrumento de captação de recursos
para financiar países florestais, grupo do qual o Brasil é o maior. O Tropical
Forest Finance Facility ( TFFF) foi sugerido por Brasil e Colômbia, na reunião
da COP do
ano passado, e já está com seus contornos definidos. O objetivo será o de
proteção das florestas.
Há outros instrumentos virando realidade.
Isso é possível pelo entendimento que existe entre a ministra Marina Silva e
o ministro Fernando
Haddad. A esse duo se junta o Itamaraty, onde atua na área do clima,
o embaixador André Corrêa do Lago. As equipes dos ministérios têm visão
compartilhada sobre a emergência climática. Isso nos coloca no mundo, nos dá
protagonismo e prepara o país para tornar realidade o financiamento privado,
governamental e das instituições multilaterais, estímulos a um novo ciclo de
desenvolvimento baseado na transição ecológica. O Brasil não pode perder esse
projeto, mas o perderá se trouxer de volta um governante ligado ao negacionismo
climático.
Um terreno pantanoso é o combate à corrupção.
O governo precisa ser transparente e rigoroso nessa questão. Ele não apagará a
dúvida dizendo que foi perseguido pela Lava-Jato. Os erros daquela operação não
eliminam a necessidade de evitar quaisquer desvios. O nebuloso episódio que
vincula os irmãos Batista a uma operação vantajosa na área da energia, a
cobertura com sigilo de cem anos dada à evolução patrimonial do ministro das
Minas e Energia, Alexandre Silveira, lembram muito antigos desvios pelos quais
governos passados se perderam. E o Brasil não quer mais viver o que viveu.
Correto.
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