Folha de S. Paulo
Banco Central anuncia que vai vender dólar à
vista nesta sexta; medida seria pontual
Lá por junho e julho, havia gente graúda no
mercado financeiro a dizer que o Banco Central precisava
dar um susto no dólar caro.
Para resumir conversa complicada, a sugestão era mostrar a donos do dinheiro
que o preço do dólar não estava destinado apenas "ao infinito e
além", diminuindo o incentivo para operações montadas com essa premissa
—ou pelo menos encarecendo lances e jogadas baseadas em um dólar
"unidirecional" (para cima).
Essa conversa quase desapareceu. Na noite
desta quinta-feira (29), o Banco
Central anunciou que nesta sexta (30) irá leiloar até US$ 1,5 bilhão,
em si mesmo um valor pequeno. Vai vender dólar à vista, em suma, uma raridade
nos últimos anos. Na praça, a conversa era que o mercado ficaria
"estressado" no último dia útil deste mês, o que costuma ocorrer, em
níveis mais ou menos homeopáticos, tumulto neste caso piorado devido a mudança
em um fundo.
Pode ser uma boa desculpa para dar um susto e um tombinho no dólar caro, um ligeiro safanão na ideia de "unidirecionadade". Ou pode não ser quase nada mesmo, apenas uma medida pontual de prudência para um caso isolado. Talvez saibamos um tanto mais disso quando os mercados estiverem operando, nesta sexta-feira.
Em teoria e na maior parte da prática
sensata, não faz sentido tentar ao menos indicar preços para o dólar. Nem é
isso, por favor, que está na cabeça dos diretores do BC. Por vezes, intervir é
um modo de controlar o risco de acidentes financeiros em épocas de tumulto,
quebras, paniquitos e uma decorrente falta de liquidez na praça.
No entanto, gente graúda do mercado conversou
com diretores do Banco Central, de leve, a respeito da
"unidirecionalidade", da tendência de alta desde maio. O real se
desvalorizava, porém, por motivos sabidos. Primeiro, houve reviravoltas ruins nas
perspectivas para as taxas de juros nos Estados
Unidos. Depois, o Brasil fez questão de pisar nessa banana podre
internacional. Houve a votação dividida sobre a Selic no
Banco Central (maio), o tiroteio do
governo contra o BC e a política de gastos de Fernando
Haddad, a mudança de metas fiscais e uma série de falações
desastradas ou estúpidas sobre a política econômica.
Sabia-se por qual motivo o real
estava apanhando ainda mais do que as moedas de países comparáveis,
embora o tamanho da surra seja sempre difícil de estimar e, frequentemente,
passe por períodos de exagero, mais ou menos disfuncional.
Definir o que é o exagero que provoca
disfuncionalidade é a questão. Em 12 meses até abril de 2024, a moeda americana
flutuara em torno de R$ 4,95, com um ou outro sustinho. Em junho, ficou em
torno de R$ 5,39. Desde julho,
em torno de R$ 5,54.
A encrenca já durou o suficiente para
suscitar o debate esperado sobre o tamanho do repasse da alta do dólar para os
preços. O efeito deve
ser perceptível já neste terceiro trimestre e deve perdurar pelo menos até
meados do ano que vem, se não houver degradação adicional do real.
Isto é, deve haver repasse, "tudo mais constante". Mas pode haver
variações, como a queda do preço de commodities, para ficar apenas em um
exemplo; o impacto pode ser maior ou menor a depender do ritmo de atividade
econômica (é mais fácil reajustar preço em economia aquecida).
Isto posto, ressalte-se que não passa pela
cabeça da direção do BC a ideia de atenuar altas de preços por meio de
intervenção no mercado de câmbio.
Mas seria de bom tom o Banco Central explicar a intervenção prevista para esta
sexta. Aliás, um texto mais alentado sobre o atual tamanho das operações no
mercado futuro também seria de grande interesse.
Lendo e aprendendo.
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